- Valor Econômico
Brasil é o único país emergente em reforma e retomada
Uma prova de fogo está armada no mercado financeiro nesta segunda-feira. Após fortíssima correção nas últimas sessões, juros, câmbio e ações poderão ter seus preços recompostos se progredirem acordos para novas delações no processo da Operação Lava-Jato. Essas negociações não surpreendem, mas preocupam. Na sexta, grandes investidores e gestores de investimentos elevaram apostas, em dinheiro, na certeza de que a retomada do crescimento ganhará escala com a aprovação da Reforma da Previdência no Congresso.
A aceleração da tendência dos principais ativos, sobretudo na última sessão da B3, mostrou-se arriscada após o fechamento dos negócios no mesmo dia. A informação de que o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil, Antônio Palocci, trocou de vez sua defesa por especialistas em delação premiada elevou a temperatura de profissionais do mercado.
Quem chutou o balde sobretudo na sexta, contando em recomprar ativos a preços compensadores nesta segunda, poderá não ter essa sorte. Até pelo elevado risco, o mercado financeiro - com o espírito de corporação protetora - também poderá evitar marola e eventuais perdas.
O mercado acelerou a revisão de preços dos ativos. As taxas de juros foram empurradas para o intervalo de 8% a 9% nas operações para liquidação futura na BM&F, sob previsão de influentes instituições financeiras que veem taxa Selic em 8% em dezembro, com queda de até 1,50 ponto na próxima reunião do Copom; taxa de câmbio em direção a R$ 3,10 ou menos, uma semana depois de ter atingido R$ 3,20; e Ibovespa alçado acima de 68.000 pontos.
A chance de aumento de risco contempla o que se mostrava consenso até a semana passada: o estrago potencial que uma delação de Palocci pode escancarar. O ex-ministro pode detalhar sobretudo o relacionamento mantido entre grandes bancos e o Palácio do Planalto, capitaneado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) de janeiro de 2003 a 12 de maio de 2016.
Esse relacionamento tornou-se mais intenso nos últimos anos de explícita insatisfação do setor privado com as escolhas de política econômica feitas nos governos de Dilma Rousseff - de 2011 até maio de 2016, quando foi afastada temporariamente do cargo para se defender do processo de impeachment que acabou justificando seu afastamento definitivo no fim de agosto do ano passado.
Os dois primeiros mandatos do PT no comando do país - 2003 a 2010 -, transcorreram sem grandes percalços porque o ex-presidente Lula pediu passagem com a "Carta ao Povo Brasileiro", documento em que assumiu o compromisso de dar continuidade às reformas iniciadas pelo governo anterior, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Palocci é considerado o idealizador desse documento que, ao ser lançado em 2002, freou uma corrida contra o real. O segundo mandato de Lula não terminou sem polêmica, mas nada próximo ao que se viu no governo Dilma Rousseff.
Na gestão da ex-presidente - afastada por crime de responsabilidade -, tornaram-se praxe intervenções em vários setores da economia, notadamente o setor elétrico que foi desmantelado.
O sistema bancário sofreu pressões inéditas para reduzir sobretudo o spread - diferença entre custo de captação de recursos e crédito. Uma queda artificial da taxa Selic, de meados de 2011 até 2013, foi crítica na ampliação da instabilidade que já revestia financiamentos da dívida pública. Entretanto, foi a "contabilidade criativa" que coroou o risco.
Há muito passado nesta edição da coluna, mas, nos últimos muitos anos, investidores, banqueiros e empresários agarraram-se à reputação de destacados personagens da história econômica e política do país. Entre os expoentes desse reconhecimento privado estão Henrique Meirelles, ministro da Fazenda do governo Temer e ex-presidente do Banco Central durante os dois mandatos de Lula, e Antônio Palocci.
É fato que, na sexta-feira, bons ventos para os mercados emergentes sancionaram a melhora dos ativos brasileiros beneficiados por quedas consecutivas do risco-país avaliado pelo Credit Default Swap (CDS) a 202 pontos-base no mercado internacional.
A revisão contínua de preços dos ativos negociados no mercado local poderá ser concluída com vetores políticos favoráveis e com fundamentos que têm revelado melhora, embora lenta. Parcela substancial desse avanço se deve ao fato de o mercado perceber que o governo "saiu das cordas" na negociação dos votos necessários para aprovação da PEC da Previdência; no uso da caneta para angariar um número maior de aliados e no potencial fechamento de questão por partidos políticos pela aprovação dessa reforma.
É isso o que diz à coluna um respeitado profissional que pede anonimato. "Não existe uma confiança cega quanto a aprovação da Reforma da Previdência, mas esse continua sendo o cenário base da imensa maioria de profissionais do mercado. Adicionalmente, diz nosso interlocutor, os fundamentos seguem melhorando. A perspectiva de inflação não para de melhorar. "Já alteramos nossa projeção de IPCA este ano para 3,5%. Para 2018 seria absolutamente possível 4% ou menos. "
Existe também a expectativa de um primeiro trimestre de 2018 melhor do ponto de vista de atividade, mas com tamanha a ociosidade da economia (mercado de trabalho, por exemplo), ninguém antevê qualquer pressão inflacionária no médio longo prazos. Consequência, o mercado já apreça por volta de 50% de probabilidade a redução da taxa Selic de 1,25 ponto percentual no próximo encontro do Comitê de Política Monetária (Copom) nos dias 20 e 31 de maio.
Soma-se aqui nas contas externas do país, um déficit em conta corrente decrescente e tranquilamente financiável", afirma o gestor para quem o Brasil talvez seja o único país, entre os principais emergentes, que passa por um processo de reformas estruturais. Também se avizinha crescimento, combinação perfeita para um ajuste com diferenciação dos ativos brasileiros. Como se não fosse o bastante, o cenário externo ainda muito positivo para emergentes de forma geral.
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