sábado, 15 de fevereiro de 2025

Que papo é esse de semipresidencialismo? - Marcus Pestana

Há muito, os presidentes da República, no presidencialismo brasileiro, não dispõem de maioria parlamentar sólida e fiel para governar. Isso se deve à excessiva pulverização partidária da representação política da sociedade no Congresso Nacional, com uma grande quantidade de partidos, sem que haja duas colunas vertebrais - uma de situação, outra de oposição - com número suficiente de parlamentares para dar consistência aos dois blocos: maioria e minoria, conceitos presentes na maior parte dos parlamentos mundo afora, mas ausentes aqui nas últimas décadas.

Outro causa importante foi o grande alargamento da autonomia dos parlamentares em relação ao Executivo com o crescimento exponencial do valor das emendas orçamentárias de execução obrigatória e o financiamento público de partidos e campanhas.

A falta de maioria parlamentar tem tido papel moderador, ao longo do tempo, em relação às tentações autoritárias do Executivo. Mas também dificultado o encaminhamento de soluções mais profundas para os dramas brasileiros, sobretudo na economia. Os governos não ousam porque sabem que o horizonte de apoio político é curto para medidas mais polêmicas e radicais, às vezes necessárias. 

A situação gera situações complexas e esdrúxulas que poderíamos caracterizar com “parlamentarismo incompleto”. O Congresso tem muito poder, mas não todas as responsabilidades necessárias com a governabilidade. Os partidos políticos pragmáticos raciocinam mais ou menos assim: “O governo, em parte, é meu, afinal tenho três (ou dois) ministérios, mas as metas fiscais são do Lula e do Haddad, não minhas”. Alguns desses partidos se dividem ao meio em votações essenciais para o governo. Aliás, é difícil identificar qual o partido que não está no governo. Todos estão, creio, exceto PL, NOVO, CIDADANIA E PSDB.     

Outra situação incomum, em tempos de reforma ministerial, é ouvirmos dirigentes partidários dizendo: “Aceitamos ministérios, mas isso não quer dizer apoio eleitoral em 2026”. Ora, ora, ora, isto revela explicitamente o descompromisso com os resultados do governo, que serão avaliados exatamente nas eleições. Se aceito participar de um governo deveria ser porque acredito nele, quero que ele seja bem-sucedido e bem avaliado, e, consequentemente, vou apoiá-lo na sucessão. Mas qualquer presidente da República acaba se rendendo à realpolitick porque depende de apoio parlamentar. São as agruras do “parlamentarismo incompleto”.

Fui de quatro comissões especiais de reforma política entre 2011 e 2018. Acompanhei as idas e vindas do tema. Estudo há décadas o assunto. E creio que essa é uma discussão central no Brasil, embora seja cético em relação às possibilidades de êxito. É o típico círculo vicioso: “você não resolve o problema porque tem o problema”.

Para enfrentar o tema e levantar essa discussão estratégica, em boa hora, os deputados Lafayette de Andrada (REP/MG) e Luiz Carlos Hauly (PODE/PR) apresentaram a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 2/25 instituindo duas mudanças essenciais: o semipresidencialismo e o voto distrital misto. O parlamentar mineiro homenageia assim a memória de nosso saudoso Bonifácio Andrada, entusiasta da proposta. Outro deles é o ex-presidente Michel Temer.

Na próxima semana, discutiremos conceitos e problemas envolvidos nesta difícil e decisiva discussão.

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