Para assessor de Lula, posição norte-americana pode abrir precedentes e iniciar instabilidade em Honduras
Denise Chrispim e Marin Lisandra Paraguassú, de O Estado de S. Paulo
MANAUS - Em mais um sinal de desaprovação do Planalto à política dos Estados Unidos para Honduras, o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, disse nesta quinta-feira, 26, temer que a posição americana introduza na América Latina a tese do golpe preventivo. Marco Aurélio insistiu que essa conduta traz o objetivo de "branquear" (legitimar) o golpe e que seus articuladores - os EUA e alguns países alinhados da região - serão os responsáveis por um longo período de instabilidade em Honduras.
"Nossa preocupação é que introduzam a tese do golpe preventivo na América Latina", declarou o assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antes da fracassada tentativa do Brasil de reunir os líderes de países amazônicos para uma discussão sobre mudança climática. "Para os Estados Unidos, é bom ter uma boa relação com a América Latina", advertiu, laconicamente, ao ser questionado sobre a percepção do governo de facto de Honduras de que o reconhecimento americano das eleições seria suficiente para o país voltar à normalidade.
Segundo o assessor, essa questão é mais relevante que a decisão da Suprema Corte de Justiça de Honduras de que a destituição do presidente Manuel Zelaya é definitiva. A palavra final da corte, para ele, é apenas um "jogo de cartas marcadas" com o Congresso. "Não há novidade." Marco Aurélio enfatizou sua frustração com a conduta "ideológica de certo setor da diplomacia americana" ao lidar com a crise política hondurenha. Agregou que a política externa dos EUA pode ser acusada de qualquer coisa, "menos de ser amadora" e que o tempo para uma solução para a crise hondurenha está se esgotando. "Se (os americanos) estão pensando em empurrar (a solução da crise de Honduras) com a barriga, o tempo é curto."
CRISE
Alegou ainda que sua decepção vem sendo compartilhada publicamente pelo chanceler Celso Amorim e o secretário-geral das Relações Exteriores, Antonio Patriota. No entanto, insistiu que "não há crise" entre Brasil e EUA. Na quarta-feira, 25, diante de suas declarações à imprensa, Marco Aurélio recebeu um telefonema do general James Jones, conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca.
Nesta quinta-feira, 26, depois de uma hora de conversa com a secretária de Estado, Hillary Clinton, Amorim afirmou que "não há divergências maiores" nos princípios que balizam as posições dos dois países sobre o tema e que o Brasil não fará dessa questão um "ponto de confrontação" com Washington. Segundo o chanceler, a diferença estaria na visão brasileira de que o golpe de Estado não pode nunca legitimar uma mudança política.
Na avaliação do Palácio do Planalto, a indicação dos EUA de que podem vir a reconhecer como legítimo o presidente que será eleito em Honduras no próximo domingo abriria um enorme precedente para outros golpes de Estado na região. Marco Aurélio mencionou os riscos registrados ainda neste ano na Guatemala. Conforme afirmou, o Brasil somente reconhecerá o resultado das eleições de Honduras se o presidente Manuel Zelaya for restituído a seu cargo. O governo brasileiro registra ainda com apreensão o alinhamento de países latino-americanos - em princípio, Panamá, Colômbia e Peru - à posição americana sobre Honduras. Um das consequências seria a divisão entre os latino-americanos que, no mês passado, haviam firmado uma posição comum sobre a necessária volta de Zelaya à Presidência para que o pleito de domingo seja legitimado.
Outra consequência seria a fragilização da credibilidade da Organização dos Estados Americanas (OEA). Para o chanceler Amorim, o fato de o Brasil e outros países não se alinharem aos EUA na OEA não seria um problema, uma vez que divergências são notadas nas votações das Nações Unidas. "Não precisamos ficar com essa obsessão de que, se não vota com os EUA, algo de ruim vai acontecer, vai cair um raio na nossa cabeça. Não é assim", afirmou Amorim. Marco Aurélio, entretanto, acredita que os EUA terão de "refletir sobre a divisão da América Latina e a credibilidade da OEA", além de assumir a responsabilidade pela instabilidade política a que condenarão Honduras, antes um "Estado tranquilinho."
Nenhum comentário:
Postar um comentário