Quando os eleitores italianos votarem, amanhã, o referendo que propõe importante reforma do sistema político, estará em jogo não apenas o futuro do primeiro-ministro Matteo Renzi e da Itália, mas igualmente da Europa como bloco. Desde que assumiu há quase três anos, o jovem premier se viu às voltas com graves problemas econômicos, especialmente no setor bancário, cuja crise tem caráter sistêmico, afugentando investidores, com efeitos colaterais em toda a União Europeia.
Renzi tem tido dificuldades para implementar medidas importantes, ao esbarrar em limites impostos pelo Senado. O referendo pretende reforçar sua autoridade ante o Congresso, por meio de uma reforma constitucional. Mas trata-se de uma aposta de risco, uma vez que Renzi adiantou que, se a reforma não passar, deixará o cargo.
Além dos senadores, Renzi enfrenta a oposição de Beppe Grillo, ex-comediante e fundador do partido antiestablishment Movimento Cinco Estrelas. Grillo se soma a outros líderes populistas que se batem contra a política convencional e a integração europeia, sem esclarecer o que colocariam no lugar. Para ele, a reforma de Renzi proposta no referendo não é ousada o suficiente para mudar o sistema. Uma eventual queda do premier italiano, portanto, abre espaço para Grillo e o Cinco Estrelas avançarem como força política.
Se vitorioso, o referendo de Renzi despojaria o Senado de boa parte de seu poder, além de substituir os 315 senadores diretamente eleitos por 100 representantes locais. Para Renzi, a limitação do poder do Senado daria mais estabilidade ao Executivo, agilizando a aprovação de medidas e leis, inclusive as reformas econômicas de que a Itália tanto necessita. Já opositores, como Grillo, querem ampliar gastos fiscais, adotar medidas protecionistas e decretar o fim da UE.
Pela legislação italiana, a realização de pesquisas de opinião é proibida a duas semanas do pleito. O último levantamento mostrava uma vitória do “não”, com margem de cinco a oito pontos. O número de indecisos, porém, abrangia um quinto dos eleitores, o que torna o resultado de amanhã imprevisível.
Muitos veem Grillo como o verdadeiro adversário de Renzi, e uma vitória do “não” representaria mais um passo da revolução populista que se espalha entre os países desenvolvidos. Não à toa, o comediante estava exultante com a vitória de Donald Trump nas eleições americanas, evocando a comemoração da líder da Frente Nacional da França, Marine Le Pen, após a decisão do Brexit.
O populismo, à direita e à esquerda, cresce em todo o mundo, alimentado pela frustração do eleitor atingido pela crise global de 2008 e a constatação de que a realidade econômica hoje exige restrições. Na Itália, 97% das famílias viram a renda encolher na última década, e o desemprego alcançou 11,6% em outubro. Compreende-se que o eleitor mais vulnerável se iluda com o canto de sereia populista, mas arrisca-se, assim, a mergulhar num caos de consequências imprevisíveis.
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