João
Goulart escreve a Jair para contar sua experiência: "Porque ambos sentamos
na mesma cadeira"
Presidente,
Faz tempo, no dia
de hoje, eu estava num aviãozinho Cessna pilotado pelo Maneco Leães, voando de
minhas terras para Montevidéu. Pousamos, pedi asilo e só voltei ao Brasil em
1976, morto.
Escrevo-lhe
porque vi que o senhor já falou em estado de sítio, um deputado da sua copa
tentou aprovar uma medida parecida e há no seu pelotão o interesse de montar um
dispositivo militar.
Não tenho
simpatia por vossa figura e sei que a recíproca é verdadeira. Mesmo assim,
escrevo-lhe para contar minha experiência, porque ambos sentamos na mesma
cadeira.
Estado de sítio,
eu também tentei, em outubro de 1963. Parecia boa ideia, e a Central
Intelligence Agency disse ao presidente John Kennedy que o comandante do
Exército e “a maioria dos militares provavelmente apoiariam as medidas fortes”.
Estávamos enganados, a proposta do estado sítio naufragou e tive que retirá-la.
Dias depois, empossei na chefia da Casa Militar o general Assis Brasil. Desde o primeiro momento, ele se dedicou a montar um dispositivo de apoio militar ao governo. Como ele trabalhava no palácio, era o único general que eu via todos os dias. Considerava seu dispositivo “imbatível”. No início de março de 1964, ele dizia que seu esquema “se não é perfeito, é pelo menos o melhor de quantos já se armaram neste país”.
No dia 30, o
Tancredo Neves não queria que eu fosse à reunião de sargentos do Automóvel
Clube, mas o general disse que eu devia ir. Quando o Mourão Filho se rebelou, o
Assis Brasil achou que dominava a situação. Fomos juntos para Brasília, e de lá
para Porto Alegre. Aos poucos, nos demos conta da gravidade da situação. O
dispositivo do general só existia na cabeça dele. Na madrugada do dia 2 de
abril, eu estava deposto. Para não ser preso, fui para São Borja, e o general
voou comigo. Seguimos para um rancho perdido nas margens do rio Uruguai. Lá eu
cozinhei um ensopadinho de charque com mandioca. No dia seguinte, há exatos 57
anos, voamos com o Maneco para Montevidéu.
Depois
desembarcamos, ele me disse:
“Sou soldado e
tenho de me apresentar. Não quero ser considerado um desertor. Vou avisar ao
ministro da Guerra que vou voltar”.
O Assis Brasil
voltou, ficou preso por três meses. Tempos depois, cassado, ele foi me visitar
em Montevidéu, mas a Maria Tereza destratou-o e ele foi embora.
Outro dia, no
churrasco de aniversário do Getúlio Vargas, o general Golbery me contou que, em
1980, quando estava na chefia da Casa Civil, recebeu uma carta do Assis Brasil
pedindo a transferência de um amigo para Porto Alegre. Foi atendido.
Eu nunca tentei
entender como o general do meu palácio armou aquele dispositivo “imbatível”,
mas acho que o senhor não deve pensar nesse tipo de armação. Eu aprendi que
quanto mais perto do presidente uma pessoa está, mais longe da realidade ela
vive.
Respeitosamente,
João Goulart
Esperança
O general Braga
Netto aceitou o Ministério da Defesa com uma frase:
“Missão dada,
missão cumprida.”
Faria melhor se
dissesse “missão dada, missão aceita”.
Grandes generais
aceitaram missões e foram batidos.
Fritando,
fritaram-se
O serpentário do
Planalto aprendeu uma lição. Durante dois dias, fez circular a fofoca segundo a
qual o general Fernando Azevedo havia sido demitido porque havia defendido seu
colega Paulo Sérgio.
O chefe do
Departamento Geral do Pessoal havia dado uma entrevista ao repórter Renato
Souza mostrando a boa qualidade da prevenção sanitária praticada no Exército:
uma letalidade de 0,13% na tropa, contra 2,5% no país.
Era pura
malvadeza. O general só havia mostrado que no seu quadrado as coisas
funcionavam.
Na quinta-feira,
Bolsonaro nomeou o general para o comando do Exército.
Na fila
O doutor Ricardo
Salles esteve perto da frigideira, mas escapou.
Ficou com nova data
de validade, e ela expira no dia 1º de novembro. Essa é a data da abertura da
conferência das Nações Unidas para discutir mudanças climáticas, a ser
realizada em Glasgow, na Escócia.
Com Salles no
Ministério do Meio Ambiente, qualquer esforço para reduzir a queimada da imagem
do Brasil será mero exercício de enxugamento de gelo.
Frick collection
O acervo da Frick
Collection, de Nova York, mudou-se temporariamente para o prédio modernoso que
abrigou o Whitney Museum. Um desastre. O exibicionismo arquitetônico abafou o
ar doméstico que a casa do milionário Henry Frick oferecia.
A Frick era o
museu onde Paulo Francis se abrigava na caminhada até o Metropolitan, depois de
almoçar no Bravo Gianni. No inverno, aquecia-se. No verão, refrescava-se.
Em tempos de pandemia,
a Frick oferece um site de alta qualidade para visitas virtuais. Além disso,
toda sexta-feira tem palestras com um curador falando de uma peça. Está no ar
uma apresentação do monumental autorretrato de Rembrandt.
(Infelizmente, em inglês, felizmente, com a
opção de legendas.)
Retrato de uma
elite
A elite mineira
já deu ao Brasil os inconfidentes do século XVIII e os signatários do manifesto
contra a ditadura do Estado Novo, em 1943. Com a pandemia, a repórter Thais
Bilenky mostrou que uma patota foi arrebanhada para uma garagem dos empresários
de transporte Robson e Rômulo Lessa, transformada em posto clandestino de
vacinação.
Os maganos
pagavam R$ 600 pelo imunizante, e a Polícia Federal acha que o fármaco era
falso. Bem feito.
Guedes, Maia e
Lira
O doutor Paulo
Guedes precisa revisitar a origem de suas dificuldades com o deputado Rodrigo
Maia enquanto ele presidiu a Câmara.
Se fizer isso
direito, evitará encrencas com Arthur Lira.
O modelo Biden
Joe Biden entrou
na Casa Branca em janeiro. Prometeu vacinas e entregou. Anunciou um auxílio
emergencial e entregou. Apresentou um projeto de reconstrução da infraestrutura
do país e talvez entregue.
Até aí, seria
apenas um reflexo da qualidade da máquina administrativa americana.
A grande
diferença entre o atual presidente, o doidivanas que o antecedeu e alguns
similares espalhados mundo afora está em outro lugar: Biden não se meteu em
brigas inúteis e despropositadas.
Aviso chinês
Com a devida
discrição, sem deixar rastro nas formalidades diplomáticas, a China avisou ao
governo brasileiro que, enquanto Ernesto Araújo estivesse no Itamaraty, seria
impossível evitar o aparecimento de entraves burocráticos no fornecimento de
vacinas.
Estatística
Quem está na
linha de frente do combate à Covid sabe há semanas que abril será o pior mês da
pandemia.
Com a média móvel
passando dos três mil mortos por dia, vale lembrar que no dia 6 de junho de
1944, quando os Aliados desembarcaram na Normandia, o número de mortos ficou em
4.414.
A “gripezinha” estava no “finzinho”, e a segunda onda era “conversinha”.
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