domingo, 22 de outubro de 2023

Marco Antonio Villa* - O extremismo às avessas

É mais confortável a “guerra ideológica” do que refletir e debater democraticamente os problemas nacionais

As recentes declarações da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e de sua assessora Marcelle Decothé após a final da Copa do Brasil recolocou o extremismo às avessas no primeiro plano da cena política nacional. Ou seja, questões absolutamente secundárias, que mobilizam “gatos pingados”, deixam de lado os grandes problemas e – aí o perigo é maior ainda – jogam água no moinho do extremismo bolsonarista. Curiosamente, em um momento de enfraquecimento político de Jair Bolsonaro. Certamente, o mandrião deve ter agradecido entusiasticamente tanto à ministra, quanto à sua assessora.

Em inúmeras postagens nas redes sociais, a assessora atacou os “brancos”. Para ela, todos os “brancos” são culpados pelas mazelas brasileiras. É uma típica visão de um segmento da (péssima) sociologia americana. Além da descontextualização histórica, retira componentes classistas da esfera política e econômica. O primarismo analítico é evidente. Além do que, qual seria o problema (ou suposto problema) da torcida do São Paulo ser branca? Primeiro, a maioria dos seus torcedores não são brancos. Especialmente desde os anos 1990, houve um grande crescimento do número de torcedores do time do Morumbi — neste caso, relacionado com as conquistas da era Telê Santana. Mas não estamos na África do Sul na época do apartheid, como supõe a assessora. Pior ainda, ela ataca covardemente os “paulistas”. Qual a razão (se é que poderia haver alguma razão) desta agressão? E os palavrões na mesma postagem?

Para completar, a assessora, seguindo os passos da ministra, “adota” o que chamam de linguagem neutra. Aí a idiotia atingiu o ápice. É até ridículo, causa riso, a todos nós. Contudo, cai como uma luva para os extremistas bolsonaristas que estão sempre à espreita, aguardando a ação do outro extremismo. Vivem do confronto sem ideias, do xingamento, das notícias falsas, do acirramento do que intitulam de polarização. Isto porque ambos os extremismos não têm ideias, não imaginam, em momento algum, refletir, analisar, estudar, debater, democraticamente os grandes problemas nacionais. É mais confortável a “guerra ideológica”, denominação daqueles que, no máximo, alcançam o senso comum como elemento de reflexão.

O Ministério da Igualdade Racial não pode se transformar em Ministério da Desigualdade Racial. Seria mais recomendável ser extinto e suas atribuições serem incorporadas pelo Ministério dos Direitos Humanos. Em tempo: há voo comercial entre Brasília e São Paulo. E muitos.

*Publicado IstoÉ, nº 2803, 25/10/2023

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Linguagem neutra é de uma bobagem sem fim,rs.