O Estado de S. Paulo
Há uma previsão de taxa positiva e outra, de taxa negativa, ambas de valor absoluto próximo de 0,1%
O Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) divulgará no início de dezembro a variação do produto
interno bruto (PIB) no terceiro trimestre deste ano. No primeiro, foi de 1,2%,
relativamente ao trimestre anterior, uma ótima taxa trimestral. Mas ficou por
aí, e no segundo teve até pequena queda, de 0,1%. As perspectivas para o
terceiro trimestre, examinadas mais à frente, são péssimas. Pode vir até outra
taxa negativa, o que levaria o PIB a uma “recessão técnica”, marcada por dois
trimestres consecutivos de queda. Se vier, será rasa em sua profundidade, mas
incomodará, pois será mais um sinal de que a economia brasileira vai mal.
Passando à política econômica do governo
Bolsonaro, ela é marcada pelo desgoverno. Desde o início, o presidente só pensa
naquilo, ou seja, em ganhar a eleição de 2022. Despreza a questão fiscal, agora
com a compra de votos no atacado, ao oferecer R$ 400,00 mensais de Auxílio
Brasil para angariar apoio principalmente no Nordeste, onde sua rejeição é
maior e Lula atrai a maioria. Mas Lula, também com pouco apego à questão
fiscal, na sua campanha poderá prometer R$ 600,00, em lugar dos R$ 400,00 de
Bolsonaro, e dizer, ainda, que estes só valerão até dezembro de 2022, e sua
proposta seria de algo permanente.
Na economia também há forte inflação, no que a própria política governamental tem parte da culpa, porque a questão fiscal foi agravada com a PEC dos Precatórios, com o maior teto de gastos e com a insistência da Câmara dos Deputados nas chamadas emendas do relator, que acabaram tendo um assim-não-dá do Supremo Tribunal Federal. Mas o governo vai insistir, e tudo isso gera incertezas na economia, refletindo-se na taxa cambial, que aumenta e gera mais inflação, o que, por sua vez, leva a aumentos de juros pelo Banco Central, desestimula consumidores de bens e serviços e desencoraja empresários a fazer investimentos em formação bruta de capital fixo (mais infraestrutura, fábricas, fazendas e outros investimentos), que poderiam expandir o PIB e gerar mais empregos.
Empresários se orientam pela perspectiva de
lucros e por um cenário que garanta a realização deles, e este é prejudicado
pelas incertezas que vêm do lado fiscal. A certeza é de que o governo não tem
compromisso com esse lado.
No detalhe, o terceiro trimestre foi de
entressafra agrícola, com o que o PIB do setor agropecuário deve mostrar taxa
negativa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio
Vargas (IBRE-FGV), em fase de divulgação, espera-se que a indústria como um
todo não tenha crescimento, caindo a produção da indústria extrativa, a da
indústria de transformação e a de eletricidade – quedas aliviadas pelo bom
desempenho da construção civil. Ainda que com queda do comércio, mas
impulsionado pelos transportes e por outros serviços, espera-se um crescimento
do setor de serviços. Com essas e outras informações, o IBRE-FGV prevê
crescimento de apenas 0,1% no terceiro trimestre. Quase nada.
Na terça-feira passada, vieram números de
uma segunda fonte de dados trimestrais, o Índice de Atividade Econômica do
Banco Central (IBC-BR), que procura prever as variações do PIB. A previsão para
o terceiro trimestre foi de uma queda à taxa de 0,14%, que, se confirmada pelo
IBGE neste ou noutro valor negativo, marcaria o início de mais uma recessão
técnica, conforme já explicado acima. Entre as duas previsões citadas, prefiro
ver confirmada a taxa negativa do IBC-BR. A diferença entre as duas é pequena,
mas a notícia de uma nova recessão acentuaria mais o mau estado da economia,
que talvez assim recebesse atenção maior do governo e da sociedade.
Até agora, o PIB não voltou ao seu valor de
2014 (!), nem deve voltar no final deste ano. Aliás, é enganosa, no que se
refere à realidade atual, a taxa esperada para o PIB segundo o mais recente
boletim Focus, do Banco Central (BC) – um aumento de 4,9% em 2021,
relativamente ao PIB de 2020. Enganosa porque a parte mais importante dela, de
3,6%, ocorreria mesmo que o PIB tivesse crescimento nulo dentro de 2021, pois o
cálculo é feito relativamente ao buraco que teve em 2020, quando caiu 4,1% e
fez uma recuperação em V até o fim do ano. Mas, olhando apenas o crescimento
dentro de 2021, a taxa esperada é de apenas 1,3%, que, somada à citada parcela
de 3,6%, levaria aos 4,9%.
Vem aí a época de festas, mas, no caso do
PIB, só haverá o que lamentar. E Bolsonaro? Certamente, comemorará as 400
pratas que distribuirá por meio de sua nova versão do Bolsa Família, esperando
que seja reverenciado por quem teve a sorte de levar o dinheiro. E o presidente
também quer um inoportuno reajuste salarial para o funcionalismo público
federal.
Quanto ao Brasil e seu PIB, o legado que
Bolsonaro vai deixar já pode ser previsto, e é lamentável. As taxas do PIB
durante o seu mandato devem ficar em 1,2% (2019), -4,1% (2020), 4,9% (2021) e
0,9% (2022), as duas últimas conforme previsões do mais recente boletim Focus.
A média aritmética delas ficaria em 0,73%, uma das mais baixas da história dos
mandatos presidenciais brasileiros.
*Economista (UFMG, USP E HARVARD),
professor sênior da USP, é Consultor econômico e de ensino superior
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