Raquel Ulhôa – Valor Econômico
BRASÍLIA - A discussão da maioridade penal expôs o início da previsível disputa entre o governador Geraldo Alckmin (SP) e o senador Aécio Neves (MG) pela pré-candidatura do PSDB à Presidência da República em 2018. Foi só Alckmin ensaiar aliança com o governo petista para mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que Aécio buscou acordo com o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para aprovar proposta de emenda constitucional (PEC) que reduz a idade penal apenas para crime hediondo.
A intenção do senador é negociar com o PMDB emenda flexibilizando a PEC que reduz a maioridade penal de forma linear, prestes a ser votada e defendida por Cunha. Sem garantias de conseguir aprová-la, o presidente da Câmara acenou positivamente a Aécio e aliados, como o líder Carlos Sampaio (SP).
A articulação de Aécio sucedeu reuniões do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com Alckmin e com o senador José Serra (PSDB-SP). A estratégia do presidente do PSDB é isolar o PT e frustrar a aliança de Alckmin com o PT para seu projeto infraconstitucional, que muda o ECA, aumentando o tempo de privação de liberdade do menor infrator (dos atuais três anos para oito).
A mais de três anos das eleições presidenciais, aliados de Aécio e ala paulista ligada a Alckmin já começam uma disputa nos bastidores do PSDB. Embora a competição mais visível seja entre os dois, o senador José Serra (PSDB-SP) não é considerado fora do jogo. Enquanto Aécio controla o partido e Alckmin, o maior Estado do país, Serra (pré-candidato a presidente em 2002 e 2010) tem tido destacada atuação legislativa. Autor de propostas sobre diferentes temas - de pacto federativo a reforma política - tem recebido respaldo estratégico do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Políticos tucanos atribuem a antecipação dessas articulações internas do PSDB ao desgaste precoce do governo Dilma Rousseff. Por ter concorrido em 2014, Aécio representa hoje, na opinião pública, o contraponto à petista. Mas sua posição como pré-candidato não está consolidada, segundo seus próprios aliados.
Alckmin, também ex-candidato a presidente e no segundo mandato consecutivo de governador, tem buscado um protagonismo nacional que não demonstrava antes. Essa desenvoltura do governador, inclusive em temas legislativos, tem chamado a atenção dos aecistas, como um suposto aparelhamento da máquina para acomodar aliados e atrair apoios políticos.
É muito cedo para o desenho da campanha, que será influenciado por vários fatores, como o desempenho do governo paulista ao longo do mandato, a aprovação de Aécio em Minas Gerais, a possibilidade de Serra surgir como alternativa e o que vai acontecer com o governo Dilma. Até a possibilidade de impeachment e de o PMDB assumir o governo está no horizonte do PSDB.
Aécio será reconduzido presidente do partido no congresso a ser realizado em julho e planeja eleger uma Executiva Nacional que represente todos os setores do partido. Promete lançar uma "Carta de Princípios", atualizando propostas apresentadas na campanha, nas áreas econômica, social e de gestão, entre outras.
"O PSDB vive um momento extraordinário, do ponto de vista da sua identificação com a sociedade. Se a última eleição começou com dúvida em relação à viabilização de uma terceira via, agora a polarização do PSDB com o PT é mais forte do que nunca. E, como a rejeição do PT é algo avassalador, a contrapartida imediata é o fortalecimento do PSDB", diz Aécio. "O congresso será o momento propositivo do partido."
Aécio afirmou que seu partido tem um "leque de opções" de candidatos para disputar a Presidência da República em 2018, mas que não é hora de saltar etapas. "A prioridade, agora, é estabelecer o projeto de país", disse. O senador admitiu prévias e disse que o partido decidirá unido o nome para a disputa.
O comentário foi feito em entrevista no Senado, ao ser perguntado sobre o lançamento de Alckmin pré-candidato a presidente da República no domingo, na convenção paulista do PSDB.
"Essa é uma característica do PSDB, que tem quadros da estatura de Geraldo Alckmin para disputar a Presidência da República, de Aloysio Nunes [senador], de José Serra [senador], de Marconi Perillo [governador de Goiás]. O PSDB é uma usina de talentos. Não excluo sequer o ex-presidente Fernando Henrique", disse.
O comando do PSDB é criticado internamente pela falta de propostas. Tucanos experientes dizem que o partido tem que abandonar o discurso "radical", focado na defesa do impeachment da presidente e na acusação de "estelionato eleitoral". Por isso, a importância da maioridade.
O PSDB, que na campanha eleitoral defendeu possibilidade de menor de 18 anos ser julgado pelo código penal em caso de crime hediondo e de reincidência, descobriu-se perdendo a bandeira, que tem forte apelo na sociedade, especialmente em São Paulo, segundo mostram pesquisas. O partido assistia à polarização entre Cunha - defensor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de forma linear - e o PT, que se opunha a qualquer mudança.
Os tucanos decidiram reassumir o papel no debate. Alckmin retomou a defesa do aumento da internação para menor em caso de crime hediondo (de três para oito anos) e buscou aliança com o PT. Serra, de comum acordo com o governo paulista, apresentou essa proposta, mas fixando teto de dez anos - o que facilita negociação para reduzir a oito. Aécio, por sua vez, relançou a proposta de aumentar a pena do adulto que usar menor em crime. E reforçou apoio à PEC do senador Aloysio Nunes Ferreira (SP) que reduz a maioridade penal apenas para casos de crime hediondo e reincidência. (Colaborou Vandson Lima)
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