Mudanças em programa de renegociação de dívidas com a Receita beneficiam empresas de parlamentares e pioram a situação fiscal da União
Esses momentos de intensa negociação política, em que o Executivo necessita de votos no Congresso, têm sido perigosos para o Erário, devido ao nível pedestre da representação política. O caso mais recente, e ainda em curso, é o da MP de um Programa de Regularização Tributária (Refis), lançado no final do ano, e enviada pelo governo ao Congresso, para permitir que empresas e pessoas físicas renegociem dívidas tributárias, em condições realistas — não se trata de perdão de dívida, mas os contribuintes passam a poder manter seus compromissos com a Receita em dia.
Porém, o que deputados e senadores da comissão mista criada para examinar a medida provisória fizeram foi usar a MP para transformá-la, na prática, em uma doação do Tesouro. A ponto de, segundo cálculos do governo, a estimativa de uma receita imediata de R$ 8 bilhões — porque o Refis implica algum pagamento — ser revista para apenas R$ 1,1 bilhão.
Na ponta do lápis, de acordo com o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, a União, segundo o G1, deixará de arrecadar R$ 23 bilhões, se a nova versão do Refis for aprovada, implicando a necessidade de até mesmo ampliar-se o contingenciamento orçamentário.
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), decidiu, segunda-feira, reenviar a proposta de volta à Câmara. Com acerto, por se tratar de uma árvore repleta de “jabutis” — emendas casuístas colocadas em projetos pelos parlamentares.
Levantamento feito pela TV Globo, a partir de dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, mostra que mais de um terço dos deputados e senadores que encaminharam emendas à MP são beneficiários da nova versão do Refis. E, de acordo com o “Jornal Nacional”, 13 senadores e 55 deputados participam de empresas com dívidas de pelo menos R$ 100 mil com o Erário. Poderão renegociar o débito, em condições mais que benevolentes.
Uma delas prevê o desconto de multas e juros, benesse inexistente na MP original. Esta estabelecia o pagamento mínimo de 20% do débito, à vista. O saldo seria parcelado em até 120 meses, dez anos. Pois a comissão mista transplantou para o texto do Refis um desconto de até 90% nas multas e de até 99% nos juros. Aproveitou, também, para incluir dois “jabutis”, para reduzir o poder de fiscalização da Receita Federal e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ), do Ministério da Fazenda.
O momento é delicado, e grupos de pressão se aproveitam da necessidade da aprovação das reformas, como a da Previdência, para arrancar, em barganhas fisiológicas, favores incabíveis. Os radares do Planalto precisam estar ajustados para detectar manobras desse tipo. Os tempos são outros: de redução de déficits e não de abertura de novos rombos.
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