- O Globo / Folha de S. Paulo
Eles são apenas normais. Cuidam do expediente e evitam brigas públicas
Tereza Cristina e Luiz Henrique Mandetta são dois ministros de Jair Bolsonaro que abrem a quitanda às seis da manhã com berinjelas para vender e troco para as freguesas. Ela, desde os seus primeiros dias no Ministério da Agricultura. Ele, na Saúde, administrando o problema do coronavírus. Pode-se discordar de algumas de suas ideias, ou mesmo de todas, mas deve-se reconhecer que fazem seus serviços. Ambos pertencem à escola do centroavante Dario (o preferido do general Emílio Médici para a seleção de 1970). Numa época em que se falava muito em problemática, ele informou: “Eu dou a solucionática”.
A biografia e o comportamento de Tereza Cristina e Mandetta são uma aula de política e de administração.
Começando pela biografia. Ela vem da cepa oligárquica dos Corrêa da Costa. Desde a Regência, eles governaram Mato Grosso 11 vezes. Sabe-se lá quando a primeira Corrêa da Costa conseguiu um diploma universitário, mas Tereza Cristina formou-se em Engenharia Agronômica e tocou sua empresa. Mandetta vem de uma cepa neo-oligárquica, primo de senador, de deputado e do prefeito de Campo Grande. Um irmão meteu-se em negócios com o rei do jogo no estado. Ele formou-se em Medicina, é ortopedista, trabalhou em hospitais e dirigiu a Unimed de seu estado.
Os dois foram deputados. A atividade parlamentar obriga a ouvir e negociar. Um deputado pode saber que tem razão e que está sendo contraditado por um larápio ignorante, mas aprende a se comportar como se estivesse diante de Rui Barbosa. O Congresso educa, mesmo não se podendo dizer que o deputado Bolsonaro tenha aprendido muita coisa. Lá, o vencedor tonitruante é um bobo. (Eduardo Cunha ganhou todas, está em Curitiba.)
Esses dois ministros bem-sucedidos trabalharam em rotas diferentes. Ela, costurando por dentro, acalmou os ânimos com a China e reabriu o mercado americano para a carne brasileira. Carrega o piano sabendo que tem agrotrogloditas por perto e um ministro do Meio Ambiente que repete coisas que não deveria nem ouvir.
Diante do coronavírus, Bolsonaro entrou em campo dizendo que custaria muito caro repatriar os brasileiro que estavam na China. Fez isso depois de se reunir com quatro ministros. Mandetta (que não estava na reunião) coordenou com clareza as ações do seu ministério e valorizou os profissionais dos estados. Além disso, passou mais tempo diante das câmeras falando do coronavírus do que o general da reserva Augusto Heleno e o doutor Paulo Guedes em todas as suas vidas. Não criou atritos e satisfez quem o ouviu.
Tereza Cristina e Mandetta estão fora da linha de exibicionismo e evangelização que enferruja o governo. Com jeito de quem não queria nada, o ministro da Saúde disse que a construção relâmpago de um hospital na China foi um exagero e que lavar as mãos é proteção mais eficaz do que o uso de máscaras.
Ao estilo Guedes-Heleno, poderia ter dito o seguinte:
“O que os chineses fizeram foi uma palhaçada típica dos regimes comunistas (Heleno) e social-democratas (Guedes). Brasileiro tem que aprender a lavar as mãos (ambos).”
Isso para não se falar no que diria Abraham Weintraub: “Petistas estão indo aos hospitais simulando sintomas para provocar pânico na população”. Já o ministro Sergio Moro chegaria para a entrevista coletiva dirigindo uma ambulância.
Pode parecer que Tereza Cristina e Mandetta são excêntricos, mas excêntricos são os tempos em que se vive. Eles são apenas normais. Cuidam do expediente e evitam brigas públicas. Num governo que vive em loucas cavalgadas para nada, isso até espanta.
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