segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Trump - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

Apesar de seu estilo desagradar a muitos, presidente americano é um fino estrategista. Sabe utilizar as armas que tem: a força militar e o poderio econômico

É Donald Trump “louco”? Bravateiro? A seguir boa parte da cobertura midiática e jornalística, o mundo estaria à beira da falência. Outros o qualificam como “colonialista”, “imperialista”. Todavia, tais apelações apenas expõem a perplexidade da esquerda e de autointitulados “especialistas”, que procuram tão só aferrar-se a suas ideologias. A questão consiste, porém, em que quando não se entende um fenômeno, a única alternativa reside na repetição de velhas fórmulas e ações infrutíferas. Se há loucura em Trump, é a que se faz com método.

Apesar de seu estilo desagradar a muitos, Trump é um fino estrategista. Sabe utilizar as armas que tem à sua disposição: a força militar e o poderio econômico. Não se atém nem a tratados internacionais com nações amigas, como o tratado de livre comércio com o México e o Canadá. Terminou a era em que o discurso democrata politicamente correto simulava ditar as cartas, que eram simplesmente desrespeitadas. O diálogo, agora, torna-se subsequente à ameaça, que pode tornarse realidade a qualquer momento. Trump está introduzindo um novo mindset, um novo paradigma geopolítico. E a partir dessas novas ideias, novas ações surgirão.

Em nosso continente, os resultados já se fazem sentir. O governo esquerdista de Gustavo Petro tentou enfrentar Trump e foi literalmente humilhado. A presidente do México, Claudia Sheinbaum, ao dar-se conta de que Trump não recuaria no aumento da tributação dos produtos importados de seu país, comprometeu-se a controlar a imigração ilegal e o narcotráfico. O presidente do Panamá, José Raúl Mulino, tentou fazer frente ao presidente americano. Retrocedeu imediatamente na visita de Marco Rubio, ministro de Relações Exteriores, inclusive saindo da Rota da Seda.

Assinale-se, ainda, duas atitudes que destoam dessas reações iniciais: China e Brasil. A China respondeu moderadamente e, pasme-se, recorreu à Organização Mundial do Comércio. Os comunistas recorreram a uma agência internacional criada para regrar o livre comércio internacional segundo uma lógica liberal! Lula da Silva foi igualmente comedido. Não teve nenhum arroubo e orientou a diplomacia brasileira a evitar qualquer atrito. Mudou o seu discurso anterior de enfrentamento com Trump. Igualmente emitiu uma nota, muito bem elaborada, condenando o antissemitismo e relembrando os horrores do Holocausto. Parece aí sinalizar para uma trégua com o Estado de Israel, a depender de seus próximos passos.

Trump pensa fora das ideias recebidas. Sua postura relativa ao Oriente Médio é uma prova disso. De nada adianta repetir as mesmas fórmulas e os mesmos fracassos. Reconstruir Gaza! Como? Reerguendo a estrutura do terror? Quando Ariel Sharon saiu de Gaza em 2005, coube aos palestinos exercerem a sua autodeterminação. O que fizeram? Primeiro, entraram em uma guerra civil entre o Hamas e o Fatah, com a vitória do primeiro, lançando centenas dos membros do segundo de altos edifícios. Posteriormente, o Hamas não se preocupou com o bem-estar material dos palestinos. Pior, veio a utilizá-los como escudos humanos. A ajuda humanitária foi desviada para a construção de túneis e a aquisição de armamentos. A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA, na sigla em inglês) tornou-se um mero instrumento do terror. A destruição de Gaza é uma das grandes conquistas do Hamas. E querem eles agora ditar os termos de um acordo que lhes permita voltar à situação anterior?

A retórica de Trump não deixa de ser desconcertante ao propor uma nova “Riviera do Oriente Médio”. Para além da imagem, o problema colocado é importante. A reconstrução de Gaza não pode ser feita sem um deslocamento populacional, salvo se essas pessoas ficarem expostas a tendas e às intempéries durante um período de 10 a 15 anos. Claro que qualquer deslocamento deve ser voluntário, com garantias a serem estabelecidas entre as partes. Se essa ideia não for aceitável, que outros atores apresentem soluções factíveis.

Clamar pela solução de dois Estados está agora fora do horizonte após o massacre de 7 de outubro. Historicamente, os árabes recusaram a partição da Palestina conforme a proposta da Comissão Peel nos anos 1940, não aceitaram tampouco a partição da ONU em 1947, tendo como único objetivo a destruição do Estado de Israel. Tentaram novamente eliminar o Estado judeu nas guerras de 1967 e 1973. Yasser Arafat recusou a criação de um Estado palestino, com pequenas correções territoriais, proposto pelo ex-presidente Bill Clinton e e pelo exprimeiro-ministro israelense Ehud Barak. As guerras do Hamas são apenas o epílogo desse longo processo destrutivo.

Trump busca novas soluções. Se ganhar 50% do que está propondo, já é uma grande vitória. Talvez tenha em vista a proposta do ex-embaixador americano em Israel, David Friedman, visando a criar uma entidade palestina juridicamente semelhante à associação de Porto Rico aos EUA. Gozo pleno da cidadania, Estado de bem-estar social, liberdade de trabalho e estudo, sem, no entanto, ter independência em questões de defesa, de relações exteriores e tributárias. O objetivo é uma vida digna. •

 

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