• Custos da obra saltaram de us$ 2,3 bi para us$ 20 bi; parte das sugestões de Costa foi aprovada por Graça
Vinicius Sassine – O Globo
BRASÍLIA - Disposto a aceitar um acordo de delação premiada, o que vem assustando meio mundo político, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa teve papel decisivo nas mais diferentes fases da construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e conhece como ninguém os meandros de um dos empreendimentos mais controversos da estatal, usado para abastecer seu suposto esquema de corrupção. Extratos inéditos de atas da Diretoria Executiva da Petrobras, relacionados apenas a deliberações sobre Abreu e Lima, mostram que Costa submeteu ao colegiado sete propostas decisivas para o empreendimento, duas delas referentes à participação da Petróleos da Venezuela (PDVSA) no negócio.
Todas as sugestões do diretor, hoje preso no Paraná por conta de desvios de contratos superfaturados nas obras da refinaria, foram aprovadas pela Diretoria Executiva. A presidente da Petrobras, Graça Foster, participou de três dessas reuniões.
As propostas foram feitas à cúpula da estatal entre 2005 e 2011. No ano seguinte, Costa deixou o cargo de diretor de Abastecimento e passou a atuar na iniciativa privada. Com a deflagração da Operação Lava-Jato pela Polícia Federal, em março deste ano, veio a público a participação do ex-diretor no esquema de lavagem de dinheiro comandado pelo doleiro Alberto Youssef.
A base dos supostos desvios feitos por Costa são os contratos das empreiteiras e subempreiteiras para as obras da refinaria. Os custos de Abreu e Lima saltaram de US$ 2,3 bilhões, valor do primeiro orçamento feito, para mais de US$ 20 bilhões, total que deve ser gasto até novembro, mês previsto para a inauguração. O Tribunal de Contas da União (TCU) calcula um superfaturamento nas obras superior a US$ 493 milhões (mais de R$ 1,1 bilhão).
Registros em ata desde 2005
No primeiro registro em ata sobre uma proposta de Costa à Diretoria Executiva, em setembro de 2005, ele propôs que o projeto tivesse continuidade, começando a partir do mês seguinte a fase dois da refinaria, com a localização do empreendimento em Pernambuco e "equacionamento da questão relativa à disponibilidade de água". O registro seguinte é de março de 2007. Costa introduziu na pauta dos diretores da Petrobras o "Plano de Antecipação da Refinaria do Nordeste". Na prática, ele propôs que se criasse uma empresa para a implantação a refinaria.
Três meses depois, a criação da empresa ficou mais clara, novamente a partir de uma sugestão do ex-diretor. Ele sugeriu uma sociedade entre a Petrobras e a Downstream Participações e indicou que o próprio diretor de Abastecimento fosse o representante da estatal na sociedade. A diretoria, com o então presidente José Sergio Gabrielli à frente, concordou com a proposta.
O passo seguinte de Costa, conforme as atas das reuniões da diretoria, foi submeter à aprovação o termo de compromisso com a Agência Nacional do Petróleo (ANP) para a construção e a operação da refinaria. Já em novembro de 2009, o ex-diretor propôs a execução da fase quatro de Abreu e Lima, o que na prática significou a execução das obras. Graça Foster participou dessa reunião e votou a favor da proposição, assim como os demais diretores.
Acordo com venezuelanos passou por Costa
Em dezembro do mesmo ano, Costa tratou de dois assuntos decisivos para Abreu e Lima: a participação da PDVSA, estatal de petróleo da Venezuela, e do BNDES no empreendimento. O ex-diretor propôs que a PDVSA deveria fazer um aporte inicial de R$ 854,1 milhões no negócio, o que acabou não ocorrendo. O governo da Venezuela abandonou o empreendimento quando as obras já estavam em curso, o que contribuiu para o encarecimento dos custos, uma vez que a refinaria foi planejada para processar o óleo pesado venezuelano. Também se discutiu na reunião minutas de contratos de compra e venda de petróleo entre a PDVSA e Abreu e Lima, além da participação societária da estatal venezuelana.
Na mesma reunião, Costa pediu autorização para que houvesse negociações junto ao BNDES e a PDVSA, "de forma a obter a anuência do BNDES para a nova estrutura societária" de Abreu e Lima. A ideia era garantir o financiamento já contratado de R$ 9,8 bilhões.
O último registro em ata com o protagonismo do então diretor de Abastecimento é de outubro de 2011. A Diretoria Executiva apenas tomou ciência de um ato de Costa: ele autorizou a celebração de um acordo de sigilo e confidencialidade entre a Petrobras e a PDVSA, "visando conferir proteção às informações e documentos solicitados pela PDVSA do Brasil".
A maioria das decisões sobre Abreu e Lima não passava pela Diretoria Executiva ou pelo Conselho de Administração da Petrobras. A refinaria tinha um conselho próprio, presidido por Costa, que deliberava sobre a rotina das obras. As decisões mais comuns nesse colegiado eram a aprovação de aditivos contratuais com as empreiteiras. Parte desses aditivos resultava em acréscimo de serviços e no encarecimento dos custos.
O GLOBO questionou a Petrobras se as propostas de Costa nas reuniões da Diretoria Executiva foram revistas após as descobertas feitas pela PF. Não houve resposta da estatal até o fechamento desta edição. O jornal também procurou a advogada Beatriz Catta Preta, que assumiu a defesa do ex-diretor para organizar a delação premiada. Ela não deu retorno.
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