Valor Econômico
Atenuação da pandemia e transferência de
recursos para os pobres melhoram a imagem do presidente
O núcleo partidário da candidatura do
presidente Bolsonaro à reeleição - PL, Progressistas, Republicanos, PSC e PTB
-, com 187 deputados federais, tem uma representação na Câmara dos Deputados
muito maior do que a da esquerda e da centro-esquerda - PV, Rede, PSB, PDT, PT,
PC do B e PSOL, com 117 representantes. Ademais, Patriota, Novo, Avante,
Podemos, PROS, União Brasil, PSD, Solidariedade, MDB, PSDB e Cidadania, com
votações altas a favor das propostas do governo Bolsonaro, contam com 209
deputados.
A construção por Bolsonaro de uma ampla base de apoio no Congresso, mantidas as atuais representações, seria muito mais simples do que para Lula. Bastaria atrair o apoio integral dos partidos do seu núcleo de apoio, 85% dos deputados do Patriota, Novo, Avante, Podemos, PROS, União Brasil, PSD e Solidariedade e 65% dos representantes do MDB, PSDB e Cidadania para Bolsonaro obter uma maioria próxima a 350 votos, mais do que o suficiente para aprovar emendas à Constituição.
O forte crescimento dos partidos que mais
suportam o presidente após a janela partidária contribuirá para que as
intenções de voto de Bolsonaro aumentem e a sua rejeição diminua nos próximos
meses. A atenuação da pandemia e a maior transferência de recursos para a
população pobre e a classe média também serão importantes para essa melhoria.
O governo anunciou, por exemplo, a
duplicação do Auxílio Brasil para R$ 400, a concessão do vale gás de R$ 52, o
saque de até R$ 1 mil do FGTS, a antecipação do 13º salário para os aposentados
e a redução de IPI e de tributos sobre combustíveis. Além disso, há diversas
medidas em discussão no Congresso e no Executivo, como: gratuidade de
transporte público para idosos, aumento do piso salarial para enfermagem,
concessão de quinquênios para o Judiciário e reajustes salariais para
servidores federais.
Apesar dessa tendência, a vitória de
Bolsonaro nas eleições de 2022 não é o cenário mais realista no momento:
A manutenção após as eleições da favorável
distribuição de partidos obtida com a janela partidária é improvável, ainda
mais com a cláusula de barreira. Os partidos precisarão de mais de 2% dos votos
válidos ou eleger ao menos 11 deputados federais em pelo menos nove estados nas
eleições de 2022 para ter acesso, entre outros direitos, ao tempo de propaganda
eleitoral, aos recursos do fundo partidário e às posições na mesa diretora e em
comissões. A dificuldade de alcançar essas metas pode contribuir para o recuo
do número de partidos com representação plena no Congresso para cerca de 10
agremiações a partir de 2023.
Mesmo diminuindo nos próximos meses frente
aos atuais 46% (Datafolha - 7/4/ 2022), a avaliação ruim e péssima de Bolsonaro
não diminuirá para os 25% ou menos de FHC, Lula ou Dilma quando da disputa pela
reeleição. Do mesmo modo, apesar de ter melhorado frente aos 60% de dezembro
(Datafolha - 16/12/2021), o percentual dos participantes que não confia nas declarações
de Bolsonaro de 53% (Datafolha - 23/3/2022) não retornará para os 38% do início
da pandemia (Datafolha - 27/4/2021).
Como dificilmente obterá uma votação
próxima de 46% do 1º turno das eleições de 2018, Bolsonaro não terá o mesmo
apoio na campanha eleitoral de senadores, deputados federais e governadores
como naquela época. O afastamento em relação à campanha de Bolsonaro por parte
de candidatos aos governos do Nordeste, como ACM Neto (BA), Miguel Coelho (PE),
Rodrigo Cunha (AL) e Silvio Mendes (PI), por exemplo, atrapalha a recuperação
das intenções de voto do presidente.
Os resultados econômicos permanecerão
desfavoráveis até outubro - inflação próxima a 8%, taxa de desemprego acima de
10% e crescimento do PIB inferior a 1% em 2022, o que dificultará a melhoria da
avaliação do presidente para próximo à da eleição de 2018.
Por outro lado, uma aliança da esquerda e
da centro-esquerda com todos os representantes do Patriota, Novo, Avante,
Podemos, PROS, União Brasil, PSD, Solidariedade, MDB, PSDB e Cidadania, o que é
uma hipótese muito improvável, totalizaria 326 deputados. A aprovação de
emendas à Constituição exigiria o impensável apoio de 95% de todos os deputados
dessa aliança para não depender da oposição. Essa fragilidade será atenuada
pelo provável aumento da representação do PT e de partidos de esquerda e de
centro-esquerda em função de a candidatura presidencial do PT ser mais
competitiva e a rejeição a Bolsonaro ser maior do que quatro anos atrás.
Na eventualidade de vitória de Lula, a
formação de uma base de apoio de 400 deputados federais exigiria a atração de
partidos de direita e de centro-direita, inclusive alguns que fazem parte do
núcleo do atual governo. Não seria fácil, mas também não parece uma missão
impossível. Muitos dos partidos que hoje apoiam Bolsonaro participariam sem
constrangimento de um governo Lula.
É fácil desenhar esse governo no papel. A
aliança defenderia um programa moderado sem extremos na pauta econômica e na de
costumes, bem como sem as medidas controversas do seu grupo mais à esquerda. A
apresentação de projetos de combate à pobreza e de melhoria das condições de
vida dos mais pobres é bastante factível sem a ampliação dos desequilíbrios
macroeconômicos. Uma forte expansão de programas sociais de forma sustentável
exigiria, porém, que os congressistas fossem convencidos da necessidade de
contrapartida, incluindo a redução de renúncias tributárias, para garantir a
estabilidade ou mesmo o recuo da dívida pública.
Tirar esse arcabouço do papel, por outro
lado, é mais complicado, pois exige que Lula seja convencido de que é preciso
promover mudanças difíceis. Por ora, não parece que a maioria dos líderes
partidários entendam essa necessidade. Apesar de haver filiados ao Partido dos
Trabalhadores conscientes de que sinalizar um projeto que resulte em
desequilíbrio fiscal por um período prolongado agrega riscos muito negativos,
há grupos que julgam ser possível elevar os gastos e manter um elevado déficit
primário por um longo período.
Apesar de não ser fácil convencer a maioria
sobre o caminho certo a trilhar, é preciso tentar.
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