Conversas
inadequadas entre juiz e promotores, intimidade entre políticos e empresas são
tão comuns quanto reprováveis
Graças
ao ministro Ricardo
Lewandowski, do STF, tem-se agora acesso ao registro das
conversas privadas —e tóxicas— do então juiz Sergio Moro com procuradores da
Operação Lava Jato quando se instruía a denúncia contra o ex-presidente Lula.
As 50 páginas de transcrições desvendam uma relação mais do que imprópria entre
um magistrado, que deveria primar pela isenção, e os membros do Ministério
Público responsáveis pelas alegações que justificassem transformar o líder do
PT em réu no célebre caso do tríplex do Guarujá.
Advogados relatam que conversas inadequadas entre juiz e promotores durante o processo de instrução são tão comuns quanto reprováveis, pois se dão sempre em prejuízo do acusado. Mas, além de inaceitável do ponto de vista ético, o escambo entre Moro e os acusadores de Curitiba produziu um resultado politicamente letal: excluiu do jogo, na marra, o candidato que, goste-se disso ou não, detinha àquela altura a preferência dos eleitores, constatada nas pesquisas.
Aos
que se debruçarem sobre o texto agora liberado --ou o seu resumo na imprensa--
recomenda-se fortemente a leitura de "A
Organização", da competente jornalista Malu Gaspar.
Melhor
livro brasileiro de análise política publicado no ano passado, ali está a
narrativa da irresistível ascensão da Odebrecht no negócio da construção
pesada, à sombra de todos os governos democráticos desde meados de 1980.
As
relações de intimidade da empresa com os líderes do PT e de outros partidos que
compartilhavam o poder, descritas em sua crueza, são o centro do exemplo
notável do que a literatura especializada chama de "rent seeking", a
busca de ganhos privilegiados, em tradução livre. Ou seja, a obtenção por
empresas privadas de lucros à margem da competição no mercado --graças a
ligações espúrias com líderes políticos e agentes públicos de alto escalão.
A
amizade entre dois presidentes —o da Odebrecht e o da República— e um
sofisticado esquema de financiamento arquitetado pela empresa sob o elegante
codinome "Departamento de Operações Estruturadas" tornaram possíveis
tanto a expansão dos contratos públicos da construtora quanto o financiamento,
via caixa dois, de expoentes de partidos governistas.
Revelada
pela Lava Jato, a trama de relações perigosas em torno da Petrobras desnudou o
mecanismo do "rent seeking", tão corriqueiro como venenoso para a
democracia.
Talvez a prática não possa ser de todo eliminada. Resta, por isso mesmo, encontrar formas de reduzir a sua radioatividade política, sem atropelar as boas condutas jurídicas. Eis o desafio permanente para os democratas.
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