Luis Felipe Azevedo / O Globo
Autor de obras importantes da Sociologia brasileira, se exilou durante a ditadura e ajudou a redigir o programa político do MDB
Morreu nesta
quarta-feira o cientista social Luiz Werneck Vianna, aos 86 anos, no Rio de
Janeiro. O intelectual era professor da PUC-Rio e publicou livros considerados
fundamentais para a sociologia brasileira, como “Liberalismo e sindicato no
Brasil” (1976) e “A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil”
(1997).
O cientista social
estava internado no Hospital Copa D'Or. Em nota, a unidade de saúde lamentou a
morte do paciente.
"O Hospital
Copa D’Or lamenta profundamente a morte do paciente Luiz Jorge Werneck Vianna
na tarde desta quarta-feira (21). O hospital se solidariza com a família e
amigos por essa irreparável perda, também informa que não tem autorização para
divulgar mais detalhes."
Nascido em 1938 no
Rio, Vianna foi criado no bairro de Ipanema, na zona sul da cidade. A
trajetória em escolas de elite contou com percalços. Ele chegou a ser expulso
de uma instituição devido à denúncia de pais por receio de possível “influência
comunista”.
Amante da
literatura, o afinco por livros era observado desde a juventude. Monteiro
Lobato, Eça de Queiroz, Fiódor Dostoiévski e Miguel de Cervantes são exemplos
de autores que influenciaram a inclinação de Vianna pelos valores humanistas
que perpassam sua carreira.
Ele ingressou na faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara (atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ) em 1958. Dois anos depois, Vianna passou a fazer parte do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Quando iniciou a
graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), m 1964, o golpe civil-militar ocorreu no país. Na época, Vianna era
envolvido em movimentos esquerdistas e teve destacada sua atuação no Centro
Popular de Cultura (CPC), instituição criada em 1962 por intelectuais de
esquerda em associação com a União Nacional dos Estudantes (UNE).
Posteriormente,
intelectual ingressou na primeira turma de mestrado do Instituto Universitário
de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Entretanto, ele teve a trajetória
acadêmica interrompida pela perseguição sofrida pelo regime. Vianna chegou a
responder cinco inquéritos policiais-militares e partiu para o exílio no Chile
em 1970.
Vianna retornou ao
Brasil no ano seguinte e foi detido por seis meses. Ao sair da cadeia, iniciou
doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e passou a
trabalhar no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP).
O intelectual
continuou a integrar o PCB e participava um grupo de intelectuais que se
dedicavam ao estudo da obra de Karl Marx. Em 1974, ele chegou a realizar um
curso teórico na “Escola de Quadros” com Anastacio Mansilla, referência teórica
dentro do Partido Comunista soviético à época.
No mesmo ano, o
sociólogo redigiu com outros intelectuais o programa político do Movimento
Democrático Brasileiro (MDB) – único partido legalmente instituído à época de
oposição ao regime ditatorial. Intitulada “Liberalismo e sindicato no Brasil”,
sua tese de doutorado foi defendida em 1976 e consolidou-se como um clássico de
interpretação sociológica do Brasil.
Por três décadas,
ele foi professor do IUPERJ e presidiu por dois a Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS). Vianna era professor do
Departamento de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro (PUC-Rio).
Referência no
âmbito da sociologia, o cientista chegou a analisar o cenário do país durante
entrevista ao GLOBO em 2018.
— Temos pela
frente tempos difíceis, sem contar com partidos que nos defendam. Contudo,
ainda temos duas grandes corporações — a dos militares e a dos magistrados —
identificadas com a nossa Carta Constitucional. Enquanto for assim, não há
motivos para maiores preocupações — disse.
Repercussão
O plenário da
Câmara dos Deputados realizou um minuto de silêncio em homenagem ao sociólogo
na noite desta quarta. O ex-deputado federal Roberto Freire (Cidadania)
escreveu na rede social X (antigo Twitter) que a inteligência brasileira
"perde um dos seus mais ilustres representantes".
"Perdi um
velho camarada e amigo. Meu profundo sentimento pelo falecimento do grande
cidadão brasileiro, Luiz Werneck Vianna. Meus pêsames a família e seus amigos e
amigas", escreveu.
O deputado federal
Chico Alencar (PSOL-RJ) afirmou que Vianna espalhou senso de justiça e
"fará falta nesses tempos de tanta indigência intelectual".
A PUC-Rio lamentou
a morte do professor.
"Luiz Werneck
Vianna foi um intelectual de grande relevância para o campo da sociologia e
para a comunidade acadêmica como um todo. Seu legado se estende nas orientações
de muitas gerações, estudos e reflexões sobre a sociedade brasileira, onde deixou
uma marca indelével na história do pensamento social no Brasil", afirmou
em nota.
A ANPOCS
manifestou profundo pesar pelo falecimento de Vianna e ressaltou a gestão dele
como presidente da associação durante o biênio 2003-2004.
"Seu legado intelectual para as Ciências Sociais é inestimável, e seguirá inspirando reflexões sobre o Brasil do passado e do presente. Deixamos nosso abraço solidário e fraterno à família, amigos/as e colegas do Professor Luiz Werneck Vianna", disse em nota.
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