Cobremos
dos políticos, mas cobremos também de nós mesmos para que nossas atitudes não
potencializem o caos
O Brasil tem enfrentado um problema cultural, cujo reflexo político é mais evidente que sua origem. Carente de uma visão de mundo coerente pela qual analisar a realidade, envolta nos problemas do dia a dia e indisposta em relação àqueles que tentam oferecer qualquer reflexão ou análise que mostre os contornos nuançados do real, a maioria se contenta com discursos fáceis, eivados de chavões, rótulos e visões reducionistas de fatos e pessoas, apropriando-se rapidamente da retórica belicosa que entra em ressonância com as forças obscuras que nos colocam em confronto como se o outro fosse um inimigo, não o próximo. É assim que narrativas à esquerda e à direita vão transformando o mundo social e digital em uma poça de lama de ideias preconceituosas e violentas.
O
reordenamento do psiquismo social depende da busca de visões de mundo que
ultrapassem o imediatismo das arengas das redes sociais. O estar consciente de
si pressupõe a capacidade de dar conta dos fundamentos da visão política que se
apregoa e de combater e refutar ideias sem destruir reputações ou alvejar
pessoas.
O
cultivo intelectual deve atingir a esfera moral, tornando-nos mais dóceis ao
outro, cuja visão de mundo, embora divergente, se bem exposta, pode nos ajudar
a reconhecer os limites de nossas próprias concepções. Não há verdades a serem
impostas de modo dogmático em torno das questões sociais e políticas, pois o
escopo político e social é o horizonte do debate por excelência. O projeto de
cada um, em se tornando compatível com o projeto do próximo, engrandece a
sociedade, e é nisso que consiste o pluralismo saudável que defendemos.
Vivemos momento grave, que toca a cada um como ser humano; como irmãos que somos. A guerra ideológica não logrará êxito contra a pandemia, mas a reunião de corações solidários sim. Cobremos dos políticos; mas cobremos também de nós mesmos para que nossas atitudes não potencializem o caos no qual a inépcia deles nos deixou.
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