quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Nilson Teixeira* - Avanços no governo Lula

Valor Econômico

O ano foi de conquistas, mas pessimismo de parte da sociedade é compreensível por haver muito a corrigir

O desempenho da economia brasileira neste ano foi mais favorável do que o previsto por especialistas e participantes de mercado. A mediana das projeções de crescimento do PIB em 2023, após alcançar 0,8% - mínimo de -0,4% e máximo de 2,1% - na pesquisa de 30 de dezembro de 2022 do Banco Central (BC), aumentou para 2,8% mais recentemente. As condições do mercado de trabalho também se mostraram mais benignas. A mediana das projeções para a taxa de desemprego para 2023 diminuiu de 8,9% no fim de 2022, frente aos 8,0% de 2022, para os atuais 7,7%, com vários setores, como a construção civil em São Paulo, reportando falta de mão-de-obra aos atuais salários. Do mesmo modo, a dinâmica da inflação foi mais favorável a partir de meados deste ano. Após aumentar de 5,3% no fim de 2022 para 6,1% no início de maio, a mediana das previsões de inflação IPCA para 2023 recuou para 4,5% na última semana - dentro do intervalo de tolerância, após dois anos sem seu cumprimento.

Esse melhor desempenho da economia é atestado pelo comportamento dos preços de mercado. A taxa Selic terminará o ano em 11,75%, abaixo da projeção de 12,50% no início deste ano. Da mesma forma, a taxa de câmbio projetada para o fim de dezembro era de R$ 5,27/US$ no fim de 2022, nível mais depreciado do que a cotação de R$ 4,90/US$ da última 2ª feira. No que se refere ao mercado de ações, especialistas projetavam no fim de 2022 que o Ibovespa aumentaria dos 108 mil pontos da média de dezembro de 2022 para 130 mil pontos no fim de 2023, não muito distante dos 125 mil pontos da 2ª feira.

Apesar do frequente discurso na imprensa sobre a descrença na atuação do governo, as expectativas para o próximo ano são mais favoráveis do que os prognósticos existentes no fim de 2022 para a economia em 2023. O consenso de mercado para 2024 assume crescimento do PIB de 1,5%, taxa de desemprego de 8,2% e inflação IPCA de 3,9% - dentro do intervalo de tolerância, mas distante do centro da meta de 3,0%. Há de se reconhecer, porém, que a confiança nesse cenário mais favorável para 2024 ainda é frágil, pois não há informação suficiente para garantir projeções robustas.

A atuação do governo Lula neste seu 1º ano afastou cenários mais extremos, contribuindo para a melhoria da confiança. Por exemplo, havia receio de que fossem adotadas políticas muito intervencionistas e até revanchistas. Não foi o caso. Apesar de alguns discursos mais inflamados e posicionamentos questionáveis no governo, as novas gestões das estatais, notadamente da Petrobras, afastaram os cenários caóticos previstos por alguns. Embora ainda haja defensores da maior intervenção do estado na economia e da interrupção do programa de desestatização, o discurso mais radical de alguns apoiadores do atual governo a favor da reversão da transferência do controle da Eletrobras e da Braskem se mostrou, por ora, muito mais um risco distante do que algo provável. Do mesmo modo, apesar das críticas do presidente Lula ao patamar dos juros, bem como à autonomia formal do BC e ao mandato fixo de seus diretores, a atuação da instituição não foi efetivamente maculada.

Após meses de incerteza sobre a dinâmica dos números fiscais, a aprovação do arcabouço fiscal em agosto deste ano trouxe maior confiança de que o cenário de descontrole das contas públicas está afastado. Mesmo com a expectativa de déficit primário nos próximos anos e o debate nas últimas semanas sobre a possível mudança da meta para 2024, especialistas ainda esperam que a dívida pública se estabilize antes do fim desta década, com seu posterior recuo. A expectativa de gradual recuo da Selic nos próximos anos para 8,50% sugere essa leitura.

A despeito da sua tramitação lenta, bem como de mudanças que introduziram injustificáveis rebates para mais setores da economia e novos fundos regionais de compensação, a aprovação da Reforma Tributária é vista por inúmeros participantes de mercado como sendo capaz de melhorar muito as condições de negócios e elevar o crescimento potencial. Isso justifica uma melhora de sentimento na sociedade.

Esse efeito advém também da recuperação nas relações exteriores com maior participação nos fóruns internacionais - apesar de alguns discursos e posicionamentos controversos de membros do governo, da adoção de políticas de maior respeito à diversidade e dos esforços para a preservação do meio-ambiente. A atenuação do risco de crise institucional, após a posse do governo Lula e o fim dos conflitos entre o Executivo e o Judiciário, embora ainda com rusgas entre membros do Legislativo e do Judiciário, é outra frente que favorece a confiança para 2024.

Ainda que o seu efeito na economia seja reduzido no curto prazo, o melhor ambiente também pode ser atribuído à expansão no atendimento das camadas mais vulneráveis da população, com a elevação dos benefícios do Bolsa Família e a atualização do Cadastro Único necessário para a incorporação de outros serviços sociais ao atendimento desse público. Mesmo com avanços pouco visíveis frente aos imensos obstáculos, a boa reputação da gestão das áreas da educação e da saúde traz esperança de aprimoramento da qualidade do ensino, redução das defasagens de aprendizado herdadas da época da pandemia, melhoria do atendimento de saúde pública e recuperação dos programas de vacinação.

Em suma, o 1º ano do 3º governo Lula foi marcado por conquistas, inclusive no campo econômico, com avanços em várias frentes. Todavia, por haver muito a ser corrigido, é compreensível que uma parte relevante da sociedade esteja pessimista. A economia requer profundos ajustes estruturais, mas que ainda carecem de apoio da maioria da sociedade e dos líderes políticos no Executivo e no Legislativo. Da mesma forma, a qualidade dos programas sociais e dos serviços públicos ainda é deficiente e precisa melhorar. Para complementar esta discussão, o meu próximo texto tratará das dificuldades enfrentadas em 2023 na busca de uma economia mais próspera e menos desigual.

*Nilson Teixeira, Ph.D. em economia.

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