• Críticas são estratégia para se descolar do desgaste petista, para se distanciar da impopularidade da presidente e para sobreviver
Alessandra Duarte e Sérgio Roxo – O Globo
RIO E SÃO PAULO - O navio começa a afundar, e ele é o primeiro a sair. Ao deixá-lo, cria o fato político que o governo da sucessora não consegue gerar. Ao animar a política, ocupa um espaço que poderia ser da oposição. E mostra por que tem conseguido passar por mensalões e Lava-Jatos praticamente sem se molhar. Para analistas políticos ouvidos pelo GLOBO, a saraivada de críticas que o ex-presidente Lula tem feito ao seu partido e à presidente Dilma nos últimos dias é uma estratégia: para se descolar do desgaste petista, para se distanciar da impopularidade da presidente e para sobreviver, porque 2018 vem aí.
Ricardo Ismael, cientista político da PUC-Rio
“É um cálculo político. Lula critica, mas não faz autocrítica. Coloca-se alinhado com a opinião pública. Sem dúvida, é a postura de um candidato à Presidência. Ele se comporta como um capitão que já deixou o navio, está em terra firme e observa o navio de fora. Dá o recado de que é o lulismo que vai liderar essa renovação que ele diz que o PT precisa. A renovação é ele, ele é que vai conduzi-la. À presidente, cabe se sacrificar por 2018 e ajudar Lula tentando recuperar a economia até lá”.
Oswaldo do Amaral, cientista político da Unicamp
“Um eventual descolamento de um governo de baixíssima popularidade é um movimento de quem quer deixar uma possibilidade aberta para concorrer em 2018. Dizer que o partido precisa se renovar também é uma maneira de tentar reacender um pouco a militância mais jovem do PT. As declarações de Lula sinalizam ainda a necessidade de o partido fazer mudanças. O PT não vai conseguir se recuperar com a manutenção dos mesmo líderes.”
Fernando Azevedo, cientista político da UFSCar
“Lula está explicitando algumas críticas que já vinha fazendo internamente. Ao mesmo tempo, é um possível movimento tático de se deslocar para evitar uma contaminação da sua popularidade, que ainda é melhor do que a do governo e a do PT. Internamente, o impacto é a abertura de um debate no partido, que vive um momento muito crítico. Em relação ao país, Lula começa a fazer uma autocrítica para o público externo da ação partidária e da própria atuação do governo.”
José Álvaro Moisés, cientista político da USP
“Lula está vendo o navio fazer água. Está assumindo uma posição de se dissociar da sorte do governo e do partido, sem assumir responsabilidade sobre o que aconteceu nos últimos 13 anos. É preciso saber se ele vai tomar iniciativa no sentido de enfrentar o problema. Teria sido uma coisa importante se ele tivesse feito essas afirmações durante o Congresso do PT (entre 11 e 13 de junho, em Salvador). Mas falou depois. Portanto, não é para levar a sério. É só uma maneira de jogar para a plateia”.
Eugenio Giglio, pesquisador de marketing político e professor da ESPM-Rio
“Lula é um dos políticos mais inteligentes do Brasil. Ninguém pode acusá-lo de ingenuidade: sabia que o que falava ia ter repercussão. Como a época é favorável à oposição, ele ocupa esse espaço. Critica a economia como se dissesse a Dilma: ‘Não foi para isso que botei você lá’. Não sei se combinou com o PT, que, além do próprio Lula, não tem líderes nacionais. Mas, por ser próximo de Dilma, talvez tenha articulado com ela. Lula reafirma que é maior que o PT porque quer sobreviver”.
Maria Celina D’Araujo, cientista política da PUC-Rio
“Lula está fazendo o que ele disse que precisava ser feito: política. Está animando o ambiente político, criando agenda. Na avaliação dele, é o que o governo não faz. Isso é parte de uma lógica dele de sempre ter voz; não é para contrariar Dilma. Não sei se é com vistas a 2018. É para hoje, amanhã, é para a vida dele. Agindo assim, Lula tira um pouco o fôlego da oposição, porque ele ocupa o centro do debate de oposição”.
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