O Estado de S. Paulo
Sem cuidar da capacidade produtiva, incluído
o potencial do trabalhador, será irrealista pensar em crescimento mais dinâmico
Grandalhão, ineficiente e sem rumo de longo prazo, o Brasil estará condenado à mediocridade enquanto o governo descuidar do investimento produtivo e da busca de produtividade, como vem ocorrendo na maior parte do século 21. O Brasil está no “rumo certo”, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, comemorando o desempenho da economia no primeiro trimestre, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,8% sobre os três meses finais de 2023. Mas boa parte dessa expansão foi apenas uma retomada, depois de dois meses de variação próxima de zero. O quadro parece pouco melhor quando se observa um período mais extenso. Ao longo de um ano a atividade aumentou 2,5%, com ampla desigualdade entre os setores. A agropecuária avançou 6,4% e os serviços, 2,3%, enquanto o produto industrial se expandiu 1,9%, mas com novos tropeços e novos sinais de retrocesso.
O setor extrativo liderou o avanço da
indústria, com aumento de 8,2%, enquanto o segmento de transformação,
fabricante de bens de consumo e de meios produtivos, entregou 0,6% menos que no
período anterior. Persistiram, portanto, os sinais de enfraquecimento da
atividade fabril, notados há mais de uma década. Não se trata, é importante
ressaltar, da passagem para uma fase pós-industrial, semelhante ao processo
observado em economias mais desenvolvidas. Longe disso, os números apontam
dificuldades de avanço numa industrialização ainda incompleta, insegura e
globalmente pouco integrada.
O presidente Lula, no entanto, mostra-se
incapaz de perceber as dificuldades de expansão, de modernização e de atuação
internacional das indústrias nacionais. Mais empenhado em buscar a liderança em
um “Sul Global” muito mal definido, o governante brasileiro continua devendo
uma política de integração econômica nos mercados globais. Não se formulará
essa política sem uma prévia definição de objetivos e interesses nacionais
prioritários e independentes de vínculos externos.
Definir esses objetivos e parâmetros é muito
diferente de proclamar valores e interesses num palanque sindical ou num
discurso de início da carreira política. É muito diferente, também, de seguir
uma cartilha de mandamentos ideológico-partidários. O presidente brasileiro tem
sido capaz, em algumas ocasiões, de ultrapassar as limitações petistas, mas em
movimentos pouco duradouros.
Essa limitação é bem visível quando se trata,
por exemplo, da gestão das contas públicas. O ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, tem prometido equilibrar as finanças federais ou, pelo menos, diminuir
sensivelmente seu desequilíbrio, enquanto seu chefe se mostra mais inclinado a
manter a gastança. Quando se trata de gastar, o presidente se mantém muito mais
fiel ao velho ideário petista do que aos critérios da responsabilidade fiscal e
da aritmética financeira.
Prioridade política para o presidente Lula é
favorecer consumo, como se fosse possível atender mais consumidores, de forma
indefinida, sem cuidar da oferta. Mas isso é fisicamente inviável. Para cuidar
da oferta, nesse caso, é preciso ampliar a capacidade produtiva. Isso depende,
inevitavelmente, de maior investimento, mas o presidente parece dar pouca
atenção a esse detalhe. O ideário petista valoriza o crescimento econômico e a
criação de empregos, mas os meios para aumentar a expansão econômica nem sempre
são lembrados.
Para se investir no potencial produtivo é
preciso, normalmente, mobilizar capitais privados e recursos públicos. Essa
mobilização tem ficado longe dos valores necessários. No primeiro trimestre
deste ano, o total investido equivaleu a 16,9% do PIB, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Um ano antes havia correspondido
a 17,1%. Nos dois momentos, ficou-se muito longe do necessário para garantir a
um país como o Brasil um crescimento em torno de 4% ao ano, talvez um pouco
superior.
O mínimo necessário, segundo estimativa
corrente, seria algo na faixa de 22% a 24% do PIB, proporção raramente
alcançada, no País, nas últimas três ou quatro décadas. Outros emergentes, no
entanto, têm conseguido manter esse volume de investimento em meios físicos de
produção, como recursos de infraestrutura, máquinas e equipamentos. Mas também
seria preciso pensar no investimento em capital humano, isto é, na formação de
mão de obra produtiva e em condições de receber treinamento profissional. Mais
do que aumentar o valor investido, seria preciso pensar no sistema educacional
e na formação oferecida às crianças e aos jovens.
Sem cuidar da capacidade produtiva, incluído
o potencial do trabalhador, será irrealista pensar em crescimento mais
dinâmico. O Brasil continuará condenado a avançar lentamente, como se a
perspectiva de um crescimento próximo de 2% ao ano fosse uma praga insuperável.
Não basta pensar na redução dos juros e em formas de atração e de mobilização
de capital. Mas, sem um rumo bem definido e sem uma ação governamental
confiável, será difícil mobilizar o esforço empresarial. Um setor público
responsável será um componente essencial desse quadro. •
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