Folha de S. Paulo
Proposta é péssima, mas não pelas razões
apontadas
Como defendi
neste espaço, o que explica a proposta do distritão no atual momento é o
choque representado pela proibição de coligações em 2017. A regra foi aprovada
pela legislatura eleita em 2014, mas criou problemas para a reeleição da eleita
em 2018. O cientista político André Regis foi certeiro: “nunca antes uma
legislatura havia inviabilizado a reeleição da seguinte”.
Isso explica porque, na atual proposta, o
distritão valeria apenas como regra de transição. A relatora da PEC tenta agora
restaurar o status quo ex ante —as coligações em eleições proporcionais e
acesso universal a fundos públicos—, o que é ainda pior do que o distritão;
significa a volta do mercado espúrio de compra de apoio de partidos pequenos
cujos “donos” negociam a adesão de legendas e candidatos.
A proposta tem levado a interpretações equivocadas entre analistas, mesmo os mais qualificados. Colomer sintetizou o conhecimento acumulado sobre por que regras eleitorais são reformadas na expressão regra micromega. No caso de escolhas eleitorais: “o grande prefere o pequeno e o pequeno prefere o grande”. Na fábula de Voltaire, Micrômegas, um gigante de oito léguas de altura, deixa o planeta Sirius para viajar pelo universo. A moral da história é que as preferências e incentivos mudam com a perspectiva dos atores.
Sim, partidos pequenos preferem distritos
eleitorais e assembleias grandes porque assim maximizam suas chances de eleição;
e os grandes, o contrário —exceto quando têm expectativa de serem minoritários.
Colomer testou a hipótese com dados para todas as reformas eleitorais do século
20.
Partidos grandes preferem distritos uninominais (voto distrital) e partidos
pequenos, distritos com grande magnitude (que chegam a ser gigantescos como no
Brasil cuja magnitude media é 17 —o número de deputados varia de 8 a 70).
Os partidos pequenos deveriam em tese
rejeitar o distritão porque ele é usualmente classificado como da família majoritária,
em oposição a proporcional. Mas isso é um erro como mostrou empírica e
formalmente Gary Cox, em “SNTV and d’Hondt are equivalent”, Electoral Studies. Sim, o
distritão em distritos grandes tem efeitos semelhantes à representação
proporcional; ele é péssimo, mas não por que não garante proporcionalidade.
O distritão está sendo proposto em resposta
ao choque de 2017 e é consistente
com a nossa hiperfragmentação. Como todos os deputados federais vêm de
partidos pequenos e médios, suas preferências pelo modelo é consistente.
Mas a solução não é embarcar nem na canoa
furada do distritão nem voltar ao mercado persa de chapas anterior e
implementar plenamente a reforma de 2017.
*Professor da Universidade Federal de
Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA)
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