sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Marco Aurélio Nogueira* - Agressões gratuitas e uma promessa emergente

Campanha eleitoral em São Paulo deixou a cidade de lado, em que pesem os esforços de Tabata Amaral

O que esperar de uma eleição como a da cidade de São Paulo em 2024? Ela chega aos dias finais com três candidatos enrolados entre si na ponta das pesquisas de intenção de votos. Correndo por fora, a candidata mais promissora.

Os ponteiros não são iguais entre si, mas pecam por características equivalentes. O deles, o fanfarrão, não interage com ninguém, é contra o centro e a esquerda, despreza a democracia e tem muito pouca coisa na cabeça. Concorre basicamente para perturbar a disputa e se cacifar ou para voos políticos mais altos, ou para alavancar seus negócios particulares.

Ricardo Nunes, prefeito atual, quer se mostrar um executor de obras pragmático, como cabe a um incumbente quando disputa a reeleição. Sua característica complicadora é que, sendo de centro, não consegue dialogar com a esquerda, campo com o qual tem relações atormentadas. Tem o apoio discreto de Bolsonaro, que, no entanto, não conseguiu manter sua tropa unida e pesa pouco na disputa.

Boulos, formalmente apoiado por Lula, veio do PSOL com o objetivo de comer os votos petistas da capital e ganhar fôlego na carreira, hoje limitada ao ativismo dos “sem-teto” e a um mandato inexpressivo de deputado federal. Sua característica complicadora é não saber dialogar com o centro, desprezá-lo e vê-lo sempre como estando à extrema direita. Sua falta de flexibilidade e desejo é flagrante. Ele parece o tempo todo temendo a crítica de seus companheiros de que seria uma “esquerda neoliberal”. Precisa posar de radical e ao mesmo tempo de moderado, figurino incômodo para ele.

Sem diálogos intensos entre centro e esquerda, uma cidade como São Paulo é ingovernável. Gestão urbana não se resolve com estigmatizações, nem com ideologias. Ela necessita de realismo, ideias e capacidade gerencial. Falar em “campo bolsonarista” para nele encaixar Ricardo Nunes é tão nefasto quanto falar em “conluio de esquerdistas” para incluir quem quer que seja. Pode servir para justificar uma intempestiva e incompreensível campanha pelo “voto útil”, inofensiva em si mesma. Mais que uma bobagem, é um equívoco político.

Tabata Amaral corre por fora. Cheia de propostas, boas intenções e capacidade reflexiva. Ela dialoga com o centro e a esquerda, e o faz sem preocupações ideológicas, mas sim em nome da produção de consensos sustentáveis e de ações que blindem a democracia e promovam justiça social. Jovem, carismática, inteligente, firme em suas posições e corajosa, Tabata é o único destaque da eleição, a “novidade” que tantos aguardam.

Apesar disso e do amplo reconhecimento público de que tem tido o melhor desempenho ao longo da campanha, ela se ressente da falta de uma máquina potente e de apoios partidários consistentes, que poderiam impulsioná-la. Compensa isso com ampla presença nas mídias sociais e muitas caminhadas pelas ruas. Poderá não ser suficiente, mas mostra que está no ringue e pode surpreender.

Vista em bloco, a eleição paulistana foi medíocre do começo ao fim. Os candidatos mais fortes se encarregaram de rebaixar as disputas, entrechocando-se sem cessar, artifício que os ajudou a ocultar a falta de ideias e propostas, bloqueando o debate público democrático.

Salvo surpresas de última hora, o segundo turno tenderá a seguir a mesma toada. Isso só não acontecerá se as urnas do próximo domingo consagrarem um “terceiro termo” que mude a qualidade das disputas. Quer dizer, se Tabata Amaral se projetar vitoriosamente.

*Cientista político brasileiro, doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo e professor de teoria política na Universidade Estadual Paulista.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Excelente análise! Parabéns ao autor, e ao blog por divulgar seu trabalho.