Folha de S. Paulo
Trapalhadas do clã favorecem governo, que
precisa ser cuidadoso para não cair na armadilha da soberba
As medidas
cautelares que o STF impôs
a Jair
Bolsonaro se desenham como uma prévia, um "amuse bouche", da
pena de prisão a que ele quase certamente será condenado. É bom que o capitão
reformado vá experimentando aos poucos as restrições de liberdade a que será
submetido. Imagino que o gradualismo diminua o risco de depressão carcerária.
Saúde em primeiro lugar.
Se as informações de que o ex-mandatário preparava uma fuga são confiáveis, as medidas adotadas estão plenamente justificadas. Seria muito ruim para a Justiça se Bolsonaro conseguisse furtar-se a sanções penais por crimes graves que tenha cometido e pelos quais tenha sido julgado numa corte que tem falhas, mas que fica ainda muito aquém de configurar-se como tribunal de exceção.
Vale observar que o ministro Alexandre
de Moraes, tido como severíssimo, até exerceu alguma autocontenção. O risco
de fuga, afinal, justifica não apenas medidas cautelares, como
a tornozeleira afixada ao ex-presidente, mas a própria prisão preventiva,
que o magistrado graciosamente dispensou.
As maquinações
de Dudu em Washington não são, é claro, a causa dos dissabores de
Bolsonaro, mas foram o elemento que precipitou essa situação. Se arrependimento
matasse...
No plano político, Lula vai
faturando em cima dos erros do clã e ganha autoconfiança. Encontrou disposição
até para vetar o PL que aumenta o número de deputados. No mérito, o veto é
corretíssimo, mas veremos após o recesso parlamentar se o governo terá fôlego
para aguentar a resposta do centrão. Encontrar e aprovar pautas-bomba nunca foi
um problema para o grupo.
Os clássicos nos alertam para os perigos da
"hýbris" (soberba). A eleição é só daqui a um ano e três meses, e o
surto de popularidade proporcionado pelas trapalhadas dos Bolsonaros tende a
ser transitório. Se o governo não se voltar para as questões que afetam a vida
real dos brasileiros, é provável que os mesmos problemas que vinham até aqui
minando a avaliação da administração voltem a dar as cartas.
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