Nas
eleições do Legislativo, devemos preservar o Estado democrático de Direito
A
autonomia do Poder
Legislativo é a espinha dorsal da democracia representativa,
especialmente no regime presidencialista. Nossa Constituição é cristalina em
seus dois primeiros artigos: o Brasil constitui-se em Estado democrático de
Direito e os Poderes da União —Legislativo, Executivo e Judiciário—
representam, cada um em sua esfera, a soberania popular.
Note-se
que o primeiro dos sete artigos da Constituição
norte-americana —famosa por ser sintética e objetiva— trata do
Poder Legislativo. É a parte mais extensa do documento que configura uma das
democracias mais importantes do mundo. Pode-se dizer que a primeira emenda
constitucional, introduzida em 1789 por James Madison, é considerada o coração da
democracia americana: “...que o Congresso não faça nenhuma lei submetido a uma
religião ou proibido de seu livre exercício”.
Com
a convicção de que precisamos preservar nosso Estado democrático de Direito e a
independência do Poder Legislativo, participarei do processo de
escolha do presidente do Senado Federal, a quem caberá presidir o
Congresso Nacional nos próximos dois anos.
O desafio de conduzir o Senado nesses tempos de pandemia de Covid-19 é imenso. Assim sendo, cabe ao senadores escolher com completa independência, dada a agenda de deliberações decisivas que o Congresso terá pela frente em colaboração com o Poder Executivo.
A
primeira da lista é a luta contra a pandemia, o que envolve custos
consideráveis. E aqui não faço referência somente ao aspecto financeiro. Tempo
e energia são despendidos para administrar e coordenar políticas públicas,
assim como para harmonizar as conflitantes demandas populares.
É
preciso notar que todo o esforço do governo federal para banalizar o
vírus e combater a vacinação vem, ao fim e ao cabo, promovendo
uma ação descoordenada extremamente custosa e que coloca em risco vidas de
famílias e de empresas. A sociedade e a mídia incorrem, literalmente em custos
desnecessários, para restaurar a verdade e sinalizar o óbvio: o vírus é
perigosíssimo, e a vacina é insubstituível!
Para
otimizar esses custos de coordenação e sinalização, o Poder Legislativo deverá
atuar de forma independente, promovendo uma agenda capaz de assegurar saúde,
renda e empregos,
sobretudo para os grupos mais afetados pela pandemia, sem descuidar do processo
de recuperação econômica do país. São agendas complementares, na medida em que
o controle do novo coronavírus é condição necessária para a retomada do
crescimento.
Por
um lado, faz-se necessário priorizar uma agenda social para sustentar o
SUS, assegurar
renda básica e atrair mais investimentos. Isto supõe a provisão
de crédito mais barato, em subsídios, se necessário, a empresas atingidas pela
crise. É inadmissível o setor público não agir diante de situações
como a que ocorreu em Manaus: pessoas morrendo em hospitais por
asfixia por falta de equipamentos básicos, como balões de oxigênio. Da mesma
forma, não se pode deixar que pessoas e empresas atingidas pelas consequências
da Covid-19 sejam abandonadas à sua própria conta.
Ademais,
deve-se priorizar também uma agenda econômica para fomentar a recuperação
econômica do país. Para tanto, é fundamental discutir reformas que tornem o
setor público mais eficiente e que estimulem o setor privado a investir no
país. Cito, por exemplo, reformas como a administrativa e
os projetos de lei tidos como relevantes para dinamizar os investimentos em
infraestrutura.
Por
fim, vale lembrar que não iremos longe se não promovermos uma ação
governamental planejada e coordenada, mais pragmática e menos ideológica. Para
isso é fundamental apostarmos as fichas na independência do Congresso Nacional.
*Senador da República (PSDB-SP), ex-governador de São Paulo (2007-2010), ex-prefeito de São Paulo (2005-2006) e ex-deputado federal (1987-1991); doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA)
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