- O Globo
Houve de tudo. Principalmente, um inexplicável desvio do endereço (IP) de 350 máquinas
A liquefação institucional da Bolívia marca uma inflexão na biografia de dois influentes diplomatas latinos, cujas carreiras foram construídas na intimidade de governos de esquerda.
Um deles é Carlos Zamora, 76 anos, ex-embaixador de Cuba no Brasil nos governos Lula e Dilma. Ele atravessou os últimos 45 anos em cargos relevantes da chancelaria, incluindo a seção Estados Unidos e a embaixada na ONU.
“El Gallo” Zamora, coronel da Direção Geral de Inteligência de Cuba, chegou a La Paz em março, com a mulher Maura Isabel, também oficial da DGI. Virou conselheiro de Evo Morales. De “El Gallo”, porém, jamais se ouviu um canto no Palácio Quemado — ele apenas sussurrava nos ouvidos do presidente.
No páreo estava outro diplomata, o uruguaio Luis Almagro, 56 anos, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos. Emergira como chanceler do governo José Mujica, com quem rompeu ao qualificar a cleptocracia da Venezuela como ditadura (“Te digo adeus”, escreveu-lhe Mujica). Acabou expulso da Frente Ampla, ao admitir intervenção militar externa para remover o ditador Nicolás Maduro. Retrucou, reconhecendo o oposicionista Juan Guaidó como presidente “interino” da Venezuela. Passou a ser visto como agente americano.
Almagro incorporou Evo ao próprio plano de reeleição na OEA, no ano que vem, e até reconheceu-lhe a candidatura ao quarto mandato como “direito humano”, embora a Constituição boliviana proíba. Mas tropeçou em “El Gallo”. Desde então, responsabiliza Cuba e Venezuela por agitações na América do Sul.
No domingo, avalizou a auditoria da OEA dissecando a fraude montada para eleger Evo. Houve de tudo. Principalmente, um inexplicável desvio do endereço (IP) de 350 máquinas do tribunal eleitoral para processamento de votos num servidor externo, ainda desconhecido. “As manipulações são de tal magnitude que devem ser profundamente investigadas”, diz a OEA.
Em La Paz há quem considere o hackeamento similar aos percebidos em eleições na Venezuela, supostamente sob supervisão cubana. Sem provas, condimenta-se o imaginário da espionagem, com Almagro e “El Gallo” Zamora como protagonistas.
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