sábado, 19 de julho de 2025

Bolsonaro sente o gostinho da cadeia - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Trapalhadas do clã favorecem governo, que precisa ser cuidadoso para não cair na armadilha da soberba

As medidas cautelares que o STF impôs a Jair Bolsonaro se desenham como uma prévia, um "amuse bouche", da pena de prisão a que ele quase certamente será condenado. É bom que o capitão reformado vá experimentando aos poucos as restrições de liberdade a que será submetido. Imagino que o gradualismo diminua o risco de depressão carcerária. Saúde em primeiro lugar.

Se as informações de que o ex-mandatário preparava uma fuga são confiáveis, as medidas adotadas estão plenamente justificadas. Seria muito ruim para a Justiça se Bolsonaro conseguisse furtar-se a sanções penais por crimes graves que tenha cometido e pelos quais tenha sido julgado numa corte que tem falhas, mas que fica ainda muito aquém de configurar-se como tribunal de exceção.

Vale observar que o ministro Alexandre de Moraes, tido como severíssimo, até exerceu alguma autocontenção. O risco de fuga, afinal, justifica não apenas medidas cautelares, como a tornozeleira afixada ao ex-presidente, mas a própria prisão preventiva, que o magistrado graciosamente dispensou.

As maquinações de Dudu em Washington não são, é claro, a causa dos dissabores de Bolsonaro, mas foram o elemento que precipitou essa situação. Se arrependimento matasse...

No plano político, Lula vai faturando em cima dos erros do clã e ganha autoconfiança. Encontrou disposição até para vetar o PL que aumenta o número de deputados. No mérito, o veto é corretíssimo, mas veremos após o recesso parlamentar se o governo terá fôlego para aguentar a resposta do centrão. Encontrar e aprovar pautas-bomba nunca foi um problema para o grupo.

Os clássicos nos alertam para os perigos da "hýbris" (soberba). A eleição é só daqui a um ano e três meses, e o surto de popularidade proporcionado pelas trapalhadas dos Bolsonaros tende a ser transitório. Se o governo não se voltar para as questões que afetam a vida real dos brasileiros, é provável que os mesmos problemas que vinham até aqui minando a avaliação da administração voltem a dar as cartas.

 

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