"Você não combate violência com amor, combate com porrada, pô.” “Se eu chegar lá um dia (na Presidência da República), vou botar militares em metade dos Ministérios, gente igual a mim.” “Não é a imprensa nem o Supremo que vão falar o que é limite para mim. Vão catar coquinho!” “Por isso que essa porra desse país está nessa merda aí.” Essas boçalidades marcam a entrevista dada à Folha de S.Paulo pelo deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) que, além da ostensiva e gratuita falta de respeito à profissional que o entrevistava, não teve o menor escrúpulo de sugerir que falava em nome dos militares, numa irresponsável tentativa de comprometer as Forças Armadas com a insensatez e a truculência de seu populismo rasteiro.
Jair Bolsonaro conseguiu revelar na entrevista as nuances mais sórdidas de um comportamento que ele certamente entende como político – de um político que se considera habilitado a sonhar com a Presidência da República –, mas não passa da manifestação descontrolada de quem defende o uso da violência para atacar tudo o que não se compatibiliza com sua doentia visão de mundo. É célebre a frase com que o deputado – que a repetiu na entrevista – repreendeu os torturadores que deram chance aos “vagabundos” que passaram por suas mãos de se “vitimizarem” em declarações posteriores: “Isso que dá torturar e não matar”.
Classificar o deputado do Rio de Janeiro como apenas mais uma das figuras “excêntricas”, “exóticas” ou “extravagantes” que compõem o setor mais sombrio do cenário político brasileiro seria cometer um grave equívoco. O equívoco de não levar em conta o potencial da pregação da violência no momento em que, padecendo os efeitos de uma grave crise econômica, política, social e moral, o País se torna excepcionalmente vulnerável à conspiração contra os valores éticos e morais que a incipiente democracia brasileira luta para firmar.
Bolsonaro não aprendeu nada com a experiência autoritária que o País experimentou por mais de 20 anos. As próprias Forças Armadas acabaram se dando conta de que haviam extrapolado os limites da rejeição ao totalitarismo comunista e à corrupção endêmica, que foram dois dos principais pretextos de sua intervenção em 1964, e optaram por aceitar, depois de um longo período de “distensão lenta e gradual”, o restabelecimento das liberdades democráticas. Hoje, dando exemplo de genuíno patriotismo, os militares se dedicam a suas responsabilidades institucionais. Não merecem que um oportunista retrógrado, visivelmente obcecado pelo poder, tenha a ousadia de se apresentar como porta-voz dos quartéis.
O deputado pelo Rio de Janeiro – Estado infelizmente perseguido pelo estigma de abrigar algumas das piores figuras da atual política brasileira – exibe características marcantes de um comportamento antissocial que não se limita a infringir os princípios mais elementares da civilidade. Sua obsessão pela força bruta – a “porrada” que ele preconiza para enfrentar a violência – vem associada, na entrevista, a outros estranhos sintomas de exacerbação de gênero. Dizem que há cura para isso.
O que é lamentável é que figura assim, cujo universo mental se resume a caçar inimigos a porradas, inspire empatia em parte da população. Seu nome surge com cerca de 9% de citações em pesquisas de opinião sobre o primeiro turno das eleições presidenciais de 2018. Há quem diga que isso e nada significam a mesma coisa. Mas o fato é que a pregação sistemática da violência solapa a democracia. E, no limite, cria as condições subjetivas para o surgimento de um líder messiânico – é assim que Bolsonaro se apresenta – como tantos que já infelicitaram o Brasil.
As mesmas pesquisas de opinião que dão 9% de preferência ao deputado Bolsonaro registram grande índice de rejeição a seu nome. Essa rejeição tenderá a aumentar o entendimento, pelo público, dos males que alguém com a personalidade de Bolsonaro pode causar ao País, se galgar postos mais elevados do que permite sua mediocridade.
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