sexta-feira, 22 de abril de 2022

Maria Cristina Fernandes: Por que a terceira via “descobriu” o pedetista agora

Valor Econômico

Ciro é carta na manga para negociar com Lula

Apesar de estar desde o ano passado na estrada com sua pré-candidatura pelo PDT à Presidência da República, só agora o ex-ministro Ciro Gomes virou a bola da vez na terceira via. Todo o movimento dos pré-candidatos da terceira via dava-se à revelia dele, que, depois da inviabilidade da candidatura de Sergio Moro, é o único que se aproxima dos dois dígitos.

Ciro virou o eixo do pessoal da terceira via da noite para o dia. Já encontrou o pessoal do União Brasil e vai conversar com Gilberto Kassab. Em sabatina do “UOL” e da “Folha de S.Paulo” confirmou o encontro com o presidente do PSD sem precisar a data.

Ciro elogiou a pré-candidata do MDB, Simone Tebet, e tem no senador Tasso Jereissati seu principal aliado no PSDB. Já disse que senta pra conversar com todos da terceira via, só não fazia com Sergio Moro quando o ex-juiz estava na roda.

O que está por trás desse assédio não é a viabilidade eleitoral do pré-candidato do PDT. Ciro não vai tão mal nas pesquisas, tem um eleitorado cativo, de ciristas militantes mesmo, é muito ativo nas redes sociais e atento à dinâmica da linguagem. Durante a sabatina escapou da pergunta sobre aborto (“não é tema do Executivo”) argumentando que o bolsonarismo faria uso distorcido de qualquer trecho de sua fala e isso se voltaria contra si.

Mas não é nada disso que explica o assédio recente da terceira via sobre Ciro. Este assédio acontece num momento em que as campanhas dos dois principais candidatos, e, principalmente, do candidato do PT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está em meio à negociação de palanques estaduais, da equipe de campanha e distribuição de tarefas-chave como a interlocução com empresariado e a formulação da política econômica.

Muitos desses políticos que assediam Ciro neste momento o fazem para ter uma carta na manga para negociar com Lula. Estão em disputa com o PT, seja pela cabeça de chapa ou pela vaga de vice num Estado, seja pela vaga de senador em outro Estado. E aí, na tentativa de obter um palanque mais favorável, tentam mostrar que têm uma alternativa a Lula.

O caso mais gritante talvez seja o MDB, partido que é adversário histórico dos Gomes no Ceará e cujas principais lideranças têm sido alvejadas por Ciro Gomes desde o primeiro governo petista. Parece crível que o partido não forme maioria em torno da pré-candidatura da senadora Simone Tebet (MS) por força dos lulistas do partido. Mas daí que isso resulte num acordo com o pré-candidato do PDT vai uma distância gigante.

A mesma lógica se dá em relação aos postos-chave da campanha. Esses candidatos a aliados de Lula já viram que não adianta mais dizer que o PT precisa ampliar buscando outras forças políticas. O discurso do vice de Lula, Geraldo Alckmin, no encontro com sindicalistas foi um exemplo. Lula foi buscar Alckmin para que o ex-tucano levasse seu eleitor para seu palanque, mas o discurso de Alckmin, rouco de tão estridente e cheio de elogios a Lula, pode ter melhorado sua imagem junto aos sindicalistas, mas não parece ser muito eficiente para levar seu eleitor a apoiar o petista.

Enfim, essa resistência do PT à ampliação da candidatura Lula agora vai enfrentar essa investida da terceira via sobre Ciro. É uma chantagem comum em tempos de campanha eleitoral. Dura quanto tempo o blefe? Bem, talvez tenha vida curta, mas enquanto durar pode causar avarias numa campanha, como a petista, cuja demora na definição da estratégia eleitoral favorece o avanço de potenciais aliados que, no cumprimento das regras do jogo, portam-se como adversários.

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