Com argumentação veemente, que reproduzirá a partidos aliados e adversários
que forem ouvi-lo sobre as operações da Polícia Federal, o aumento da
corrupção, o recrudescimento da violência, obstáculos, todos sob o seu comando,
que dificultarão, se não removidos, o conforto da campanha de reeleição da
presidente Dilma Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo,
parte para a ofensiva.
Não recebeu críticas da presidente por não tê-la avisado da Operação Porto
Seguro, que colheu em malhas da corrupção a chefe de gabinete da Presidência em
São Paulo e o advogado-geral-adjunto da União, a primeira muito próxima do
ex-presidente Lula, o segundo braço direito do braço direito de Dilma.
Cardozo não viu problema em não saber e afirma que o próprio diretor-geral
da PF não sabe de operação sob sigilo a não ser na hora de ser desencadeada ou
um pouco antes, quando já tem mandado de prisão expedido e ele faz uma
verificação para ver se não há nenhum abuso.
A intervenção em ações da PF é crime, avisa Cardozo
"Qualquer interferência mesmo da direção geral da PF numa operação é
crime", afirma. "O ministro não pode e não deve ter ciência de uma
ação sob sigilo que só o delegado, promotor ou juiz pode saber". Dilma e
todo o governo sabem disso. "Nunca fui cobrado por isso".
Cardozo lembra que quando houve a Operação Voucher foi criticado por ter
perdido o controle da polícia. "Nunca se perde o que não se tem nem se
deve ter. Tenho o controle hierárquico. Se houver abuso, tenho que tomar
medidas. Mas uma operação que se processa dentro da lei, com ordem judicial,
não tenho como ter controle nem devo ter." O ministro atribui a uma
cultura antiga a expectativa de que o investigado seja avisado para que fuja da
polícia.
Quando lembrado que o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos era
considerado praticamente um advogado do ex-presidente Lula e dos ministros mais
importantes do governo, com eles buscando saídas para várias situações de
impasse em denúncias e suspeitas de irregularidade, diz que isso não existe no
governo. "O que eu tenho que fazer? Que se cumpra a lei. Vou chegar e
dizer para não cumprir o mandado porque é do meu partido? Tenho que avisar para
ele fugir? Não tem cabimento".
O ministro discute também as avaliações nacionais e internacionais sobre o
fato de a corrupção, no Brasil, ter se tornado endêmica, e de as autoridades
máximas não perceberem o que ocorre a seu lado, muitas vezes na mesma sala que
habitam. "Uma coisa é você poder perceber, outra coisa é ser conivente.
Por que se descobriu o caso? Porque um servidor público fez a delação premiada
em um caso que estava rolando no bastidor do TCU, a partir daí se fez escuta
telefônica e quebra do sigilo telemático. Foi por isso que se descobriu.
Imagina se uma pessoa que estivesse convivendo com isso tinha condições de
saber e descobrir o que acontece no subterrâneo de uma administração a olho
nu?"
"A corrupção é a histórica, atemporal e tem em qualquer país do mundo.
Nenhum está imune", acredita Cardozo. A estrutura administrativa pode
facilitar ou criar empecilhos e, claro, no Brasil ela facilita. "O Brasil
tem uma estrutura administrativa permeável à corrupção, e culturalmente temos
uma passividade que está mudando nos últimos tempos com relação a isso". A
seu ver, o que é importante é ter mecanismos de Estado que a combatam. A
Polícia Federal é um deles.
Quanto aos comentários, especialmente oriundos de partidos da oposição, de
que nos governos petistas os órgãos reguladores ficaram mais permeáveis à
manipulação e às irregularidades, o ministro os rebate afirmando que não se
deve politizar a situação. "Como se no passado as agências reguladoras não
tivessem tido problemas, pessoas que se comportavam fora da lei. Não vejo
problema nas avaliações da oposição".
O que lhe parece diferente é que "estamos sendo implacáveis".
Ninguém tentou obstaculizar a PF, afirma, e a presidente tomou atitude
imediata. "É essa a diferença". E aqui vai a crítica ao adversário de
sempre, o PSDB: "Se tivéssemos um ministro que tentasse obstaculizar a
ação da PF, um Ministério Público dirigido por um engavetador-geral da
República, ou a inação colocada no Palácio, poderia dizer que o governo era
conivente".
O partido de Cardozo, o PT, ficou especialmente abalado pelo atual escândalo
e ainda é tensa a situação da direção, pelas ligações dos envolvidos com Lula e
com o advogado-geral da União, muito próximo à Dilma, cotado para assumir a
chefia da Casa Civil ou uma vaga no STF.
"Não estou vendo o que ocorre no PT. Foi um caso em que houve grande
divulgação, tinha a chefe de gabinete da Presidência em São Paulo, um advogado
da União, sinceramente é uma operação como tantas outras se fez e se
fará".
O ministro resume: "Quando a ação da Polícia Federal se dá em relação a
membros do governo, diz-se que o ministro da Justiça perdeu o controle. Quando
se dá em relação à oposição, o governo está instrumentalizando politicamente a
Polícia Federal. O que as pessoas não percebem é que a situação é
republicana".
O ministro também discorda de que seja responsável pela outra pedra no
caminho da campanha da reeleição, o recrudescimento da violência. Afirma que a
violência tem muitas causas e que há um papel do governo federal, estadual,
municipal, Judiciário, Legislativo, e da sociedade também.
Não se deve esperar que o governo federal, sozinho, seja o responsável e vá
resolver, ou que isto será uma cobrança à presidente quando for pedir um novo
mandato. "Vamos dizer por que as coisas acontecem. Por exemplo,
recentemente se discutiu se o aumento da violência em São Paulo se devia a um
problema de falta de controle nas fronteiras, e não é nada disso".
Cardozo admite que há Estados one a violência aumentou e outros em que se
reduziu. "Nosso projeto em Alagoas reduziu em 60% a violência em 120
dias". O ministro defende que se procure entender as causas da violência
em cada localidade para discuti-las. "É incorreto associar, numa análise
política do desempenho de um governo, toda a responsabilidade pelo aumento da
violência à administração federal. O governo federal está fazendo a política
correta para enfrentar as causas é isso que vamos discutir numa eventual
campanha eleitoral, que está muito longe ainda".
Fonte: Valor Econômico
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