O primeiro turno da eleição municipal de 2012 representou a pá de cal na
ideia de uma aliança de esquerda reunindo PT, PSB e PCdoB nas eleições
presidenciais de 2014. Já agora, na campanha de 2º turno, o PT dá tratamento
preferencial ao PMDB, ao negociar as coligações locais com a premissa de que o
partido será o seu aliado na sucessão da presidente Dilma Rousseff.
O PT resolveu solidificar a relação com o PMDB. É uma decisão de
"estado-maior". O 2º turno é a expressão dessa decisão. A presidente
já havia assegurando aos pemedebistas seu aval ao acordo entre as siglas pelo
qual o PMDB assumirá a presidência da Câmara e Senado em 2013.
Há problemas à vista no PMDB. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, lançou o nome
do governador Sérgio Cabral para vice de Dilma, no lugar de Michel Temer. A
reação se deu no tom gaiato de Geddel Vieira Lima, um dos vice-presidentes da
Caixa e aliado de Michel: o que Paes estaria propondo, segundo Geddel, seria a
instalação da "República dos Guardanapos" no governo - uma referência
a celebrações feitas em Paris, em ambientes cinematográficos, pelo governador,
alguns secretários e o empresário Fernando Cavendish, da construtora Delta.
Cavendish e secretários foram fotografados com guardanapos amarrados à cabeça.
"República dos Guardanapos" inibe candidatura Cabral
Outro pemedebista adverte que a CPI do Cachoeira, espécie de cativeiro onde
a Delta e seus amigos são mantidos como reféns, ainda não acabou.
Certamente mais de um motivo jogou na lata de lixo a tal coligação de
esquerda entre PT, PSB e PCdoB. Na prática, o primeiro turno demonstrou que a
ideia não deu certo. Por que? O PT lançou candidato contra o PSB e o PCdoB,
onde as duas siglas menores poderiam aspirar a cabeça de chapa, enquanto PSB e
PCdoB lançaram candidatos onde o PT era competitivo. A concorrência com o PCdoB
não se deu apenas em Porto Alegre (RS), mais visível por se tratar de uma
grande capital, mas também em cidades médias e pequenas.
No caso do PSB, é visível para o PT que o partido do governador Eduardo
Campos (PE) começou a fazer um jogo próprio com vistas à sucessão de 2014, em
detrimento da aliança de esquerda. Essas são as razões alegadas para o PT fazer
o próprio jogo, e nesse jogo dar prioridade para o PMDB.
O curioso é que a disputa interna do PMDB deve ser fortemente influenciada
pelo futuro do PT, já em discussão, independentemente da eleição ou não do
ex-ministro Fernando Haddad para a Prefeitura de São Paulo.
Para onde vai o PT? A variável mais importante é o mensalão. Na reunião do
Diretório Nacional, após a condenação de José Dirceu, José Genoino e Delúbio
Soares, foi unânime a manifestação de solidariedade aos três ex-dirigentes. De
todas as tendências e até dos críticos da gestão de Delúbio como tesoureiro do
PT. As propostas foram ousadas, de atos públicos a sessões de desagravo. Menos
mal para o PT, agora, é que seus antigos dirigentes, sejam punidos com penas
como prisão em regime aberto ou semi-aberto. Será mais fácil de administrar
politicamente.
A segunda variável é o futuro de Lula no PT ou o futuro do PT em relação ao
Lula. Se Haddad vencer a eleição em São Paulo, Lula será outra vez enaltecido
como grande estrategista político e o partido cala o que tem atravessado na
garganta: o viés intervencionista do ex-presidente da República. Afinal, ele
inventou Dilma e Haddad e eles deram certo. Sem falar de Marcio Pochmann,
ex-presidente do Ipea, outra invenção de Lula que passou para o segundo turno.
Nesse cenário, os erros no Recife, Belo Horizonte e Fortaleza tendem a ser
esquecidos. O ex-presidente passa a ter a unanimidade de um partido que hoje
engole, mas não concorda com muitas das decisões do líder máximo.
O outro cenário é Haddad perder a eleição. Ganha corpo a crítica ao
intervencionismo do ex-presidente. Lula será responsabilizado pelos
"desastres" em São Paulo, Belo Horizonte e Recife. E será lembrado
que onde ele deixou de apoiar o candidato do PT, caso de Fortaleza, a prefeita
Luizianne Lins levou seu candidato para o segundo turno. Sozinha.
Em particular, o senador Humberto Costa (PT-PE) tem reclamado de que só
entrou na disputa do Recife a pedido de Lula. "Nem o João da Costa nem o
Maurício (Rands). É você", teria determinado Lula. Humberto foi. Ficou
sozinho no Recife. O ex-presidente não passou nem perto da cidade. Os
dirigentes petistas sonham com um núcleo maior de decisão, como foi até a
eleição de 2002.
Fortalecido, Lula pode influir na escolha do PMDB para o candidato a vice de
Dilma em 2014. É conhecida sua proximidade com Sérgio Cabral, assim como a
antipatia que tem por Michel Temer. Ocorre que Temer efetivamente aproximou o
PMDB de Dilma e do PT. Já na noite da eleição ele chamou o candidato Gabriel
Chalita para conversar sobre o apoio a Haddad no segundo turno. O anúncio do
apoio foi adiado por um dia porque Chalita tentou impor condições, contornadas
com habilidade pelo vice e presidente licenciado do PMDB. É possível que Paes,
ao sugerir a vice para Sérgio Cabral, na realidade tenha em vista um ministério
com vínculos com o Rio. Mas já abriu uma guerra com o grupo que apoia Temer,
como fica demonstrado pela declaração de Geddel.
Aescolha da campanha de Serra de explorar extensivamente o julgamento do
mensalão remete a lembrança de alguns políticos, inclusive do PSDB, à campanha
presidencial de Geraldo Alckmin em 2006. No primeiro debate, Alckmin foi
agressivo, falou de corrupção, mensalão e surpreendeu Lula. O ex-presidente
ficou intimidado. Além de não ser do estilo de Alckmin, ao ser muito agressivo,
o atual governador de São Paulo exagerou e ao exagerar, perdeu. O mesmo
fenômeno pode ocorrer na campanha de Serra: ao exagerar no mensalão, o
candidato do PSDB passa a imagem de que disputa o terceiro turno contra Lula,
quando deveria estar mais preocupado com assuntos relacionados à cidade de São
Paulo. Para efeito de registro, o marqueteiro de Serra é o mesmo que tocou a
campanha de Alckmin em 2006, o jornalista Luiz Gonzales.
Fonte: Valor Econômico
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