- O Globo
São tantos os que se atribuem a escolha do novo diretor da Polícia Federal, Fernando Segóvia, que é difícil determinar quem realmente teve influência. Uma coisa é certa: não foi o ministro da Justiça, Torquato Jardim, pois ele próprio fez questão de deixar claro na nota oficial que a escolha foi do presidente Michel Temer.
Ofato de Segóvia ter tantos apoios políticos, de Sarney a Padilha, de Moreira Franco a Augusto Nardes, do TCU, só tem a vantagem de diluir a influência, mas traz uma certeza: sua indicação, apesar de inegáveis méritos profissionais, deveu-se mais ao apoio político do que ao de seus colegas, embora não tenha havido nenhuma reação ostensiva à indicação, e declarações oficiais favoráveis de associações de delegados.
Mudar a chefia da Polícia Federal era um dos objetivos do novo governo assim que Temer assumiu a Presidência, e a ideia tinha uma motivação que se diluiu com o tempo. Se a intenção era controlar mais a Polícia Federal para favorecer os políticos sob investigação, ela perdeu a força com o tempo que Leandro Daiello, o antigo diretor, permaneceu à frente do órgão na administração Temer, tendo condições de aparar arestas e mostrar-se não tão disposto a afrontar os novos superiores hierárquicos.
O ministro da Justiça, Torquato Jardim, por exemplo, que assumiu sucedendo a Alexandre de Moraes, tinha como prioridade substituir Leandro Daiello, e acabou convencido de que não havia necessidade disso. Nem possibilidade de, com a substituição, controlar as ações da Polícia Federal, que a esta altura ganhou uma autonomia impossível de ser retirada.
O que mudará é a maneira de Segóvia se relacionar com a classe política, pois seu histórico mostra que ele tem uma capacidade de interlocução grande, e contatos com os diversos grupos do PMDB. Essa flexibilidade política que pode dar a primeira impressão de que o novo chefe da Polícia Federal entra menos disposto a investigar os crimes de políticos do que seria o ideal. Provavelmente não terá consequências práticas, justamente pela autonomia funcional da Polícia Federal.
Assim como seu diretor não tem obrigação funcional de informar ao ministro da Justiça sobre suas ações, a não ser no momento em que elas forem desencadeadas, também os delegados têm essa autonomia em relação à chefia. Portanto, mesmo que o novo chefe da Polícia Federal queira fazer corpo mole, o que será preciso ainda comprovar, seria preciso uma grande conspiração de delegados da Polícia Federal para que as investigações da Lava-Jato, por exemplo, sejam bloqueadas.
É claro que, como ensinou o senador Aécio Neves naquela conversa telefônica nada edificante com o empresário Joesley Batista, o chefe da Polícia Federal pode sempre nomear para determinado caso um delegado simpático a este ou aquele político. Mas há um esquema tão desenvolto em ação nessas investigações, com a participação do Ministério Público, que fica difícil que uma armação desse tipo prevaleça sempre, mesmo que essa fosse a intenção do novo chefe.
Uma das qualidades de Fernando Segóvia é sua especialidade em repressão a crimes de fronteiras, o que o torna figura importante no combate ao crime organizado e ao contrabando, especialmente de armas, no país. Seria uma mudança de qualidade nessa luta contra as organizações criminosas que, agora, já buscam intercâmbio internacional nas fronteiras do Brasil para ampliar a atuação.
Só é desejável que a disputa entre a Polícia Federal e o Ministério Público não se acirre, pois o novo chefe da PF já defendia, em 2013, a PEC 37, que retirava o poder de investigação do Ministério Público e o limitava às polícias Federal e Civil.
Ao contrário, a nova chefe da Procuradoria-Geral da República, Raquel Dodge, tem posição oposta. Essa disputa de espaço, que não é de hoje, ganhará outra dimensão se os dois novos chefes das corporações não se dispuserem a trabalhar em conjunto.
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