- Folha de S. Paulo
Vitória de Boris Johnson desfaz impasse; é cedo para dizer que nasceu um Trump britânico
O sistema representativo entra em desconforto quando das eleições não brota um mecanismo estável de tomada de decisões políticas. Na Espanha e em Israel, os eleitores são amiúde chamados a opinar, mas o impasse na governança persiste.
O Reino Unido parece ter escapado de um xeque demoníaco nesta quinta (12). A vitória de Boris Johnson não deixa dúvidas sobre o desejo preponderante da população de desencalhar o brexit. Enterrou-se numa pilha de votos e cadeiras no Parlamento a teoria conspiratória de que tudo não passava de manipulação da Cambridge Analytica.
Foram necessárias três eleições, contando a do plebiscito de 2016, para que a liderança política e a maioria parlamentar se refizessem no molde da maioria popular.
É melhor ter um premiê empoderado e em sintonia com o desejo do eleitorado do que a paralisia anterior. Ela ameaçava o imperativo de democracias maduras de que o veredicto de uma consulta popular precisa ser respeitado. Além disso, flertava com resultados piores para o país, como a saída desordenada do bloco europeu.
Apressa-se, no entanto, quem vaticina ter nascido um pequeno Trump em Westminster. Primeiro porque ele não seria pequeno: os poderes de um governante britânico apoiado em tamanha maioria parlamentar excedem em muito os do presidente norte-americano.
Segundo, e mais importante, porque há vetores poderosos a inibir a marcha nacionalista radical nas ilhas. Se vestimos a fantasia do separatismo para fora, que tal trazer a brincadeira aqui para dentro, insinuam escoceses e norte-irlandeses. Boris terá de ser generoso e doce com esses grupos para evitar cismas traumáticos.
Nas negociações internacionais que se seguirão, Boris tampouco estará livre para chutar o pau da barraca globalista, ou vai machucar setores dinâmicos da economia britânica, como o de finanças. A globalização como a conhecemos nasceu na City de Londres.
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