Partidos são porta para infiltração do crime na política
Por O Globo
Caso TH Joias expôs contaminação profunda das
instituições. Legendas têm papel vital para combatê-la
Ao comparecer à CPI do Crime Organizado, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, relatou ter apelado aos presidentes de partidos para fazer uma “triagem” que evite, nas eleições do ano que vem, candidaturas ligadas a organizações criminosas. É sem dúvida uma iniciativa correta, mas é triste que o Brasil tenha chegado a ponto de isso ser necessário. O avanço alarmante da criminalidade já há algum tempo dá sinais de infiltração na economia formal e nas instituições da República. A porta de entrada na vida pública são os partidos, e é por meio deles que a contaminação avança pela política. Detê-la é urgente.
Não existe exemplo mais eloquente disso do
que a chegada à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj)
de Thiego Raimundo dos Santos Silva, conhecido como TH Jóias. Eleito como suplente,
ocupou uma cadeira na Casa até ser preso sob a acusação de vínculo com o
Comando Vermelho (CV). Já seria um escândalo a simples existência de um
deputado estadual suspeito de tráfico de armas, drogas e de atuar em favor de
uma facção criminosa. Mas a história não ficou apenas nisso.
A investigação revelou indícios de que o
próprio presidente da Alerj, Rodrigo
Bacellar, avisara TH sobre a iminência da operação, de modo que ele
pudesse se livrar de evidências comprometedoras e fugir. Uma câmera de rua
gravou cenas de um pequeno caminhão estacionando e sendo carregado à noite em
frente à casa de TH Jóias. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal
Federal (STF), determinou também a prisão de Bacellar, mas o plenário da Alerj
— a cujo crivo a decisão foi submetida — o libertou. Moraes manteve Bacellar
fora da Presidência e sob o monitoramento de tornozeleira eletrônica, e ele se
licenciou do mandato. Mas, novamente, a história não ficou apenas nisso.
Os investigadores descobriram evidências
sugerindo que o desembargador federal Macário Ramos Júdice Neto, do Tribunal
Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), estava com Bacellar quando ele avisou TH
sobre a operação policial que o prenderia. Macário era o relator do caso no
TRF-2 e havia assinado o mandado de prisão. Ele já ficara afastado da
magistratura por 18 anos, sob a acusação de venda de sentenças. Moraes mandou
prendê-lo, e ele foi afastado do cargo. Quem pode garantir que a história
ficará nisso?
Por isso é premente a tarefa dos partidos de
filtrar seus candidatos, levando em conta prontuário policial e histórico penal
dos postulantes. Desde 2010, a Lei da Ficha Limpa barra a candidatura de
condenados em segunda instância em processos penais ou mesmo administrativos.
Mas o Congresso afrouxou as regras de inelegibilidade e, apesar de vetos
pontuais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve a essência das
mudanças. Em 2024, nas eleições para prefeito e vereador, a Ficha Limpa barrou
1.968 candidaturas. Infelizmente, ela deixará de ter a mesma eficácia daqui
para frente, abrindo brechas de que criminosos tentarão se aproveitar.
O crescimento em tamanho e sofisticação do crime organizado tem superado a capacidade da legislação de conter sua infiltração nas instituições — a começar pelo próprio aparelho de segurança pública. É imperioso que se ampliem as barreiras. Os partidos políticos têm papel vital nessa missão.
Adoção do impedimento automático promete melhorar qualidade do
futebol
Por O Globo
Toda tecnologia é bem-vinda, mas nenhuma
resolve os problemas crônicos que afligem a arbitragem
Foi oportuna a decisão da Confederação
Brasileira de Futebol (CBF)
de usar na Série A do Campeonato Brasileiro e na Copa do Brasil, a partir de
2026, a tecnologia conhecida como impedimento semiautomático (ou Saot, na sigla
em inglês). Ela promete trazer mais precisão, rapidez e transparência aos
lances em que há dúvida se o jogador está adiantado. Por meio da combinação de
imagens de câmeras, geometria e leis da física, o sistema é capaz de detectar
automaticamente o ponto no corpo do atleta mais próximo da linha de fundo.
Hoje, os longos minutos de espera — e
suspense — enquanto as linhas são traçadas costumam causar indignação. Na
dúvida, jogadores seguram a comemoração, e locutores esportivos ficam sem saber
se gritam ou esperam o fim da checagem. A narração do gol minutos depois de a
bola entrar corta o clima.
Apresentado mundialmente na Copa de 2022, no
Catar, o impedimento semiautomático já é adotado em competições da Premier
League (Inglaterra) e La Liga (Espanha), entre outras. A implantação do novo
sistema exigirá adaptações nos estádios que recebem partidas da Série A. Cada
local deverá ser equipado com 24 câmeras com cobertura total do campo. O
contrato fechado pela CBF com uma empresa britânica prevê também sistema de
rastreamento de jogadores, árbitro e bola.
A tecnologia é sempre bem-vinda para auxiliar
o esporte e dirimir dúvidas. Usado de forma rotineira no Brasileirão desde
2019, o VAR representou um avanço, apesar de não ter posto fim à polêmica. A
despeito das reclamações — relacionadas mais ao uso que à tecnologia em si —, é
difícil imaginar o futebol sem o árbitro de vídeo. Ou alguém tem dúvida de que
o histórico gol de mão marcado por Diego Maradona na Copa do Mundo de 1986 hoje
seria anulado?
Mas tecnologia, por melhor que seja, não
apita jogo. E aí entra um problema que nem VAR nem Saot podem resolver: a
arbitragem nos campeonatos nacionais tem se mostrado sofrível. É certo que a
CBF realiza cursos de aperfeiçoamento para os árbitros, mas claramente eles não
têm resolvido. Punições e afastamentos também não. O que se viu em 2025 foi
preocupante. Não se salvaram nem árbitros do quadro da Fifa, considerados os
mais bem preparados. Torcedores de todos os times têm pelo menos um lance
grotesco para relatar.
Para além dos avanços tecnológicos, a CBF precisa melhorar a qualidade da arbitragem, de modo a evitar o festival de erros grosseiros nos gramados. Em campeonatos cada vez mais equilibrados, uma falha da arbitragem pode selar o destino de um clube e consagrar vitórias ou rebaixamentos injustos.
PIB
interrompe neste 2025 série de surpresas positivas
Por Folha de
S. Paulo
Economia desacelerou como previsto,
com impacto de juros altos decorrentes da inflação e do gasto público
O quadro mais amplo é de
endividamento público crescente, níveis baixos de investimento e juros
proibitivos para famílias e empresas
A economia brasileira deve crescer
pouco acima dos 2% neste 2025, segundo a mediana das estimativas de mercado
pesquisadas semanalmente pelo Banco Central. Para o Ministério da Fazenda, o avanço do Produto
Interno Bruto será de 2,2%; para o próprio BC, de 2,3%.
Desse modo, as cifras ficam próximas
entre si e também das expectativas de analistas coletadas no início do ano, de
2,01%. Interrompe-se, portanto, a série de surpresas positivas com PIB observada de 2022 a 2024, depois de superado o
pior da pandemia.
Erros nas previsões para a atividade
não são incomuns. Costumam ocorrer imprevistos relevantes, econômicos, políticos
ou de outra natureza, como eventos climáticos. Os modelos de projeção são
imperfeitos. Ainda que não fossem precários, as relações entre variáveis no
passado não dão conta de inovações e mudanças estruturais.
Mais importante é se valer das estimativas para entender influências nelas desconsideradas.
Como tem observado Bráulio Borges, colunista desta Folha, o aumento do
gasto público vinha sendo subestimado, não apenas o do governo Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) como os de estados e
municípios. A alta da despesa animou de início uma economia deprimida desde
2015, com grande ociosidade de trabalho e capital.
Os efeitos colaterais do
expansionismo orçamentário ficaram visíveis em 2024, com sinais de
superaquecimento e inflação. O descrédito da política fiscal,
crescente ao longo do ano passado e evidenciado também na taxa de câmbio, contribuiu para a alta dos preços e
dos juros.
Há indícios de que mudanças no mundo
do trabalho evitaram inflação ainda maior, mesmo com taxas de desemprego
baixas. A reforma da CLT de 2017 flexibilizou contratos e diminuiu custos de
contratação; houve mudanças tecnológicas, a influenciar a oferta de mão de
obra.
Já o avanço do mercado de capitais e
da concorrência bancária facilitaram o crédito, o que parece ter contido o
efeito das taxas de juros elevadíssimas, fazendo com que atividade econômica
arrefecesse mais lentamente.
O fator exógeno mais importante do
ano foi a desvalorização mundial do dólar, resultante das trapalhadas de Donald Trump, que contribuiu para conter a
inflação doméstica. O sucesso da agropecuária, a moderação dos preços mundiais
dos alimentos e do petróleo, além de exportações chinesas de bens industriais
baratos, foram outros atenuantes da carestia.
O gasto público total, embora nas
alturas, cresceu menos. Como resultado, o pouso da economia é suave. No curto
prazo, há convergência lenta do IPCA para a meta, sem choque no PIB.
O quadro mais amplo, porém, é de endividamento público
crescente e níveis baixos de investimento, despesa
governamental alta e ineficiente combinada a juros proibitivos para famílias e
empresas. Por óbvio, não é receita de crescimento duradouro.
Mais um verão
de praias sujas
Por Folha de
S. Paulo
Número de balneários que são próprios
para banho é o menor desde 2016, o que afeta saúde pública e turismo
De 820 praias, só 253 foram
consideradas boas; é preciso avançar em parcerias público-privadas para
melhorar sistema esgoto e drenagem
Verão e festas de fim de ano são
sinônimos de praia no Brasil. Infelizmente, a qualidade das águas nos cerca de
7.400 km de sua faixa litorânea continua baixa, colocando em risco a saúde da população e
prejudicando o turismo.
Segundo levantamento realizado
pela Folha, das 820 praias avaliadas em 2025, só 253 (30,2%) foram consideradas próprias para banho —o
menor número da série história iniciada em 2016, desconsiderando 2020, devido à
pandemia. As em situação regular somaram 288, enquanto 143 estavam ruins, e
136, péssimas.
O cenário deste ano não foi tão
diferente do verificado em 2024 (255, 295, 136 e 134, respectivamente), mas foi
pior do que o de 2016, quando 370 praias eram boas, ante 84 ruins e 119
péssimas.
As praias são classificadas a partir
da medição da densidade de bactérias fecais durante cinco semanas seguidas,
critério estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
O problema tem relação com o precário
sistema de saneamento e pode ser agravado com
aumento do volume de chuvas em curtos períodos de tempo —evento meteorológico
que tem se tornado mais comum devido a mudanças climáticas causadas pelo
aquecimento global.
Além do esgoto despejado em rios e no
próprio mar, cidades brasileiras carecem de estruturas de drenagem e manejo das
águas pluviais urbanas (DMAPU).
Como as superfícies dos centros
urbanos são em grande parte impermeáveis, o escoamento da água da chuva arrasta tudo o que houver pelo
caminho, como fezes de animais e lixo, e pode se infiltrar na rede de esgoto,
criando sobrecarga que extravasa para rios, canais e até as praias.
O que a DMAPU faz é coletar a água
(em bueiros, por exemplo), transportá-la de modo controlado por meio de
galerias e canais, reduzir velocidade da vazão com reservatórios e áreas de
retenção e melhorar a qualidade antes de ela chegar a rios e ao mar.
Diagnóstico do Ministério das Cidades
divulgado em 2023 mostrou que 19,2% de 4.833 municípios não tinham nenhum tipo de sistema de drenagem.
É preciso aumentar a permeabilidade
do solo nas grandes cidades com expansão de áreas veres e conter a ocupação
desordenada de zonas litorâneas. Principalmente, deve-se avançar em parcerias
público-privadas, facilitadas pelo marco legal do saneamento, para melhorar
a infraestrutura tanto de coleta e
tratamento de esgoto quanto de DMAPU.
Sem isso, a beleza do litoral brasileira continuará contrastando com a sujeira de suas águas.
Mais centro, menos Centrão
Por O Estado de S. Paulo
Democracias maduras dependem de um centro
político responsável, capaz de assegurar previsibilidade e estabilidade, não de
um conglomerado fisiológico que troca projeto por sobrevivência
Eis uma agenda imprescindível para o Brasil:
recuperar a força perdida de um centro político democrático, moderado e
estável. Esteio do eleitor que tradicionalmente privilegia a moderação e o
equilíbrio pragmático de ideias, valores e expectativas, coube ao centro servir
de fiador da governabilidade, moderador de impulsos autoritários e barreira
contra aventuras populistas periódicas que contaminam nossa tradição política.
Foi com o centro democrático que se preservou
a convicção de que o Brasil precisava – e precisa – de previsibilidade,
responsabilidade fiscal e respeito às regras, virtudes decisivas para navegar
crises econômicas e transições políticas sensíveis. Essa tendência é
corroborada por diversas pesquisas internacionais, que identificam no eleitorado
de centro a aversão a riscos institucionais e uma maior sensibilidade à
responsabilidade na formulação de políticas públicas. Os partidos centristas
atuam como amortecedores contra polarizações destrutivas.
No caso brasileiro, durante a Nova República,
especialmente depois da Constituição de 1988, siglas posicionadas no centro
desempenharam papel decisivo na construção da governabilidade. O PMDB (e depois
o MDB) foi o principal arquiteto das coalizões presidenciais, estabilizando
governos de diferentes matizes ideológicas – de José Sarney a Fernando Henrique
Cardoso, de Luiz Inácio Lula da Silva a Michel Temer – e servindo como
salvaguarda institucional nos momentos mais críticos.
O centro tradicional, no entanto, foi aos
poucos cedendo espaço a algo muito distinto no Brasil: o chamado Centrão, um
agrupamento cuja unidade não está em projetos nacionais, mas na habilidade de
extrair vantagens imediatas do governo de ocasião. Como este jornal já
sublinhou nesta página, o Centrão não é bom nem ruim; apenas é o que o
presidente, o governo ou as principais forças políticas de ocasião querem que
seja.
Tradicionalmente, o termo carrega uma
conotação pejorativa, indicando o grupo de congressistas ideologicamente
invertebrados, em especial os deputados do “baixo clero”, que se organizam para
se aproximar do governo de turno e angariar vantagens, verbas e cargos para
seus redutos paroquiais. Em outras palavras, a encarnação do clientelismo, do
corporativismo e do patrimonialismo. Por outro lado, por necessidade ou conveniência,
foi o Centrão o fiador das principais reformas e políticas públicas da Nova
República, seja em políticas sociais (como o Bolsa Família), sanitárias (SUS),
ambientais (Código Florestal) ou educacionais (novo Fundeb).
O problema hoje é outro: o que antes era o
ponto de equilíbrio virou um sistema de intermediação de interesses
particularistas, blindado contra responsabilidades e avesso a compromissos de
longo prazo. Quando a política vira balcão, decisões passam a obedecer a
lógicas patrimonialistas. Quando coincide com o interesse público, é por acaso,
não por projeto.
Falta ao Brasil uma força moderadora, capaz
de combinar responsabilidade fiscal e sensibilidade social, de reconhecer as
limitações do presidencialismo de coalizão sem transformá-lo em captura
orçamentária, e de conter extremismos sem se submeter à lógica oligárquica.
Falta ao País reconstruir esse espaço, como faltam lideranças que compreendam
que governabilidade não é submissão, que negociar é democrático e que
transformar negociação num fim em si mesmo é sua distorção. Isso exige, ainda,
um Executivo capaz de pautar prioridades nacionais – um atributo igualmente
faltante neste terceiro mandato de Lula – e um Congresso disposto a resgatar
sua função republicana.
“Mais centro, menos Centrão” não é um
capricho retórico, e sim uma necessidade estrutural para que a democracia
brasileira volte a produzir estabilidade, projeto e horizonte. Sem um centro
programático robusto, prosperam os extremos, o desequilíbrio institucional e a
deterioração da política. O Brasil precisa, novamente, de um centro que seja
centro – não de um Centrão que ocupe tudo.
O atraso do Brasil em matemática
Por O Estado de S. Paulo
Com avanços limitados e pouco tempo até o fim
do mandato, o governo Lula não consegue enfrentar deficiência da aprendizagem
em matemática, o que compromete o desenvolvimento do País
Quando, há três anos, o ex-governador e
senador Camilo Santana (PT-CE) foi nomeado ministro da Educação, vindo de sua
bem-sucedida experiência na gestão educacional cearense, abriu-se uma janela de
esperança para que o Brasil, enfim, corrigisse um erro histórico: a negligência
com o ensino básico. Afinal, o Ceará é referência nacional na alfabetização de
crianças e na melhoria dos índices de aprendizagem. Agora, no último ano do
mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o MEC de Camilo e o governo petista
podem ao menos se orgulhar de ter devolvido à pasta algum protagonismo técnico
e institucional, como uma das poucas ilhas de qualidade em meio à mediocridade
em geral da atual gestão. Sobretudo quando se compara aos anos de sombras
vividos pelo ministério sob Jair Bolsonaro.
No entanto, boas intenções, diagnósticos
corretos e retórica moderada não produzem milagres na educação. Menos ainda no
último ano de governo, razão pela qual já se pode admitir que, apesar de
iniciativas relevantes sob o comando de Camilo Santana, Lula encerrará seu
terceiro mandato sem resolver uma equação fundamental para o desenvolvimento do
País: a deficiência crônica nos níveis de aprendizagem de matemática.
O cenário era de terra arrasada em dezembro
de 2022, fim do governo Bolsonaro, quando este jornal, com base nos resultados
do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2021, alertava para a
urgência de repensar o ensino de matemática no Brasil (ver o editorial O País reprovado em matemática,
19/12/2022). Levou quase três anos para que o atual governo lançasse o
Compromisso Nacional Toda Matemática, iniciativa anunciada em outubro passado.
Os números continuam alarmantes: só 5% dos concluintes do ensino médio nas
escolas públicas atingem níveis adequados de aprendizagem. Levantamento do
próprio MEC junto de 60 mil profissionais de educação revelou que a insegurança
docente para ensinar matemática é um dos principais gargalos, agravado pela
falta de formação adequada, escassez de materiais didáticos, sobrecarga de trabalho
e lacunas acumuladas desde a educação infantil.
A boa novidade do programa é que, pela
primeira vez, a matemática terá metas específicas de aprendizagem, que podem
ser incorporadas ao novo Plano Nacional de Educação (PNE). A má notícia é que o
atraso é grande e os resultados, inevitavelmente, levarão tempo. Há limites
evidentes para o que pode ser alcançado até o fim de 2026. Parte das medidas –
como a aprovação e implementação do novo PNE – depende do Congresso e tende a
se arrastar em meio ao calendário eleitoral. Na educação, bons resultados
exigem políticas consistentes, execução rigorosa, financiamento estável e
continuidade, algo que historicamente tem faltado ao País.
Enquanto políticas estruturais ganham forma,
a lacuna de aprendizagem persiste, penalizando milhões de estudantes que chegam
ao ensino médio sem bases sólidas em matemática e língua portuguesa – condições
mínimas para qualquer projeto de desenvolvimento. Não há como falar em
desenvolvimento sustentável enquanto jovens deixam a escola sem saber calcular
uma porcentagem ou interpretar um problema simples.
O atraso brasileiro em matemática não é mero
recurso retórico: traduz-se em impactos diretos na economia e na soberania
nacional. Países com desempenho robusto em matemática formam mais profissionais
aptos a atuar em ciência, tecnologia e engenharia, áreas centrais da inovação.
Os resultados do Pisa, em que o Brasil figura entre os piores colocados,
evidenciam o descompasso entre nossa educação básica e as competências exigidas
no século 21. Sem fluência em raciocínio lógico desde cedo, torna-se improvável
avançar em leitura crítica e compreensão textual, gerando baixa produtividade,
menor capacidade de inovação e perpetuação de desigualdades.
Antes tarde do que nunca, reza o clichê. Mas,
entre atrasos e ambições modestas, o País segue ficando para trás. Que, ao
menos, as diretrizes agora anunciadas se convertam em compromissos públicos
estáveis, monitorados e com responsabilização clara por resultados. Só assim
haverá chance de reduzir um atraso que hoje mais se assemelha a um “custo
Brasil” educacional do que a um sistema capaz de preparar seus jovens para o
futuro.
Médicos sem especialidade
Por O Estado de S. Paulo
A proporção de generalistas salta de 25% para
40%, o que alerta para a formação médica
A proporção de médicos sem uma especialidade
no Estado de São Paulo passou de 25%, em 2000, para nada menos do que 40% neste
ano. Os dados são da Demografia
Médica do Estado de São Paulo, elaborada pela Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (FMUSP), em parceria com a Associação Paulista de
Medicina (APM) e a Secretaria de Estado da Saúde. São quase 80 mil
profissionais, na maior unidade da Federação em população, sem formação em
áreas como cardiologia, ginecologia, oftalmologia, ortopedia ou pediatria.
A oferta de vagas em residência médica, que
não se confunde com uma especialização lato
sensu, não acompanhou o ritmo de crescimento do número de graduados
em Medicina. Em 2015, eram 47 faculdades no Estado , com 4.832 vagas
autorizadas , e hoje são 87, com 10.455. Enquanto isso, o número de estudantes
em residência passou de 12.791 em 2018 – data mais remota disponível no
levantamento – para 15.524 em 2025. Metade deles é de fora de São Paulo. São ao
todo 197 mil médicos no Estado, um crescimento de 67% em dez anos.
É bastante, mas não o suficiente. Não à toa,
o presidente da APM, Antonio José Gonçalves, manifestou preocupação com “a
abertura indiscriminada de cursos de Medicina e o crescimento acelerado do
número de médicos generalistas”, enquanto não há vagas em residências para
todos os formandos. Essa distorção na formação contínua, por óbvio, elevou a
presença dos generalistas no atendimento à população, tanto na rede pública
quanto na privada, o que, a priori,
não é negativo. Se egresso de uma graduação de qualidade, esse profissional
poderá prestar um bom serviço na área clínica.
Mas, como bem apontou o professor da FMUSP e
coordenador do estudo, Mário Scheffer, há lacunas que só podem ser supridas por
um especialista. Por isso, segundo ele, o Estado precisa de mais
anestesiologistas, psiquiatras e intensivistas. Mas não só: para Scheffer, seria
muito melhor ter sempre à frente da atenção primária um médico da família e
comunidade, um pediatra ou um ginecologista. Se essa situação é preocupante no
Estado de São Paulo, que concentra as melhores instituições de ensino e de
saúde do País, imagine no restante do Brasil.
Nos últimos anos, o governo federal tentou
impor uma série de regras para a abertura de cursos de Medicina dentro dos
editais do Mais Médicos, a fim de garantir o mínimo de qualidade, de modo a
ajustar demandas sociais e de mercado. Houve uma explosão de ações judiciais de
instituições pleiteando e conseguindo a abertura de vagas de graduação, sem
atender a nenhum dos requisitos dos editais, como o abstrato Plano de
Implantação de Residência Médica.
Esse fenômeno, portanto, tem causas bastante conhecidas pela classe médica, pelas autoridades sanitárias e pelos gestores federais das áreas de educação e saúde. Talvez tenha chegado a hora de o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Saúde elaborarem políticas públicas mais efetivas tanto em relação à abertura de vagas nas faculdades de Medicina quanto às vagas de residência médica. Até agora, esse trabalho de regulação falhou.
Regra de conduta fortalece o STF
Por Correio Braziliense
Esclarecer os limites éticos para os
ministros é uma maneira de preservá-los. Aumentará a credibilidade da
instituição que, a qualquer tempo, é essencial para o fortalecimento da
democracia
Quando historiadores se debruçarem sobre o
primeiro quarto de século 21 no Brasil, perceberão com clareza o papel
fundamental exercido pelo Judiciário na defesa da democracia. Em um momento
conturbado do país, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) atuaram de modo firme contra as investidas de um grupo
político, liderado pelo então presidente da República Jair Bolsonaro, disposto
a ir às últimas consequências para colocar em xeque o processo eleitoral e o
Estado Democrático de Direito.
Nos meses seguintes — e particularmente após
o fatídico 8 de Janeiro —, o STF aplicou penas rigorosas para os envolvidos na
trama golpista, a partir da investigação da Polícia Federal e da acusação
oferecida pela Procuradoria Geral da República (PGR). A diligência do
Judiciário está presente até os dias de hoje, passados três anos daquele
período conspirador na República. Ontem mesmo, o ministro do STF Alexandre de
Moraes endureceu as medidas restritivas aos condenados golpistas, após uma
tentativa de fuga frustrada do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal
(PRF) Silvinei Vasques.
Não resta dúvida, pois, que o Supremo
Tribunal Federal prestou inestimável serviço à nação ao conter a sanha
antidemocrática, além de seguir o estrito cumprimento da Constituição Federal.
Esse reconhecimento institucional foi reiterado na última sexta-feira pela
Organização dos Estados Americanos (OEA). O relatório sobre liberdade de
expressão destaca o "papel fundamental" da Corte na contenção dos
delitos antidemocráticos. Apesar de ressaltar o valor do STF na salvaguarda da
democracia, o documento da OEA propõe uma revisão sobre as condições de
liberdade de expressão no Brasil, a fim de evitar uma "concentração de
poder" por parte do STF e a perpetuação de medidas que deveriam ser
excepcionais.
Esse mesmo espírito de aprimoramento
institucional motiva o presidente da Suprema Corte brasileira, ministro Edson
Fachin, a elaborar um código de conduta para os integrantes do tribunal. A
proposta recebeu amplo apoio de presidentes de tribunais Brasil afora, além da
aprovação de juristas consagrados, como o ex-decano do STF e ministro
aposentado Celso de Mello. "Trata-se de medida de Estado, moralmente necessária
e institucionalmente urgente. Em democracias consolidadas, a confiança na
Justiça exige não só juízes honestos, mas regras claras, que impeçam qualquer
aparência de favorecimento, dependência ou proximidade indevida com interesses
privados e governamentais", escreveu em artigo recente publicado na
imprensa.
Precisamente por causa da responsabilidade de
zelar pelos princípios constitucionais de publicidade, impessoalidade e
moralidade, o Supremo Tribunal Federal precisa avançar na definição de normas que
esclareçam os limites da conduta de seus integrantes. Ao dar esse passo, a
instância máxima da Justiça conferirá mais legitimidade aos seus magistrados.
Esclarecer os limites éticos para os ministros é uma maneira de preservá-los.
Aumentará a credibilidade da instituição que, a qualquer tempo, é essencial
para o fortalecimento da democracia.
O código de conduta do STF vem para reforçar recomendações já estabelecidas para integrantes do Judiciário — como o Código de Ética da Magistratura Nacional, instituído em 2008 pelo então presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Gilmar Mendes. Transparência é a essência da democracia. Sem ela, não há República.
O teste da Transnordestina
Por O Povo (CE)
Após um comboio carregado de milho ter
percorrido 585 quilômetros entre Bela Vista (PI) e Iguatu (CE), iniciando a
fase de testes operacionais, a Transnordestina teve R$ 700 milhões liberados
para dar continuidade às obras da ferrovia. Outros R$ 5,6 bilhões em recursos
também são oriundos do fundo para desenvolvimento da região (FDNE), gerido pela
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).
A Transnordestina Logística (TLSA),
concessionária responsável pela construção e operação da ferrovia, informou ao
jornal que o início efetivo da operação será programado em conjunto com os
governos federal e dos estados do Ceará e do Piauí.
Como registrou a reportagem, na edição desta
terça-feira, a Transnordestina está com 100% de sua execução contratada,
incluindo ordens de serviço assinadas para os lotes 9 de Baturité a Aracoiaba
(46 km) e de Aracoiaba a Caucaia (51 km). Esses trechos no Ceará são
considerados de maior complexidade e fundamentais para a conclusão da fase 1 do
projeto.
A fase 1 refere-se à ligação da cidade de
Eliseu Martins (PI) ao Porto do Pecém (CE), com extensão aproximada de 1.200
km. Concluir esse traçado é fundamental por ser considerado o de maior retorno,
tanto em termos de logística, quanto ao aspecto econômico.
De fato, já é tempo de concluir a
Transnordestina, uma obra que começou a ser pensada no século passado, como um
projeto de integração do Nordeste. No entanto, foi iniciada somente em 2006, no
primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevista para ser
entregue em 2010.
A previsão original de entrega da obra era no
ano de 2010. No entanto, o prazo foi revisto várias vezes, devido a
interrupções, com a obra ficando parada por longos períodos devido à falta de
recursos e até por disputas políticas para reivindicar protagonismo na obra.
A previsão é que a ferrovia transporte
volumes de mercadorias estimados em dezenas de milhões de toneladas por ano, a
um custo mais baixo do que o realizado por rodovias. Portanto, o preço dos
produtos tenderá a cair, aumentando a competitividade internacional dos
produtos brasileiros.
A nova promessa é que a inauguração
acontecerá no fim do próximo ano. O que se espera é que não haja novos
adiamentos; que a Transnordestina esteja em pleno funcionamento em 2026,
incorporando-se à região como um importante instrumento para o desenvolvimento
da região, contribuindo também para alavancar a economia do País.

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