domingo, 28 de dezembro de 2025

Uma blitz para Silvinei. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Bolsonarista levou 24 anos de prisão por tentar impedir pobres de votar em 2022

Silvinei Vasques aproveitou a bruma natalina para dar no pé. Condenado a 24 anos e meio de prisão, o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal dispensou o peru e as rabanadas. Deu uma banana para a Justiça, quebrou a tornozeleira eletrônica e fugiu do país. Foi interceptado no Paraguai, onde tentava embarcar num avião para El Salvador.

Bolsonarista de carteirinha, o fujão foi sentenciado por outro episódio vergonhoso: a montagem de bloqueios policiais para impedir eleitores pobres de votar em 2022.

As investigações comprovaram a trama em detalhes. A poucos dias da votação, Silvinei reuniu subordinados e informou que era chegada a hora de a PRF “tomar lado” na corrida presidencial. Ele já havia dado o mau exemplo ao participar de motociatas e usar a farda para fazer campanha pelo capitão.

Capturada pelo bolsonarismo, a polícia planejou uma operação para tumultuar as rodovias e inflar a abstenção no segundo turno. O plano era dificultar o acesso às urnas em locais onde Lula tendia a receber mais votos, especialmente no Nordeste. Para isso, foi usado um relatório de inteligência com base em dados da Justiça Eleitoral.

Na véspera da votação, o Tribunal Superior Eleitoral proibiu as barreiras. Mesmo assim, a PRF foi mobilizada para segurar ônibus e vans, a pretexto de fiscalizar pneus carecas e faróis queimados. Até um senador foi parado numa blitz ilegal. A operação só foi suspensa depois que o ministro Alexandre de Moraes ameaçou dar voz de prisão a Silvinei.

O ex-delegado não se notabilizou pela bravura. Nos últimos dias do governo Bolsonaro, antecipou a aposentadoria para não responder a sindicâncias no novo governo. Calçou os chinelos aos 47 anos, com salário integral. Preso em agosto de 2023, reclamou da comida da Papuda e se disse “deprimido”. Mais tarde, tentaria se apresentar como vítima de uma “tempestade midiática”.

O ex-diretor da PRF nunca admitiu seus crimes. Embora jamais tenha se empenhado para escondê-los. Ao julgá-lo, o ministro Flávio Dino identificou a prática do “exibicionismo do malfeito”. “Tudo (foi feito) à luz do dia. Como se houvesse orgulho da ilicitude”, observou.

Correr da aplicação da lei é outro traço comum aos extremistas nativos. Eduardo Bolsonaro puxou o bloco dos fujões. Foi seguido pelos colegas Carla Zambelli e Alexandre Ramagem. Agora o trio ganhou a companhia de Silvinei. Mais desastrado, o ex-chefe da PRF ainda imitou o ex-presidente ao investir contra a tornozeleira. Terminou preso com passaporte falso no aeroporto de Assunção.

A investigação deve esclarecer como o golpista saiu do Brasil e se ele teve cúmplices na empreitada. Também seria interessante saber por que ele escolheu El Salvador como destino. O país de Nayib Bukele virou fetiche da ultradireita. Tem atraído parlamentares e pré-candidatos ansiosos para gravar vídeos de propaganda em frente a um megapresídio. No caso de Silvinei, o turismo carcerário terá que ficar para depois. O bolsonarista da PRF foi parado na blitz.

 

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