SIMPLIFICAR É IMPRECISO
Dora Kramer
Vida pregressa é todo o conjunto de uma obra, não se restringe a um passivo jurídico ou eleitoral, ponderou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, ao justificar seu voto (vencido) em favor do veto ao registro dos candidatos chamados genericamente de “fichas-sujas”.
Partindo desse ponto, cabe à sociedade compreender o mundo em volta e não perder tempo purgando frustrações com a decisão do Supremo Tribunal Federal de liberar políticos sem condenações transitadas em julgado para concorrer a cargos eletivos ou alimentar suspeições sobre o propósito dos magistrados.
É a atitude mais fácil, mas não é a mais correta, pois a simplificação é a melhor conselheira da imprecisão.
Nem os nove que votaram contra a ação da Associação dos Magistrados Brasileiros são favoráveis à dissolução dos costumes, nem os dois (Ayres Britto e Joaquim Barbosa) que defenderam a tese da AMB desconhecem os ditames da lei e do princípio da presunção da inocência.
O cerne do problema está no conceito de Ayres Britto sobre a vida pregressa de quem pretende representar institucionalmente a população e, nessa condição, encarnar também o Estado.
O STF fez o que pôde diante da lei em vigor, mas o Judiciário como um todo, a Justiça Eleitoral em particular e entidades que compreenderam o espírito da coisa fizeram muito pela depuração da qualidade da representação política ao pôr o tema da conduta dos candidatos na agenda nacional.
Um dos primeiros, senão o primeiro, a levantar a questão e a glosar registros, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio, desembargador Roberto Wider, logo após a votação no Supremo deu por encerrado o assunto no âmbito do Judiciário. Não estava, com isso, incentivando o conformismo.
Ao contrário, passou o bastão ao eleitorado. Assim como o Supremo. Foi ao limite. Ultrapassá-lo seria pretender se substituir ao discernimento das pessoas.
Todo mundo tem a capacidade de decidir pelo melhor caminho, desde que tenha todas as informações sobre o traçado da estrada.
A repercussão do assunto não teve o condão - como afirmaram de maneira deselegante e pouco sagaz os ministros Eros Grau e Cezar Peluso - de patrocinar a troca das garantias democráticas pelo Estado do espetáculo com a imprensa no papel de porta-voz dos novos mandamentos.
Teve a mais positiva das serventias: mostrou ao eleitor que há uma legislação que necessita de urgente modificação (missão do Congresso) e que, a despeito da preservação dos direitos dos réus por parte do Judiciário, há também o direito do cidadão de ser bem representado.
Na realidade, mais que um direito, um dever de sair do papel passivo de vítima da degradação da política e assumir uma posição de parceiro ativo do processo democrático.
Se de um lado há um pretendente a eleito que carrega consigo deformações de biografia, de outro há um eleitor que, devidamente informado sobre os questionamentos que pesam contra esse ou aquele candidato, tem a chance de escolher alguém de ficha limpa.
O exercício da subjetividade é inerente à escolha. Não fere direitos nem garantias de ninguém.
Por isso, convém aos de folhas corridas mais fornidas não comemorarem com antecedência, como tampouco é conveniente a opinião pública se voltar contra o Supremo, revelando-se, assim, incapaz de impor balizas sem tutela, só pela aplicação do princípio de probidade.
E este todo mundo reconhece, sabe o que é, sente o cheiro de longe, carece de explicação, só necessita de informação.
Ou a maioria dos brasileiros - se quiser sair do conforto da vitimização, claro - não é capaz de distinguir entre o político alvo de processos injustos, quase sempre produzidos por adversários, e aquele realmente suspeito?
É capaz sim. O que não existia até então era atenção sobre esse ponto. Vigorava a norma matreira segundo a qual o que o parlamentar ou governante fez no passado não guarda relação com suas atividades, ou postulações, do presente.
Essa a grande contribuição do Judiciário, com especial destaque para a opção do ministro Ayres Britto de tomar a iniciativa de defender o legalmente indefensável - sabendo-se desde o início vencido -, mas cumprindo a tarefa didática de chamar o eleitorado às suas obrigações.
Greta Garbo
O governador de Minas, Aécio Neves, que até outro dia deixava prosperar as versões de que poderia deixar o PSDB, fez ontem um movimento de afirmação partidária ao desembarcar em São Paulo para reafirmar apoio a Geraldo Alckmin.
Não há efeito prático no gesto. Nem a posição do governador de Minas mexe com o voto do paulistano nem a presença de Aécio fará o governador José Serra sair da toca tão cedo. Se sair.
Opor-se à gestão de Gilberto Kassab equivaleria a se opor à própria administração herdada pelo atual prefeito. Ademais, a ausência está fazendo de Serra o centro das atenções.
Dora Kramer
Vida pregressa é todo o conjunto de uma obra, não se restringe a um passivo jurídico ou eleitoral, ponderou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, ao justificar seu voto (vencido) em favor do veto ao registro dos candidatos chamados genericamente de “fichas-sujas”.
Partindo desse ponto, cabe à sociedade compreender o mundo em volta e não perder tempo purgando frustrações com a decisão do Supremo Tribunal Federal de liberar políticos sem condenações transitadas em julgado para concorrer a cargos eletivos ou alimentar suspeições sobre o propósito dos magistrados.
É a atitude mais fácil, mas não é a mais correta, pois a simplificação é a melhor conselheira da imprecisão.
Nem os nove que votaram contra a ação da Associação dos Magistrados Brasileiros são favoráveis à dissolução dos costumes, nem os dois (Ayres Britto e Joaquim Barbosa) que defenderam a tese da AMB desconhecem os ditames da lei e do princípio da presunção da inocência.
O cerne do problema está no conceito de Ayres Britto sobre a vida pregressa de quem pretende representar institucionalmente a população e, nessa condição, encarnar também o Estado.
O STF fez o que pôde diante da lei em vigor, mas o Judiciário como um todo, a Justiça Eleitoral em particular e entidades que compreenderam o espírito da coisa fizeram muito pela depuração da qualidade da representação política ao pôr o tema da conduta dos candidatos na agenda nacional.
Um dos primeiros, senão o primeiro, a levantar a questão e a glosar registros, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio, desembargador Roberto Wider, logo após a votação no Supremo deu por encerrado o assunto no âmbito do Judiciário. Não estava, com isso, incentivando o conformismo.
Ao contrário, passou o bastão ao eleitorado. Assim como o Supremo. Foi ao limite. Ultrapassá-lo seria pretender se substituir ao discernimento das pessoas.
Todo mundo tem a capacidade de decidir pelo melhor caminho, desde que tenha todas as informações sobre o traçado da estrada.
A repercussão do assunto não teve o condão - como afirmaram de maneira deselegante e pouco sagaz os ministros Eros Grau e Cezar Peluso - de patrocinar a troca das garantias democráticas pelo Estado do espetáculo com a imprensa no papel de porta-voz dos novos mandamentos.
Teve a mais positiva das serventias: mostrou ao eleitor que há uma legislação que necessita de urgente modificação (missão do Congresso) e que, a despeito da preservação dos direitos dos réus por parte do Judiciário, há também o direito do cidadão de ser bem representado.
Na realidade, mais que um direito, um dever de sair do papel passivo de vítima da degradação da política e assumir uma posição de parceiro ativo do processo democrático.
Se de um lado há um pretendente a eleito que carrega consigo deformações de biografia, de outro há um eleitor que, devidamente informado sobre os questionamentos que pesam contra esse ou aquele candidato, tem a chance de escolher alguém de ficha limpa.
O exercício da subjetividade é inerente à escolha. Não fere direitos nem garantias de ninguém.
Por isso, convém aos de folhas corridas mais fornidas não comemorarem com antecedência, como tampouco é conveniente a opinião pública se voltar contra o Supremo, revelando-se, assim, incapaz de impor balizas sem tutela, só pela aplicação do princípio de probidade.
E este todo mundo reconhece, sabe o que é, sente o cheiro de longe, carece de explicação, só necessita de informação.
Ou a maioria dos brasileiros - se quiser sair do conforto da vitimização, claro - não é capaz de distinguir entre o político alvo de processos injustos, quase sempre produzidos por adversários, e aquele realmente suspeito?
É capaz sim. O que não existia até então era atenção sobre esse ponto. Vigorava a norma matreira segundo a qual o que o parlamentar ou governante fez no passado não guarda relação com suas atividades, ou postulações, do presente.
Essa a grande contribuição do Judiciário, com especial destaque para a opção do ministro Ayres Britto de tomar a iniciativa de defender o legalmente indefensável - sabendo-se desde o início vencido -, mas cumprindo a tarefa didática de chamar o eleitorado às suas obrigações.
Greta Garbo
O governador de Minas, Aécio Neves, que até outro dia deixava prosperar as versões de que poderia deixar o PSDB, fez ontem um movimento de afirmação partidária ao desembarcar em São Paulo para reafirmar apoio a Geraldo Alckmin.
Não há efeito prático no gesto. Nem a posição do governador de Minas mexe com o voto do paulistano nem a presença de Aécio fará o governador José Serra sair da toca tão cedo. Se sair.
Opor-se à gestão de Gilberto Kassab equivaleria a se opor à própria administração herdada pelo atual prefeito. Ademais, a ausência está fazendo de Serra o centro das atenções.
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