• Governo estuda alternativa para registrar déficit menor, de R$ 50 bi
Relator do Orçamento prevê que nova CPMF não será aprovada pelo Congresso e propõe corte de R$ 10 bi no Bolsa Família para 2016
O governo vai propor ao Congresso, até o fim da semana, uma revisão na meta fiscal de 2015 e poderá prever déficit de R$ 76 bilhões nas contas públicas este ano. Técnicos estimam uma arrecadação menor, devido sobretudo à frustração com receitas extras. Se regularizar todas as pedaladas pendentes, de cerca de R$ 35 bilhões, o déficit chegará aos R$ 76 bilhões. Mas, para evitar rombo tão grande, o governo estuda quitar as pedaladas de forma gradual. Com isso, o déficit seria de R$ 50 bilhões. O relator do Orçamento de 2016, Ricardo Barros ( PP- PR), informou ontem que pretende cortar R$ 10 bilhões ( 35%) do Bolsa Família. Ontem, o Congresso começou a analisar as contas de 2014, rejeitadas pelo TCU.
Um baque no Bolsa Família
Sem crer na CPMF, relator do Orçamento propõe tirar R$ 10 bi do maior programa social do governo
Cristiane Jungblut - O Globo
- BRASÍLIA- No dia em que o Bolsa Família completou 12 anos, o relator do Orçamento da União de 2016, deputado Ricardo Barros ( PP- PR), anunciou ontem ao governo que pretende cortar da proposta orçamentária R$ 10 bilhões dos R$ 28,8 bi previstos para o programa no próximo ano. Se confirmada, a decisão levaria a uma redução de 35% na verba do principal programa social do governo. O deputado afirmou ao GLOBO que o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, ficou de conversar com a presidente Dilma Rousseff e o Ministério do Desenvolvimento Social ( MDS) sobre o assunto.
A reação, no entanto, não demorou. No fim da tarde, o ministério soltou nota dizendo- se contra a mudança e afirmando que “a redução de custos do programa representaria devolver milhares de famílias à condição de extremamente pobres”. Segundo o MDS, o valor médio de R$ 167 mensais pago às famílias representa menos de um quarto do salário- mínimo vigente no país e serve de complementação à renda obtida no mercado formal ou informal pelos beneficiários do Bolsa Família.
O desafio de Ricardo Barros é reverter um rombo no Orçamento de 2016, que foi enviado ao Congresso com déficit de R$ 30,5 bilhões. O problema é que o governo anunciou medidas para reverter esse déficit, como a recriação da CPMF, mas essas propostas estão todas paradas na Câmara. Diante da falta de novas receitas, o relator terá que fazer uma verdadeira ginástica orçamentária para fechar as contas entre receitas e despesas no Orçamento de 2016. O anúncio de Barros durante a reunião no Palácio do Planalto surpreendeu Berzoini e líderes da base aliada.
— Pretendo cortar R$ 10 bilhões do Bolsa Família. Há uma rotatividade hoje no programa. Minha proposta é manter quem está no programa e não fazer renovações. Quem está no programa será mantido e quem sai, a vaga não será reposta. Hoje, o próprio governo diz que 72% dos beneficiários trabalham — disse Ricardo Barros.
Verba do PAC também pode ser reduzida
O Palácio do Planalto não gostou da iniciativa do relator do Orçamento, mas não quer polemizar porque tem questões “mais graves e urgentes” para resolver agora, caso do rombo nas contas previsto para este ano.
Além disso, o governo tenta manter a política de boa vizinhança com os parlamentares pela necessidade de aprovar a recriação da CPMF.
— Tudo é negociável. Vamos esperar — afirmou um interlocutor do governo.
O corte desagrada, segundo um auxiliar presidencial, porque os programas sociais são vistos no governo como sua principal vitrine e como contraponto ao discurso do ajuste fiscal. Com o eventual corte, o diálogo com a base social da presidente Dilma Rousseff pode ser ainda mais afetado, não sobrando ao governo nenhuma margem de aprovação. Pesa também na contrariedade do governo o momento ruim para os cortes no Bolsa Família, já que há desemprego e recessão.
O relator ainda quer reduzir a verba do Programa de Aceleração do Crescimento ( PAC) como forma de bancar R$ 4,5 bilhões de emendas de bancada impositivas — que são, em geral, destinadas a obras que os parlamentares de um mesmo estado consideram fundamental para suas regiões. O Orçamento já previa desde 2014 a execução obrigatória ( impositiva) das emendas individuais apresentadas pelos 594 parlamentares ( 513 deputados e 81 senadores) — e que geralmente cada parlamentar destina a seus redutos eleitorais. A verba destinada ao PAC ( incluindo o programa Minha Casa Minha Vida) no próximo ano já havia sido reduzida em R$ 8,6 bilhões em setembro. Ricardo Barros ainda está fazendo o mapeamento do que mais pode ser enxugado na proposta para fechar as contas.
— Os R$ 32 bilhões da CPMF não virão, porque não será aprovada, e nem os R$ 6 bilhões do Sistema S, porque até agora não veio para o Congresso o projeto de lei sobre isso. Vou ter que enxugar ( nas despesas) o que eu puder — disse Barros.
A proposta de cortar o Bolsa Família provocou reação entre os governistas.
— Sou contra, acho um erro, especialmente em momento de desemprego — disse a líder do PCdoB na Câmara, Jandira Feghali ( RJ), que participou da reunião com Berzoini.
O líder do PT no Senado, Humberto Costa ( PE), também criticou a proposta.
— O relator pode apresentar o seu parecer. Mas é muito difícil o Congresso aprovar uma medida como essa — disse Humberto Costa.
O relator do Orçamento da União de 2015, senador Romero Jucá ( PMDB- RR), no entanto, disse que o governo terá que fazer cortes em ações importantes, porque não há recursos.
— O governo vai ter que cortar em muitas despesas. É uma realidade inexorável — disse Jucá.
O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves ( MG), disse que o corte do Bolsa Família aponta a falência da gestão petista.
— Confirma o que venho dizendo que, de quem paga a parte mais salgada da irresponsabilidade deste governo, são os que, no discurso, o governo diz defender. É a população mais pobre, mais dependente, que a inflação tira a comida da mesa, que faz parte dos programas sociais que já vinham cortando, e agora vão inviabilizar o Bolsa Família. Isso comprova, de maneira absoluta, a falência do modelo de governo petista — disse Aécio.
Para evitar cortes nos programas sociais, o governo ainda está focado na aprovação da CPMF. Para tentar convencer os parlamentares, o Planalto vêm reforçando para a base aliada o discurso de que há abertura para discutir o modelo, que originalmente prevê uma alíquota de 0,20% cuja arrecadação ficaria toda nas mãos da União. Uma das possibilidades seria o governo bancar um aumento da alíquota de 0,20% para 0,38%, sendo que os 0,18% adicionais iriam para estados e municípios.
— O recado para as bases é que o governo está aberto a tudo. Queremos aprovar e estamos abertos a discutir qualquer modelo — afirmou um assessor da presidente Dilma.
Apesar do empenho do governo no diálogo, os líderes de partidos da base aliada engrossaram o movimento “anti-Levy”. Embalados pelas declarações do presidente do PT, Rui Falcão, contra a política econômica encampada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, representantes das diversas legendas da base externaram suas insatisfações com o ministro em outra reunião realizada no Planalto com o ministro Ricardo Berzoini.
Segundo relatos, o deputado Orlando Silva ( PCdoB-SP), integrante de um dos partidos mais fiéis ao governo Dilma Rousseff no Congresso, afirmou que, se o presidente do PT podia defender a saída de Levy do cargo caso não mudasse a política econômica, ficava difícil segurar sua bancada, também contrária às fórmulas adotadas por Levy para recuperar a economia.
O líder do PSD, Rogério Rosso ( DF), foi um dos mais ácidos nas críticas a Levy. Em tom irônico, disse que, se for preciso, os deputados irão conversar com Lázaro Brandão, presidente do conselho de administração do Bradesco, para que ele influencie Levy a mudar sua política econômica para um modelo mais desenvolvimentista.
Após o embate público entre Falcão e a presidente Dilma em relação a Levy, o PT se dividiu sobre o discurso em relação ao ministro. O diretório nacional do partido se reunirá semana que vem em Brasília, possivelmente na presença do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com as lideranças da corrente majoritária, a Construindo um Novo Brasil ( CNB), que defendem que o foco do encontro seja a defesa da taxação dos mais ricos para dividir o ônus da crise e não os ataques ao ministro. ( Colaboraram Fernanda Krakovics, Júnia Gama, Maria Lima, Martha Beck e Simone Iglesias)
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