Revisor segue Joaquim Barbosa e considera culpados Pizzolato, Valério e ex-sócios
Ministro também reconheceu que houve desvio de dinheiro público; ficou para hoje o voto de Lewandowski sobre o deputado petista João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara e candidato a prefeito em Osasco
O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão, surpreendeu quem acreditava que ele faria um contraponto integral à posição do relator, Joaquim Barbosa. Votou pela condenação do ex-diretor do BB Henrique Pizzolato por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, como fizera Barbosa. Também reconheceu que o esquema operado por Marcos Valério desviou recursos públicos e votou pela condenação de Valério e dos ex-sócios por corrupção ativa e peculato. Lewandowski e Marco Aurélio Mello reagiram à intenção de Cezar Peluso de antecipar o voto sobre os 37 réus. "Sobre isso ainda não conversei nem com minha mulher" disse Peluso.
O segundo voto pela condenação
Lewandowski segue Barbosa e considera culpados Pizzolato, Valério e seus ex-sócios
Carolina Brígido, André de Souza
UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA
BRASÍLIA - O revisor do processo do mensalão, Ricardo Lewandowski, iniciou ontem seu voto no Supremo Tribunal Federal (STF) condenando o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, como fez na segunda-feira o relator, Joaquim Barbosa. Lewandowski também reconheceu que o esquema operado por Marcos Valério desviou recursos públicos do Banco do Brasil. Ele votou pela condenação de Valério e seus ex-sócios na DNA Propaganda Cristiano Paz e Ramon Hollerbach por corrupção ativa e peculato.
A primeira parte do voto de Lewandowski surpreendeu quem acreditava que ele apresentaria um contraponto integral à posição do relator. O revisor admitiu que iria absolver Pizzolato de uma das acusações de peculato, mas explicou que anteontem à noite reexaminou as provas e mudou de ideia. Lewandowski retoma o voto hoje com foco no deputado João Paulo Cunha (PT-SP), que Barbosa já condenou por lavagem de dinheiro, corrupção passiva e peculato.
R$ 326 mil em troca de verbas do Visanet
O revisor afirmou que o ex-diretor do BB recebeu R$ 326,6 mil de Marcos Valério e seus ex-sócios na DNA. Em troca, teria autorizado o pagamento irregular de R$ 73,8 milhões do Fundo Visanet aos empresários, do qual o Banco do Brasil era o principal acionista, em quatro transferências. Segundo Lewandowski, a agência de publicidade não realizou os serviços correspondentes ao pagamento. O recebimento da vantagem indevida configura corrupção passiva; o pagamento do dinheiro, corrupção ativa.
- A vantagem ilícita oferecida tinha como objetivo que o réu Henrique Pizzolato autorizasse antecipação de pagamento à DNA publicidade, que alcançara o valor de R$ 73,8 milhões. Essas antecipações foram consideradas irregulares por auditorias internas do Banco do Brasil, porque contrariaram a norma que proíbe pagamento antecipado à prestação de serviço - disse, concluindo: - Tenho como presentes todos os requisitos de corrupção passiva, pois o réu recebeu R$ 326,6 mil do corréu Marcos Valério e sócios para praticar atos de ofício que estavam em sua esfera de atribuições, o que resultou do desvio de recursos do fundo patrocinado pela instituição financeira.
O revisor também condenou Pizzolato por lavagem de dinheiro por ter tentado encobrir a origem dos R$ 326,6 mil e o real beneficiário do saque, que foi ele mesmo. Em sua defesa, o ex-diretor do BB alegou ter recebido o dinheiro em dois envelopes sem saber do que se tratava. Para fazer um favor, ele teria repassado a encomenda a uma pessoa do Partido dos Trabalhadores.
- Admito que os fatos sejam um tanto quanto nebulosos, mas defesa não se incumbiu de comprovar as afirmações que fez em juízo, sendo insuficiente para inocentar o réu dizer que o dinheiro foi sacado para uma pessoa do Partido dos Trabalhadores de resto não identificada - afirmou Lewandowski.
O revisor condenou Pizzolato, Valério e seus sócios por peculato, pelo desvio dos recursos do Visanet. Assim como fez Barbosa, Lewandowski rebateu o argumento da defesa de que o dinheiro do fundo de investimento não é público, mas privado. Para o revisor, pouco importa a natureza dos recursos, pois, para caracterizar o peculato, é necessário apenas que o funcionário público cometa desvios no exercício da função:
- Peculato exige a comprovação de que o autor é funcionário público e que o bem móvel tenha sido desviado pelo cargo exercido, sendo irrelevante a origem ou a natureza do bem móvel.
O ministro ponderou que, embora irrelevante a informação para a configuração do crime, o dinheiro do Visanet é público:
- Os recursos direcionados ao Visanet, além de serem vinculados do BB, saíram diretamente dos cofres deste.
Segundo o revisor, Pizzolato autorizou a transferência dos R$ 73,8 milhões para a DNA, embora essa atribuição fosse de duas diretorias em conjunto. O ex-diretor não teria justificado os pagamentos e a agência teria falsificado notas fiscais para tentar comprovar o serviço e "ludibriar a fiscalização", conforme comprovaram auditorias realizadas pelo próprio banco. O ministro comentou que, na área de marketing do banco, "reinava a balbúrdia".
- A Procuradoria Geral da República demonstrou que Marcos Valério apropriou-se de recursos pertencentes ao Banco do Brasil, em conluio com o réu Henrique Pizzolato e outros. O primeiro, forjando notas fiscais e adulterando a contabilidade das empresas para conferir aparência de legalidade aos repasses; e o segundo, autorizando antecipações milionárias em desacordo com o estatuto do fundo Visanet. Ademais, aceitou documentos fiscais frios que lhe foram apresentados, além de atestar prestações de serviços inexistentes pela DNA propaganda - concluiu Lewandowski.
O revisor também condenou Pizzolato, Marcos Valério e seus sócios por outra prática de peculato. Ele chegou a afirmar que as agências têm direito a receber bônus de volume por veiculação de anúncios. O Ministério Público acusou o grupo do desvio de R$ 2,9 milhões referentes a bônus de volume. Lewandowski disse, no entanto, que, depois de reanalisar o processo, deu "uma guinada de 180 graus", e percebeu que Valério, Paz e Hollerbach apresentaram ao BB notas que não poderiam ser esse tipo de bonificação regularmente praticada no mercado publicitário. Eles teriam fraudado notas fiscais para dar a impressão de que eram bônus de volume os outros benefícios recebidos de empresas prestadoras de serviço.
DNA falsificou 41,6 mil notas fiscais
Segundo laudos extraídos do processo, dos R$ 2,9 milhões declarados pela DNA como bônus de volume, apenas R$ 419 mil seriam correspondentes a essa bonificação. Ainda conforme perícias citadas pelo revisor, a empresa falsificou 41,6 mil notas fiscais para tentar dar uma aparência lícita ao dinheiro recebido. Em um exemplo citado pelo ministro, a DNA recebeu R$ 500 mil extras de um fabricante de agendas e emitiu nota como se fosse bônus de volume para não transferir o dinheiro ao BB. A fraude é patente porque os bônus de volume só podem ser pagos por canais de TV, rádio, jornais e revistas. Pizzolato teria sido conivente com o esquema.
- Restou comprovado que a empresa distorceu o real conceito do bônus de volume para se locupletar de recursos do Banco do Brasil por meio de notas fiscais fraudadas, eis que não correspondiam a serviço prestado por meio de comunicação - disse o ministro.
Ao fim da sessão, o magistrado absolveu o ex-ministro da Secretaria de Comunicação Luiz Gushiken da acusação de peculato por falta de provas, como recomendou o MPF. Barbosa também votara dessa forma.
- Concluída a longa fase instrutória, o que se produziu de prova contra o réu? Absolutamente nada. Mostra a importância de que as condenações se baseiem apenas nas provas colhidas em juízo, porque as provas extrajudiciais submetem os acusados às maiores humilhações.
Ao final Joaquim Barbosa disse que o julgamento terminará em setembro.
- O julgamento vai terminar em setembro. Eu garanto a todos vocês.
FONTE: O GLOBO
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