César Felício – Valor Econômico
BRASÍLIA - A candidata presidencial Marina Silva (PSB) poderá se espelhar no governo de Itamar Franco (1992-1994) para administrar o país sem maioria no Congresso, caso seja eleita. A ex-senadora descartou ter o apoio formal em um eventual governo do PT, PMDB e PSDB e anunciou que irá trabalhar com dissidências partidárias.
"Vamos mudar o conceito de governabilidade", disse o presidente nacional do PPS, Roberto Freire (PE), que foi líder do governo Itamar na Câmara. "O governo negociará caso a caso e, se perder no Congresso, a decisão será levada à sociedade que vai demonstrar seu sentimento a favor ou contra o que aconteceu. O que não se pode é gerar uma relação promíscua", disse Freire.
Vice que chegou ao poder com o impeachment e a renúncia do titular, o hoje senador Fernando Collor (PTB-AL), Itamar Franco (1930-2011) não tinha partido ao chegar ao cargo: havia se desfiliado do PRN quatro meses antes do afastamento de Collor. Itamar ignorou as lideranças partidárias na hora de montar seu ministério e escalou integrantes de seis partidos: PMDB, PSDB, PDT, PT, PSB e PFL. Reservou para sua cota pessoal os ministérios da Fazenda, Planejamento, Casa Civil, Educação, Ciência e Tecnologia e Saúde.
Desagradou assim aos principais dirigentes da época, como Orestes Quércia (PMDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Antonio Carlos Magalhães (PFL), Leonel Brizola (PDT) e Miguel Arraes (PSB). Mas não teve dificuldades para aprovar projetos que enviou ao Congresso, como por exemplo o da criação do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) em 1993. O tributo antecedeu a CPMF e foi declarado inconstitucional alguns anos mais tarde. "A maioria no Legislativo naquele tempo não se construiu por arranjos partidários, mas negociando matéria a matéria", lembrou Freire.
O agravamento da crise econômica fez com que Itamar mudasse seu estilo de governar em maio de 1993, quando nomeou Fernando Henrique Cardoso para o ministério da Fazenda. Ao contrário dos antecessores, FHC teve respaldo do mercado financeiro e ganhou do presidente carta-branca para armar um plano de estabilização financeira.
O otimismo dos aliados de Marina com a força popular que a candidata terá caso eleita é tão grande que seus partidários no Congresso tentarão ganhar poder no Legislativo. Um dos deputados mais veteranos da Casa, Miro Teixeira (Pros-RJ), que busca seu décimo-primeiro mandato, pretende se lançar para a presidência da Câmara dos Deputados nessa hipótese.
"Vou disputar a presidência da Casa. Teremos uma presidente com minoria, mas com imensa legitimidade pelo voto e com pelo menos metade dos mandatos renovados na Câmara. Eu duvido que o PT marche unido com Arlindo Chinaglia ou o PMDB fique coeso com Eduardo Cunha", disse Miro, citando os dois mais prováveis candidatos a presidente da Câmara pelo PT e pelo PMDB, maiores bancadas no Legislativo.
Segundo Miro, a escolha das presidências das mesas diretoras do Legislativo, que acontece em 2 de fevereiro, "será o momento para se forjar uma nova governabilidade". "Estaremos em uma etapa em que o Congresso estará mais suscetível à opinião pública. No Senado, o PMDB continuará sendo a maior bancada, mas com boa parte de seus integrantes na metade final do mandato, necessitando armar suas alianças para renovar suas cadeiras em quatro anos", disse.
O parlamentar, que foi ministro das Comunicações e líder do governo Lula na Câmara entre 2003 e 2004, afirmou que "no Brasil o conceito de governabilidade é distorcido". "As maiorias se organizam conforme as propostas são apresentadas. Em 2003 Lula não aprovou a reforma da Previdência com mensalão, aprovou com um acordo com o PSDB e o PFL. Em 1990 Collor assumiu o governo em total minoria, montou um ministério sem representatividade e ainda assim aprovou de maneira quase unânime um plano econômico de caráter confiscatório", exemplificou Miro.
Eleito em 1989, tendo Itamar como vice, Fernando Collor concorreu em uma eleição solteira e contava apenas com o apoio de três siglas nanicas. Para compor seu primeiro ministério, com treze pastas civis, Collor nomeou apenas três políticos: Bernardo Cabral (Justiça), Carlos Chiarelli (Educação) e Alceni Guerra (Saúde). Nos últimos meses de seu governo, pouco antes de perder o mandato em um processo de impeachment, entregou os principais cargos de sua administração para o PFL, atual DEM.
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