O Estado de S. Paulo
A recente elevação do dólar e dos juros futuros mostrou a desinformação de políticos de esquerda
Até o século 17, o significado da palavra
especulação nada tinha a ver com o mercado financeiro. Ainda hoje é assim nos
países desenvolvidos. Segundo o Dicionário Oxford, especulação quer dizer “the
forming of a theory or conjecture without firm evidence” (a formação de uma
teoria ou conjectura sem firme evidência). Por exemplo, especular sobre a
demissão de um ministro.
Na acepção moderna, ao se referir ao mercado financeiro, o Oxford define especulação como “investment in stocks, property, etc. in the hope of gain but with the risk of loss” (investimento em ações, propriedades, etc., na esperança de ganho, mas com risco de perda). Em países emergentes, nos quais o anticapitalismo gera desconfiança em relação às atividades das instituições financeiras e das bolsas de valores, muitos veem a especulação como algo nocivo. Isso pode ser consequência de desinformação, que costuma estar presente em grande parte da sociedade e da classe política.
Especulações não têm por objetivo prejudicar
o governo ou a economia, ao contrário do que imaginam segmentos do sistema
político, em especial os partidos de esquerda, que nutrem posturas agressivas
contra o sistema financeiro. É verdade que em certos momentos se formam bolhas
especulativas. Elas decorrem geralmente de disfunções do mercado financeiro e
de manias que provocam apostas em investimentos excessivamente arriscados.
Essas bolhas, quando estouram, causam danos à atividade econômica, como as que
serão examinadas em seguida.
A primeira grande bolha foi a das tulipas,
que ocorreu na Holanda nos anos 1620. Todas as classes sociais investiam na
flor. Quanto mais exótica, mais cara. Um único bulbo chegou a valer o
equivalente a 24 toneladas de trigo. Não tinha como ser sustentável. A bolha
estourou, causando enormes perdas. Outra foi a bolha dos mares do sul, cujo
estouro arruinou muitos investidores britânicos em 1720. Ela teve origem na
Companhia dos Mares do Sul, criada em 1711 para atuar no comércio com a América
espanhola. Havia a expectativa de que a Guerra de Sucessão da Espanha, então
caminhando para o final, ocasionaria um tratado favorável a tal comércio. Suas
ações subiram muito em janeiro, de 128 para 1.000 libras, mas a realidade
superou visões otimistas. Em setembro, a bolha estourou. As ações caíram para
124 libras.
A bolha especulativa mais famosa é a que
levou à quebra da Bolsa de Valores de Nova York (1929). Até pessoas de baixa
renda, como engraxates, investiam em ações. O estouro da bolha provocou a
falência de quase 10 mil bancos. Seus efeitos negativos na economia inspiraram
a aprovação da Lei Smoot-Hawley (1930), que elevou substancialmente as tarifas
aduaneiras. A medida provocou retaliações dos parceiros comerciais dos Estados
Unidos no mundo inteiro. Em três anos, o comércio global caiu um terço. Aquela lei
é considerada uma das principais causas da Grande Depressão dos anos 1930, que
elevou a taxa de desemprego americana para 25%, deu origem a favelas e provocou
consequências negativas em todo o mundo. No Brasil, seus efeitos resultaram em
forte queda do preço e das exportações do café.
Examinemos, agora, a especulação natural no
mercado financeiro. Ela compreende duas partes no negócio, uma que compra e
outra que vende. Se o raciocínio da esquerda estivesse correto, uma dessas
partes estaria sabotando o governo, enquanto a outra o estaria apoiando. Não é
assim. Essa especulação é parte essencial do mercado financeiro. É dela que
nascem os mercados de crédito e de capitais, que são a fonte de recursos para
financiar atividades econômicas. Antes, quem quisesse iniciar um negócio
recorria a parentes e amigos.
O desconhecimento dessas realidades leva
muitos a pensar que o aumento dos juros pelo Banco Central (BC) beneficia os
bancos. Na verdade, bancos vivem de captar recursos e realizar empréstimos.
Arcam com custos operacionais e perdas por inadimplência. Ganham com a
diferença entre receitas e despesas. Assim, preferem juros baixos, os quais
aumentam o volume dos negócios, inibem perdas e geram novas operações
lucrativas.
A recente elevação do dólar e dos juros
futuros mostrou a desinformação de políticos de esquerda. Um deles disse que
votou contra o pacote fiscal porque era do PT, e não funcionário do governo.
“Nunca votei para reduzir direitos”, afirmou. Outro disse que “o tal ajuste
fiscal só está fazendo cortes que atingem quem mais precisa, o povo”. Ocorre
que os cortes visam a evitar o descontrole da inflação, que prejudicará
especialmente os menos favorecidos. Um deputado petista pediu uma investigação
da Polícia Federal para punir a “Faria Lima”. Inventou um crime. O ridículo
maior coube ao PDT, que invocou a inconstitucionalidade do aumento da taxa
Selic. Se o Supremo Tribunal Federal (STF) acolher o esquisito pedido, a
redução forçada da Selic acarretará o colapso das expectativas e o descontrole
da inflação.
A velha esquerda brasileira faria bem a si e
ao Brasil se buscasse aprender lições triviais de economia.
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