O Globo
Trezentos e sessenta e três ianomâmis
morreram por desnutrição e malária em 2023, mais que os 343 óbitos do ano
anterior. Revelado o número, a ministra Sonia
Guajajara anunciou a criação do primeiro hospital indígena na História
do país. Ficará em Boa Vista, mas ainda não se sabe quando começam as obras.
Sabe-se, porém, que fracassaram as medidas emergenciais tomadas no ano passado
para retirar garimpeiros das terras ianomâmis. Garimpeiros expulsos voltaram
para a região.
E agora? O governo decidiu que Forças Armadas e Polícia Federal deverão ter presença definitiva no território. A partir de quando? Não se sabe. Fracassaram também as ações para levar alimentos e cuidados médicos. Não há novos planos emergenciais em andamento, mas há anúncios. Além do hospital, o governo informou que construirá unidades básicas de saúde na região. Prazos? Metas? Nada.
No final de janeiro, o presidente Lula lançou
o Programa Pé de Meia, espécie de bolsa para permitir a permanência na escola
de alunos mais pobres. A ideia é boa. O presidente tem razão quando comentou:
— Esta política não pode ser de governo, tem
que ser de Estado, com a participação da sociedade, porque senão cada governo
que entra muda tudo, e as coisas não acontecem efetivamente.
Pois o governo Lula está tentando mudar todas
as normas do ensino médio, que haviam sido aprovadas pelo Congresso ainda no
período Temer e estavam em implantação. Desde o início do governo, a esquerda
luta pela revogação total daquelas normas. Secretários estaduais de Educação e
entidades civis entendem que o modelo deveria ser mantido, com ajustes
pontuais, que podem ser feitos sem novas legislações.
No meio do debate, o ministro Camilo
Santana enviou um projeto de lei ao Congresso. Ali, caiu na relatoria
do deputado Mendonça Filho, que era o ministro da Educação quando foi aprovado
o novo ensino médio. Claro que resulta numa tramitação complexa. Assim, a
votação do projeto do governo Lula ficou para este ano, ainda sem data.
Resultado: milhões de alunos não sabem como serão as aulas e as matérias que
terão nos próximos anos.
Trata-se de um desvio típico, da mesma
natureza do que ocorre com a administração (ou falta de) da crise ianomâmi.
Faltam ações concretas, sobram as tais “políticas estruturantes”.
Na questão indígena, o governo federal pelo
menos assume que é seu problema. Na educação, há tendência a colocar a culpa em
governos estaduais e prefeituras, que, sim, têm papel essencial. Mas,
considerando que há problemas comuns em todo o país e que o governo federal tem
a maior parte do dinheiro, pelo menos a coordenação deve ser de Brasília.
O problema básico é conhecido: os alunos das
escolas públicas têm ensino muito pior que os colegas das particulares. Com
essas tentativas de impor novas regras “estruturantes”, existe o risco de o
governo atrapalhar a escola privada, como já acontece com o ensino médio, e não
melhorar a pública.
Na segurança pública, o governo Lula passou
um ano tentando empurrar a coisa para os governos estaduais — de fato,
responsáveis primários pelas polícias. Mas é evidente que a crise é nacional. O
tráfico de drogas e armas passa por todo o país, a começar pelas fronteiras
federais. O crime organizado é nacional, não raro internacional.
Quando a atuação das milícias e facções
atingiu momentos alarmantes no ano passado, o então ministro da Justiça e da
Segurança anunciou o quê? A preparação de um plano nacional. Sobrou para o novo
ministro, Ricardo
Lewandowski, que mal assumiu e já topou com a fuga de presos do presídio
federal de Mossoró — dois chefes de uma facção nacional.
E a saúde. Os especialistas sabiam que estava
por ocorrer um grande surto de dengue. Ocorreu, e o Ministério
da Saúde corre atrás. Comprou as vacinas, é verdade, mas elas têm
efeito a prazo maior, e a emergência do momento são ações sanitárias. As
prefeituras têm de fazer isso? Têm. Mas o governo federal precisa entregar
dinheiro, gente e equipamentos. E anúncios. Aqui, sim, uma campanha nacional de
esclarecimento teria sido muito eficiente.
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