• Em telefonema para a Finlândia, ministro da Casa Civil descreveu para a presidente um clima político tenso em Brasília
Vera Rosa - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, telefonou nesta terça-feira, 21, bem cedo para a presidente Dilma Rousseff, na Finlândia, e pediu a ela que não provocasse mais o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao responder a perguntas dos jornalistas que acompanham sua viagem internacional. Na conversa, Wagner alegou que o ambiente político em Brasília estava muito tenso e disse que qualquer declaração poderia ser mal interpretada, aumentando ainda mais a temperatura da crise política.
Dilma avisou, porém, que não poderia deixar sem resposta a última declaração de Cunha, rotulando o governo de corrupto. Wagner assentiu, mas pediu cuidado para que ela não caísse em “cascas de banana”. Na segunda-feira, o vice Michel Temer jantou com Cunha, no Palácio do Jaburu, e perguntou sobre a disposição dele em aceitar o pedido de impeachment apresentado pelos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior. O presidente da Câmara repetiu que não via fundamentos jurídicos para o afastamento de Dilma.
No Palácio do Planalto, porém, Cunha é chamado de “fera ferida” e ministros avaliam o seu comportamento como “imprevisível”. Acusado pelo lobista Fernando Baiano de desviar recursos da Petrobrás, o deputado não gostou de ver Dilma lamentar, no domingo, que “um brasileiro” tivesse o nome envolvido no escândalo das contas secretas na Suíça.
Cunha reclamou com Temer e até com Wagner do tom adotado por Dilma e, como resposta, acusou o governo de protagonizar “o maior escândalo de corrupção do mundo”.
A partir daí, seguiu-se um pingue-pongue de estocadas públicas. Mesmo dizendo ontem que não não comentaria “as palavras” do presidente da Câmara, Dilma fez questão de afirmar que seu governo não está envolvido em corrupção. “Não é o meu governo que está sendo acusado”, reagiu ela. “As pessoas envolvidas estão presas, e não é a empresa Petrobrás que está envolvida no escândalo. São pessoas que praticaram corrupção.” Irônico, Cunha rebateu: “Ué, eu não sabia que a Petrobrás não era do governo.”
A assessoria da Casa Civil negou o teor da conversa de Wagner com Dilma, confirmada por outros dois interlocutores do ministro. Além disso , Wagner tinha outro encontro marcado com Cunha, na tentativa de jogar água na fervura da crise.
Na prática, o Planalto não sabe mais como agir com o presidente da Câmara, que mantém pairando sobre a cabeça de Dilma a espada do impeachment. A avaliação interna é que, se ele aceitar hoje o requerimento dos juristas, com o pedido de afastamento, a Advocacia Geral da União (AGU) recorrerá, mais uma vez, ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O governo também está preocupado porque, enquanto durar a crise, não consegue votar as medidas necessárias para o ajuste fiscal no Congresso. O cenário ideal para o Planalto seria a renúncia de Cunha, mas ele repete como mantra que não tomará essa atitude.
Um aliado sugeriu a Cunha que adotasse a saída “a la Renan” para se defender. Ele recusou. Em 2007, acusado de usar recursos de uma empreiteira para pagar despesas pessoais, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tirou uma licença de 45 dias. Mesmo assim, a crise não arrefeceu e ele foi obrigado a renunciar ao comando do Senado, para não perder o mandato. “Renan era senador; eu sou deputado. E meu nome é Eduardo”, disse Cunha ao Estado.
Nos bastidores, o comentário é que a estratégia de Cunha é ganhar tempo porque, entre outras coisas, ele espera que Renan, outro alvo da Operação Lava Jato, também seja denunciado pela Procuradoria Geral da República ao Supremo. Resta saber qual será a posição do PT nesse imbroglio, uma vez que Renan é aliado do Planalto e Dilma pode ficar nas mãos dele para barrar o impeachment no Senado, caso o processo comece a tramitar na Câmara.
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