domingo, 22 de outubro de 2023

Celso Ming - A Argentina e o fator Milei

O Estado de S. Paulo

A possibilidade de que o economista Javier Milei seja eleito presidente da Argentina ainda neste domingo é mais do que uma hipótese remota. Bastará para isso que tenha 45% dos votos ou 40% com vantagem de 10 pontos porcentuais sobre o segundo colocado. Caso essas diferenças não aconteçam, o segundo turno ocorrerá dia 19 de novembro.

Se confirmada a eleição de Milei, no primeiro ou no segundo turno, como apontam as pesquisas, será difícil evitar fortes convulsões no mercado financeiro local. Inflação próxima dos 150% ao ano, desabastecimento, dólar no patamar dos mil pesos e empobrecimento crescente compõem o quadro atual que, então, poderá piorar.

Embora Milei tenha afirmado e reafirmado que daria urgência a seus projetos de dolarização da economia e de fechamento do banco central, parece improvável que isso ocorra imediatamente. Antes disso, será preciso arrancar de um Congresso potencialmente hostil as leis que mudem o regime. E, ainda, assegurar pelo menos US$ 40 bilhões extras, para garantir numerário destinado à circulação, quantia difícil de obter, uma vez que nem o FMI nem o Banco Mundial parecem dispostos a fornecer, num ambiente de esgotamento das reservas, de dívida crescente em moeda estrangeira (porque o peso seria eliminado) e de deterioração fiscal.

É verdade que os argentinos têm armazenados em casa ou em bancos estrangeiros algo em torno de US$ 250 bilhões. Mas não dá para contar com que parte desses recursos seja sacada de debaixo dos colchões, sem que antes os planos do novo governo comprovem sua viabilidade.

Milei foi até agora incapaz de apresentar um plano B para seus projetos estapafúrdios. Caso

seu governo se mostre incapaz de executar imediatamente o cavalo de pau a que se propõe, cabe imaginar complicadas linhas de ação alternativas sem, no entanto, dá-las como certas.

Uma delas seria um pacote de complexa composição que tratasse de unificar o câmbio hoje subdividido, liberasse os preços e impusesse, com apoio do FMI, uma drástica redução de despesas que assegurasse um superávit fiscal e a derrubada da inflação. O custo imediato desse ajuste seria recessão, desemprego e complicações políticas.

Outra opção poderia ser um ataque direto à inflação inercial, nos moldes da Unidade Real de Valor (URV) que precedeu o Plano Real, em 1994, providência que não dispensaria uma austera política de contenção de despesas e seus custos políticos.

Fora disso, a política econômica continuaria calcada no mesmo populismo dos governos anteriores ou em quase isso. Mas esse tipo de escolha não só contrariaria a plataforma em que se apoia, mas, também, deixaria a economia entregue ao mesmo estado falimentar em que está prostrada hoje.

Enfim, o projeto Milei não garante conserto. Qualquer que seja ele, não será barato. Mas tampouco o prometem as opções dos outros dois candidatos no topo das preferências de intenção de voto.

 

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