Valor Econômico
Estimativas de economistas para o cenário do ano foram um pouco mais próximas da realidade
Nos três primeiros anos do governo Lula 3, o
Boletim Focus foi um “profeta do pessimismo”. Focus é o relatório publicado
semanalmente pelo Banco Central com base em pesquisas sobre as expectativas de
instituições financeiras para os principais indicadores macroeconômicos do
país.
A pesquisa Focus previa, em dezembro de 2022, um crescimento do PIB de 0,79% em 2023, mas o índice na realidade foi de 3,2%, três vezes maior. Em dezembro de 2023, a previsão para 2024 era de 1,5%, e a expansão atingiu 3,4%, mais que o dobro do previsto. Também houve viés pessimista nos casos de inflação, dólar, superávit comercial, investimentos diretos etc.
É óbvio que os agentes do mercado financeiro
não apoiam o governo Lula e preferem ter um presidente menos esquerdista e mais
neoliberal. Assim, parece natural que haja menos previsões otimistas - é o tal
do “wishful thinking”. Neste ano, porém, as estimativas, embora na maioria
pessimistas, foram um pouco mais próximas da realidade (veja o gráfico preparado pelo economista
Robinson Moraes, do Valor Data).
Os dados de 2025 ainda não estão fechados,
até porque o ano não terminou. Mas, até o terceiro trimestre, o crescimento do
PIB em 12 meses estava em 2,7%. A economia claramente desaquece e a expansão
anual deve ficar entre 2,2% e 2,4%, mais próxima da previsão feita pela
pesquisa Focus no fim do ano passado, de 2,02%. Parece uma diferença pouco
expressiva, mas, considerando-se um PIB de uns R$ 12 trilhões, o desvio de 0,4
ponto percentual significa quase R$ 50 bilhões.
A inflação oficial (IPCA) deve ficar um pouco
abaixo da prevista, provavelmente dentro do teto da meta, de 4,5%. O desvio
mais grave entre as previsões se deu no caso do IGP-M, índice importante porque
corrige contratos, inclusive aluguéis. O ano pode fechar com uma pequena
deflação nesse indicador, mas a estimativa Focus era de alta de 4,87%, erro
talvez proveniente da visão pessimista do mercado para a cotação do dólar,
estimada em R$ 6 neste fim de ano, o que não deve se confirmar.
O déficit em conta corrente, de US$ 77,7
bilhões, considerados os 12 meses até novembro, está 55% acima do previsto. O
desvio na projeção se justifica porque ninguém poderia prever o tarifaço
cavalar de Donald Trump.
Considerados 25 anos de pesquisa, a Focus se
mostra predominantemente otimista. Nos últimos três anos, isso mudou: nos nove
principais itens pesquisados a cada ano, houve 16 expectativas que se mostraram
pessimistas, três realistas e oito otimistas.
O que esperar de 2026? O mercado e os
próprios técnicos do governo preveem um desaquecimento gradual da economia, um
pouso suave no jargão do economês, mas um PIB crescendo ainda 1,8%. O fato é
que a economia tem resistido à política de juros altos - quase o ano todo em
torno de 10% acima da inflação.
Espera-se que o Banco Central comece a baixar
a taxa básica, hoje em 15% ao ano, dado que a inflação perde força. Fora dos
círculos ortodoxos, há a convicção de que será impossível atingir o centro da
meta de 3% ao ano, estabelecida no início do terceiro governo Lula. Os
economistas Luiz Fernando de Paula e Eduardo Mantoan, em artigo no Valor, sustentaram que essa
meta é incompatível com a economia brasileira face à existência de mecanismos
formais e informais de indexação e de ciclos de choques cambiais nos preços.
Dados do passado recente confirmam essa
afirmação. Desde o período FHC1, em 1995, a média da inflação anual dos quatro
anos de governo (três anos no caso de Lula 3) nunca ficou abaixo de 4,6%.
Entende-se que a meta será inatingível enquanto permanecerem as indexações de
preços, salários, contratos e títulos da dívida pública. Para mudá-la, todavia,
será preciso ter coragem. Em meados do ano passado, quando o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, disse que a meta é “exigentíssima e inimaginável”, já
foi um fuzuê no mercado.
Ambiciosa demais para as condições
estruturais do país, a meta tem grande impacto negativo na economia por causa
do custo dos juros necessários para tentar alcançá-la. É fato que a economia
foi resiliente em 2025, apesar dos juros astronômicos, mas há dúvidas sobre
2026. Cabe lembrar uma recente declaração do professor Alan Taylor, do Comitê
de Política Monetária do Banco da Inglaterra, alertando para o fato de que as
expansões costumam ser lentas e cumulativas: sobem de escada. As recessões,
porém, se instalam rapidamente: descem de elevador.
Enel, uma recordação
Por falar em profecias, vale mudar de assunto
e citar uma declaração dada ao Valor,
em 21 de maio de 2018, por Mario Ruiz-Tagle, então presidente da Neoenergia
(grupo espanhol Iberdrola). Era a semana decisiva na disputa entre a Enel e a
Neoenergia pelo controle da AES Eletropaulo, vencida pela estatal italiana.
Ruiz-Tagle disse o seguinte: “Não é normal um
país que defendeu por 200 anos a energia como um setor estratégico, que tem uma
estatal do tamanho que tem [Eletrobras] e está discutindo privatizá-la por
ineficiência, abrir as portas para que venha qualquer Estado estrangeiro
comprar suas companhias. Não é normal. Veja como está ficando o mapa do setor
no Brasil, com a Enel e a chinesa State Grid. (...) Estados não têm o mesmo
racional econômico que companhias privadas e quem paga por isso é sempre o
consumidor, o cidadão".
Feliz Natal e um bom ano de 2026. Sem
ciclones tropicais.

Nenhum comentário:
Postar um comentário