A turbulência na tramitação da reforma da Previdência e os embates entre o governo e o Congresso, além do cenário internacional, começam a ter impacto também em uma das áreas em que a economia vai bem, a das contas externas. Sinal disso foi a redução da taxa de rolagem dos empréstimos tomados no exterior por empresas brasileiras. Dos títulos vencidos em abril, apenas 43,6% foram renovados, a menor taxa desde março de 2016. No caso dos papéis de longo prazo, a rolagem foi de apenas 10%. A diminuição desse tipo de operação contribuiu para engrossar o saldo das saídas líquidas dos investimentos estrangeiros no mês, o que acabou tendo impacto no resultado das contas externas, negativo em US$ 62 milhões. O déficit não é exorbitante, mas contrariou as expectativas de ligeiro superávit e acendeu um sinal amarelo, que merece ser acompanhado.
O Banco Central (BC) minimiza o acontecimento, argumentando que as emissões externas são voláteis e dependem das necessidades de financiamento das empresas e da avaliação das condições de captação em termos de prazos e custos. No entanto, a tendência já era visível em março. Naquele mês, a taxa de rolagem foi de apenas 45% dos empréstimos e financiamentos de longo prazo. No quadrimestre, a taxa de rolagem dos empréstimos e títulos como bônus e "commercial papers" ficou em 40%. Incluindo os empréstimos diretos, a renovação subiu para 54%, bem abaixo dos 100% previsto pelo Banco Central para o fechamento do ano. Há um ano, a taxa superava os 200%.
Havia a expectativa de que, em maio, o desempenho melhorasse. No entanto, a intensificação da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China azedou o clima para os mercados emergentes e acionou uma onda de resgates de investimentos em ações e bônus nesses mercados. Levantamento do Institute of International Finance (IIF), citado pelo Financial Times (30/5), dá conta de que o capital estrangeiro deixou os mercados emergentes a um ritmo de mais de US$ 5 bilhões por semana desde que o presidente americano Donald Trump endureceu as ameaças contra as importações chinesas, há quase um mês. Cresceu a aversão a riscos e caiu de papéis da dívida de empresas que não têm grau de investimento.
A demanda mais fraca por recursos também estaria influenciando esses números baixos de renovação de empréstimos e emissões externas. Desanimadas com a fraqueza da economia doméstica, refletida na queda de 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, e com o elevado desemprego e o consumo contido, as empresas estariam postergando seus planos de investimento e, consequentemente, a demanda por recursos. Nem mesmo as condições atualmente vantajosas em taxas e prazos do crédito doméstico estariam animando os tomadores (O Globo 3/6). Pelo mesmo motivo, as emissões de debêntures somaram R$ 29,1 bilhões de janeiro a abril, segundo informações da Anbima, registrando queda de 37% na comparação com o mesmo período de 2019.
A redução das aplicações estrangeiras em títulos de empresas brasileiras contrasta com o fluxo de investimentos diretos no país (IDP), que segue forte e cobre com folga o déficit em conta corrente. Em abril, o IDP totalizou US$ 6,957 bilhões, acima do projetado. No acumulado em 12 meses, essa conta chegou a US$ 92,5 bilhões, o equivalente a 4,96% do PIB. A previsão do Banco Central é que feche o ano em US$ 90 bilhões. Já o déficit em conta corrente, que compreende as trocas comerciais, de serviços e de renda, acumulado em US$ 13,7 bilhões em 12 meses, manteve o patamar do mês anterior, igual a 0,73% do PIB. O Banco Central revisou para baixo a previsão para o ano de déficit de US$ 35,6 bilhões para US$ 30,8 bilhões, ou 1,8% do PIB, o dobro dos US$ 14,5 bilhões de 2018.
A revisão para baixo do déficit se deve a gastos com viagens mais contidos, em consequência da elevação do dólar, e à diminuição das importações por conta da demanda fraca. São fatores não propriamente positivos, mas que contribuem para que as contas externas fiquem sob controle. Não se pode esquecer que esse é um dos fatores que ajudam na avaliação do país, ao lado do câmbio flutuante e das reservas internacionais robustas, contrabalançando a apreensão com a fragilidade das finanças públicas e o déficit público elevado, além das turbulências políticas e dos solavancos no andamento das reformas estruturais.
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