O Globo
O crescimento não é sustentável a médio prazo
se continuar baseado na expansão do gasto e da dívida pública
Não há contradição entre o pibão e o dólar a
R$ 6.
Não há contradição entre aplaudir o
crescimento atual e manifestar preocupação com os próximos dois anos. Não há
contradição entre a economia real e o mercado financeiro, como se este pudesse
ir bem se o país estivesse em frangalhos. O mercado apoia a economia real.
Eis um exemplo: neste ano, as companhias
aumentaram o financiamento tomado no mercado de capitais, mediante a emissão de
debêntures ou outras operações. Investidores no mercado compram os papéis das
empresas e ganham com isso. As companhias se financiam a prazo mais longo e a
juros menores que nos bancos.
Bobagem, portanto, dizer que o mercado financeiro joga contra o país real. Isso seria jogar contra as empresas, participantes vitais do mercado como tomadores ou investidores.
Outro exemplo: estão em forte expansão no
país as concessões de obras e serviços à iniciativa privada. Governos estaduais
concedem rodovias, ferrovias, saneamento, para citar os setores mais
importantes. Mesmo o governo federal tem feito concessões. Essas operações são
estruturadas no mercado. As concessionárias buscam ali o capital para tocar os
negócios. Dito de maneira simples: não há mercado financeiro sem companhias e
pessoas atuando na economia real. E inversamente.
Os fundos de previdência — como Petros e
Previ, dois gigantes estatais — estão no mercado, buscando oportunidades de
investimento que garantam a aposentadoria de seus associados. Dependem de
existir bons negócios em que investir. Todos os fundos torcem a favor das
empresas e, pois, da economia em geral.
Se é assim, e se a economia cresce com as
empresas, por que o nervosismo no mercado? Porque se esperava um pacote de
corte de gastos mais consistente. O mercado acreditava que o ministro Fernando
Haddad conseguiria impor ao governo um bom programa de ajuste.
No ponto de partida, havia ampla concordância
entre o pessoal do mercado e Haddad, no seguinte sentido: o arcabouço fiscal
precisa de uma redução no crescimento das despesas para se manter de pé. Por
isso Haddad, como ele diz, gastou tempo, energia e criatividade na preparação
do programa. Para o mercado, o ministro estava na direção correta, procurando
corrigir o ponto crítico, que está no crescimento acelerado, acima do padrão do
arcabouço, das despesas obrigatórias (Previdência, salários, Bolsa Família e
demais programas sociais).
Se não houvesse problema algum, não
precisaria passar o pente-fino no Bolsa Família e nos programas sociais, além
de reduzir o ritmo de crescimento real do salário mínimo. Daí vem a decepção do
mercado. Esperava-se algo mais substancial. Tanto que as projeções do dólar
para este ano e o próximo estavam bem abaixo dos R$ 6. Para a taxa básica de
juros, a expectativa dominante indicava um máximo de 13%, voltando a cair já no
próximo ano.
Quando veio um pacote meia-boca, o mercado
foi pego no contrapé. A redução de gastos será menor, de maneira que a dívida
pública crescerá mais. Dívida em alta equivale a mais juros, dólar mais
pressionado e inflação.
Tudo, juros e câmbio, foi ajustado para cima. Fundos perderam dinheiro.
Ainda assim, o pessoal entende que é melhor
meio pacote do que pacote nenhum. Quando surgiram informações de que o
Congresso aprovaria os cortes, houve algum alívio no mercado. E que será maior
se o programa passar antes do final do ano. Acredita-se que dá uma sobrevida ao
arcabouço, sendo necessária alguma revisão mais à frente — como aliás já
sugeriu o próprio Haddad.
O mercado também não gosta desses juros nas
alturas — aumenta o risco de crédito —nem do dólar caro, que, além de gerar
inflação, reduz o patrimônio em dólares de todo mundo que tem dinheiro aplicado
no Brasil.
O pibão é o presente. O dólar a R$ 6 é a
preocupação com o futuro. O crescimento não é sustentável a médio prazo se
continuar baseado na expansão do gasto e da dívida pública. O mercado gostaria
de um crescimento mais baseado na poupança, no investimento e na produtividade.
2 comentários:
sardemberg é uma espécie de mônica waldvoguel:
gagás os dois!
" Não há mercado financeiro sem companhias e pessoas atuando na economia real. E inversamente. "
" Até " os asiáticos, chineses e coreanos do sul em especial, perceberam isso.
Perfeito !
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