Valor Econômico
Uma intensa movimentação ocorreu durante todo
o ano de 2025 no governo Lula para viabilizar o anúncio de novos programas
sociais e medidas econômicas, mobilização que se mantém nesta última quinzena
do ano. Agora, o foco é o chamado empreendedor individual.
A correria é grande porque a legislação é
mais restritiva nos anos eleitorais. Ninguém quer dar brecha para que a
oposição questione a conduta da atual administração e, eventualmente, tente
impugnar a candidatura à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Afinal, lembra uma fonte, a lei é bem
específica ao proibir a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios em
ano eleitoral, exceto nos casos de calamidade pública e estado de emergência.
Outra exceção é feita para programas sociais autorizados em lei e já em
execução orçamentária no ano anterior ao pleito.
Uma pendência, nas palavras do próprio presidente, é um programa que ofereça uma linha de crédito camarada direcionada para motoboys e mototaxis. “Uma coisa que a gente quer fazer é baratear o financiamento de uma motozinha para que os entregadores tenham direito de ter uma moto, de preferência elétrica, para economizar a emissão de gás efeito estufa”, disse ele recentemente, durante solenidade de lançamento da carteira nacional de habilitação (CNH) mais acessível.
O desafio enfrentado pelos técnicos do
governo é construir um modelo que viabilize o crédito a taxas razoáveis, com
apoio de um fundo garantidor e subsídios implícitos. Sustenta-se que o
arcabouço fiscal seria respeitado, assim como as melhores práticas contábeis
recomendadas pelos organismos multilaterais, e que os subsídios seriam
justificáveis devido aos investimentos e à atividade econômica gerados. Os
caminhoneiros autônomos também devem ser contemplados.
Em outra frente, como revelou nesta semana o
jornal O Globo, está em fase avançada de definição dentro do governo um
programa de renegociação de dívidas de micro e pequenas empresas nos moldes do
que foi o Desenrola Brasil para as pessoas físicas. A intenção dos técnicos da
área econômica é levar a minuta de uma medida provisória para a assinatura do
presidente ainda neste ano.
Há ainda quem pressione por um programa que
garanta o transporte público gratuito em todo o país. No entanto, como já
mostrou o Valor,
o mais provável é que as discussões façam parte do programa de governo de um
eventual mandato Lula 4, em caso de vitória do presidente em outubro.
Para o ano que vem, contudo, não se descarta
uma ampliação do Bolsa Família. O assunto é acompanhado com atenção no mercado
financeiro, devido ao potencial efeito da medida nas contas públicas. No
Palácio do Planalto, por sua vez, afirma-se que isso só poderia ser viabilizado
diante de uma revisão de despesas do programa que consiga gerar uma economia
proporcional ao potencial aumento dos gastos.
“Tudo dentro da regra do jogo”, assegura uma
fonte, acrescentando que nada disso se compara ao que o governo do
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) fez para tentar viabilizar a reeleição em
2022.
É verdade. Um levantamento feito pelo Valor em outubro daquele
ano somava um alarmante impacto de R$ 68,4 bilhões decorrente do pacote de
bondades anunciado pelo ex-presidente, hoje inelegível e preso por uso da
máquina pública em uma campanha eleitoral antecipada e tentativa de golpe.
Entre as medidas, o aumento do Auxílio Brasil, que depois voltou a chamar Bolsa
Família, a ampliação do vale-gás, um auxílio a caminhoneiros e taxistas, o
corte de impostos sobre gasolina e outros combustíveis, além de um subsídio
para gratuidade no transporte público para idosos.
Diante do rombo, governo eleito e Congresso
chegaram a um acordo no fim de 2022 para aprovar a PEC da Transição. A proposta
de emenda à Constituição permitiu, por exemplo, que o novo governo aumentasse
em R$ 145 bilhões o teto de gastos no Orçamento de 2023 para bancar despesas
como o Bolsa Família, o Auxílio Gás, a Farmácia Popular e outras políticas
públicas. Foi nesse mesmo contexto que o novo governo decidiu realizar o ajuste
fiscal principalmente por meio do aumento de receitas, ignorando as
recomendações de especialistas em contas públicas e membros da frente ampla que
passaram depois a fazer parte da atual administração.
Integrantes deste grupo, aliás, apresentam
nos bastidores uma crítica à profusão de novos programas sociais, por exemplo
para zerar as contas de luz e gás dos mais pobres. Durante muito tempo os
governos do PT se vangloriaram do fato de terem construído com sucesso o Bolsa
Família unificando em 2003 outras políticas públicas já existentes, como o
Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás.
Eles demonstram preocupação em relação ao
planejamento das políticas públicas no futuro, além dos impactos desses
subsídios no Orçamento e na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Mas
sabem que o Bolsa Família, ao ser visto como um instrumento de Estado, deixou
de ter o impacto político do passado. Assim como os eleitores mais pobres,
entre eles os brasileiros evangélicos, os empreendedores individuais terão
papel decisivo na disputa presidencial do ano que vem.

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