Quanto
mais crimes de responsabilidade o presidente comete, mais nos acostumamos com a
situação
Atribui-se
a Eubulides de Mileto o paradoxo do monte (“sorítes”). Um grão de areia
obviamente não constitui um monte. Se eu adicionar um segundo grão ao primeiro,
ainda não tenho um monte. Nem com um terceiro. Mas, se eu continuar com esse
processo, em algum momento eu chegarei lá. De quantos grãos eu preciso para
fazer um monte?
Filósofos, matemáticos e linguistas estão há 2.500 anos propondo soluções engenhosas para paradoxos como os de Eubulides, que fazem recurso à indeterminação ou à vagueza dos termos. Numa delas, a filósofa Diana Raffman traz a noção de histerese e sustenta que os limites em que os termos serão usados são elásticos e se relacionam com a história dos objetos.
Assim,
se um objeto já era reconhecido por todos como um “monte de areia”, poderá
continuar a ser chamado de monte mesmo que perca uma quantidade de grãos que,
fosse outro o objeto, levaria a um rebaixamento de monte para pilha.
Vincular
a categoria à história, porém, pode ser diabólico quando lidamos com questões
institucionais. É mais ou menos o que estamos presenciando. Quanto mais crimes
de responsabilidade Bolsonaro comete, mais nos acostumamos com a situação e
mais difícil fica estabelecer que ele já excedeu o limite que exige uma ação.
Em suma, quanto mais ele viola a lei, menor a possibilidade de que venha a ser
punido —o que nos leva a uma outra família de paradoxos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário