Após conseguirem maioria no parlamento britânico nas eleições de 2015, os conservadores se dedicaram a destruir sua própria reputação. David Cameron tentou ganhar disputas provincianas dentro do partido prometendo que se ganhasse eleições convocaria um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia. Não contava com o resultado - o Brexit venceu. Theresa May o sucedeu após esse estrondoso fracasso, mas também teve seu momento fatal de aprendiz de feiticeiro. Ao pregar uma saída radical do mercado comum, convocou eleições antecipadas, certa de que reforçaria o predomínio que seu partido possuía. Outro engano fatal. Os conservadores perderam a maioria, saíram com 12 cadeiras a menos do que entraram, ressuscitaram uma liderança trabalhista em baixa (Jeremy Corbyn), abriram um novo período de instabilidade política e ainda terão de mudar bastante seus planos em relação às negociações do Brexit com Bruxelas. Se é que estarão no poder para conclui-las.
O Reino Unido permanece rachado quase ao meio em relação ao Brexit. À surpresa da vitória da opção de abandonar a UE seguiu-se agora, como resultado das urnas, um movimento de revisão que sugere que, já que a saída é inevitável, que seja suave e com as menores perdas possíveis. Eleitores de maior idade e do interior prevaleceram no referendo do Brexit. Os jovens, que eram contra a saída, foram agora em maior número às urnas e dois de cada três deles votaram nos trabalhistas, embora Corbyn, que é a favor da saída, tenha feito campanha centrada nas questões domésticas.
Em momentos decisivos, como agora, o eleitorado do Reino Unido voltou-se para os partidos tradicionais, o que não ocorreu do outro lado do Atlântico, na França, onde eles levaram uma surra histórica diante de um novato sem partido, Emmanuel Macron. Outras legendas, que ameaçaram por um tempo o predomínio histórico dos dois principais partidos, tiveram resultados díspares, mas fracos. O Ukip, de Nigel Farage, um demagogo saliente na campanha a favor do Brexit, foi execrado pelos eleitores - sua votação caiu de 12,8% do total em 2015 para 1,8% agora. Já os liberais democratas, pró-europeus, recuaram um pouco, de 7,9% para 7,3%, mas ganharam 4 cadeiras no Parlamento (12).
May mostrou-se arrogante, quando não desinteressada da campanha eleitoral que foi, segundo seus apoiadores, conduzida com grande incompetência. O resultado é que os conservadores perderam a maioria por 8 cadeiras. A saída à mão foi uma aliança com o pequeno Partido Unionista Democrático (DUP), da Irlanda do Norte, que obteve 10 cadeiras. A aliança é problemática e os experimentos de governo de minoria, em um parlamento em que nenhum partido é majoritário, não costumam dar certo e terminam por dar em novas eleições.
Com esse passo em falso, além dos problemas que enfrentava terem se tornado maiores, May deu alento a potenciais substitutos dentro de seu partido. George Osborne, ex-secretário do Tesouro, a qualificou de " cadáver ambulante". Além de fortalecer a oposição interna, Theresa May terá de diminuir suas pretensões a um Brexit radical, no qual o controle estrito e independente dos fluxos migratórios jogavam um papel central. Ela não tem mais força política, que pretendia ampliar com as eleições, para levar adiante essa opção. Após o pleito, os conservadores se desuniram.
A premiê deu-se conta dos erros e agora tenta reduzir os danos. Como seu primeiro secretário ela indicou Damian Green, um firme partidário da UE, e outros membros de seu gabinete tentam agora influir para que o governo conservador trilhe um caminho mais sensato, o de procurar um "soft Brexit". Isso significa permanecer no mercado comum ou na união aduaneira, sem poder influenciar suas decisões. Essa posição ambígua tem inconvenientes. Pode ser vista como uma denegação do resultado do referendo, pois de fato o Reino Unido fará a mesma coisa, mas em piores condições que antes.
A nova estratégia terá de ser elaborada e posta em prática sem perda de tempo. May acionou o artigo 50 para iniciar o descasamento antes mesmo das eleições e o tempo para conclui-lo, até março de 2019, está correndo. Os negociadores de Bruxelas terão diante de si um governo frágil internamente. O processo de separação, que já se afigurava difícil, agora será também marcado pela instabilidade.
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