O Globo
Um dos maiores problemas no surgimento de
uma ou mais candidaturas competitivas para enfrentar Lula e Jair Bolsonaro,
além da falta de um projeto, é o total desinteresse das cúpulas partidárias em
viabilizar qualquer nome.
Essa evidência fica mais clara a cada dia.
Os discursos de que “temos de fazer frente à polarização”, ou “nem um nem
outro” são para enganar eleitores e pré-candidatos incautos.
Nunca antes numa disputa presidencial houve
tamanha inapetência por parte de legendas em chegar ao poder nacional. Isso
diante do pior governo já eleito na História da República, que deveria gerar em
todos um sentido (real, não teatral) de urgência para resgatar o Brasil do
buraco.
O retrospecto recente em países que se
transformaram em autocracias mostra que, a partir da primeira recondução de
governantes autoritários, as instituições sofrem corrosão ainda mais severa, e
os mecanismos para proteger direitos e garantir a alternância de poder vão
sendo subvertidos.
Bolsonaro, se reeleito, terá a
possibilidade de indicar dois ministros do Supremo Tribunal Federal no primeiro
ano do segundo mandato. Apenas isso deveria ser razão para mobilizar
genuinamente o sentido de responsabilidade dos democratas de todas as cores
partidárias.
Mas nossos caciques políticos se apequenaram de tal maneira que, hoje, estão mais ocupados com o jogo miúdo da montagem das nominatas, as chapas que assegurarão maiores ou menores bancadas na Câmara.
O único raciocínio político vigente é o
monetário: quanto mais deputados federais, mais dinheiro dos fundos eleitoral e
partidário. Com bancadas maiores, maior acesso também a nacos do Orçamento,
sobretudo às saborosas emendas do relator, que chegam fácil e quase
anonimamente à base do parlamentar. Nesse jogo da política do “faz um Pix”, a
Presidência da República é tratada como acessório.
O conchavo da ala do MDB próxima a Lula
parte desta lógica: rifar a pré-candidata da própria legenda, a senadora Simone
Tebet, quanto antes, para que ela não gaste o rico dinheirinho do fundão com
uma candidatura que eles, os homens que mandam no cartório, não pretendem
defender.
Eles até dizem se preocupar com Bolsonaro,
mas o que querem é um caminho fácil para voltar a apitar no poder, algo que
vislumbram com o PT.
Viabilizar um projeto próprio? Isso nunca
foi prioridade no MDB, e mesmo o mandato incidental de Michel Temer não contou
com a simpatia imediata dos comensais do jantar com Lula.
No PSDB, a situação é ainda mais vexatória.
O presidente da sigla, Bruno Araújo, tem dedicado os dias a mandar a João Doria
recados de que o gato das prévias subiu no telhado. A alternativa? O
ex-governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que nas pesquisas tem a
mesma estatura do ex-governador de São Paulo.
De novo, a lógica que vigora não é apostar
no candidato mais viável para se contrapor a Lula e a Bolsonaro, e sim tirar da
frente um pré-candidato, Doria, considerado uma âncora para os poucos
candidatos a governador que o minguado PSDB conseguiu manter.
Nesse jogo, nem as regras do possível
tapetão estão claras. Afinal, qual será o rito para tentar melar as prévias e
fazer prevalecer um outro nome até 18 de maio? E, se o tapete de Simone Tebet
também for puxado pelos coronéis emedebistas, quem é o candidato que esse grupo
de partidos acredita ser viável? Haverá W.O.?
Do outro lado tem, sim, um candidato com
fome e sede de vencer: Ciro Gomes. Mas a recente conferência que reuniu os pré-candidatos
em Boston mostrou quanto é difícil para ele se firmar numa disputa em que seu
primeiro adversário por uma vaga na final é justamente o favorito, Lula, o que
leva a que faça ataques erráticos ora a este, ora a Bolsonaro.
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