Valor Econômico
Em fevereiro, presidente terá de recompor o ministério para formar um time totalmente alinhado ao seu projeto de reeleição
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal
(STF) Hermes Lima, morto em 1978, e citado nesta coluna na semana passada,
dizia que política “é uma atividade para pecador, e pecar é uma das atividades
mais fascinantes, contraditórias e perturbadoras que o ser humano pode
exercer”.
Aposentado compulsoriamente pela ditadura militar em 1968, pelo AI-5, Lima transitou antes pela política. Foi deputado federal, ministro do Trabalho e chanceler do governo João Goulart. Em uma entrevista de 1977, declarou que o cargo de ministro foi “extraordinário”, mas não tinha a “excitação e os imprevistos” que a vida de deputado proporcionava.
Em observação mais recente, a propósito do
impeachment da presidente Dilma Rousseff, um senador - que vem a ser um dos
oráculos do Congresso - disse à titular desta coluna, em confidência, que o
problema da petista foi não pecar. “O erro da Dilma foi querer rezar terço em
casa de meretrício”, traduziu.
Na vida, pecamos por excesso, omissão, e
segundo a doutrina católica, pela gula, avareza, luxúria, ira, inveja, preguiça
ou soberba. Na política, até mesmo o líder mais experiente, da estatura do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pecará se não honrar a palavra acordada
ou por omissão, se perder o “timing” de um movimento estratégico, como a dança
das cadeiras no primeiro escalão.
Pois Lula, em plena metade de seu terceiro
mandato, acha-se sob pressão de lideranças do Centrão, esse grupo de partidos
hegemônicos no Parlamento, para encerrar o ciclo do que vêm chamando de
“governo de amigos”, e fazer um freio de arrumação voltado aos últimos dois
anos de gestão e à largada na campanha à reeleição.
Desde o primeiro ano, Lula tem sido criticado
pelos aliados do Centrão por se fechar em copas com petistas no Palácio do
Planalto. E nem sempre foi esse o modelo. Nos governos Lula 1 e 2, ministros de
outros partidos tinham assento no palácio. José Múcio Monteiro (hoje titular da
Defesa) e Walfrido dos Mares Guia, ambos do PTB na ocasião, alternaram-se no
Ministério da coordenação política, bem como Aldo Rebelo, então no PCdoB.
Mas a opção de Lula, segundo auxiliares de
seu entorno mais próximo, tem uma explicação cristalina como a água. O
presidente ainda guarda frescos em sua memória os 580 dias em que esteve preso
nas instalações da Polícia Federal em Curitiba, e tem anotados no caderninho os
nomes dos aliados que jamais saíram de seu lado, bem como os daqueles que se
afastaram nos tempos das vacas magras.
Por esse critério, quem ocupa cadeiras no
Planalto são alguns dos aliados que demonstraram fidelidade canina a Lula nos
piores momentos, e se engajaram no “Lula, livre”. Lá estão Rui Costa (Casa
Civil), Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Paulo Pimenta (Comunicação
Social) e Márcio Macedo (Secretaria-Geral). Fernando Haddad foi cotado para a
Casa Civil, mas escolheu a Fazenda.
Porém, com o tensionamento da conjuntura
política, em que o governo precisa que os partidos de Centro aprovem, a toque
de caixa, as medidas de contenção de gastos - num cenário de aceleração da
inflação e escalada do dólar - aumentou a pressão sobre Lula para que ele faça
a reforma ministerial. E na esteira das mudanças, nomeie um quadro do Centrão
para uma cadeira no Planalto.
Até auxiliares petistas admitem que, em
fevereiro, após a posse dos novos presidentes da Câmara dos Deputados e do
Senado, Lula terá de recompor o ministério para formar um time totalmente
alinhado ao seu projeto de reeleição, ou de continuidade do PT no governo.
Um ministro não petista observou à coluna que
Lula deveria nomear um quadro do Centrão para fazer a interlocução com o
Congresso no lugar de Padilha, e repetir um modelo que funcionou no passado. O
ideal, diz a fonte, seria um deputado, porque a Casa a ser presidida por Hugo
Motta (Republicanos-PB), faz um jogo “mais duro”.
Porém, o que vem circulando na bolsa de
apostas é o nome do titular de Minas e Energia e ex-senador, Alexandre Silveira
(PSD-MG), para a cadeira de Padilha. A se confirmar a troca na articulação
política, as fontes ouvidas pela coluna dizem que Padilha reassumiria as rédeas
do Ministério da Saúde. A conferir.
Importante rememorar que Lula não funciona
sob pressão. Ao contrário, se lhe apertam de um lado, ele dá meia volta e reage
do outro. Basta lembrar que ele foi diuturnamente cobrado a editar medidas de
contenção de gastos por mais de dois meses, pelos agentes econômicos. O pacote
foi anunciado somente quando Lula autorizou, e com o acréscimo da reforma do
Imposto de Renda, o que tumultuou a resposta às medidas.
Lula observará, todavia, que os recados de insatisfação estão saindo aos gritos, até pelo represamento das emendas parlamentares. “Hoje o governo não tem voto nem sequer para aprovar as urgências dos projetos de lei”, avisou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em evento do portal “Jota”. A aflição refletiu-se no placar de votação. O governo aprovou o regime de urgência dos projetos de lei ordinária e de lei complementar referentes ao pacote fiscal no sufoco. O projeto de lei complementar passou com vantagem de apenas 3 votos, e houve 98 votos contrários. No outro PL, foram 156 manifestações contrárias. Lula terá de agir e não pecar por omissão. Depois, não adiantará ajoelhar e rezar.
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