Valor Econômico
É tudo muito novo e a polêmica existe no mundo inteiro; manual de representação sindical antigo não se aplica aqui
Se há uma brecha no eleitor
potencialmente bolsonarista em que o lulismo se empenha em
tentar entrar é o do universo dos motoristas de aplicativos. Não tem
tido muito sucesso: depois de um ano de negociações, o governo conseguiu
apresentar uma proposta de regulamentação do trabalho de transporte de
passageiros, mas não obteve um mínimo consenso necessário para mandar um
projeto em relação aos entregadores.
E o jogo está travado em relação ao que foi enviado ao Congresso. O governo deparou-se com uma oposição parlamentar azeitada e com a constatação que tem muitos grupos organizados de motoristas de Uber que não se sentem representados pelos sindicatos que negociaram a proposta. A urgência regimental na Câmara que o projeto teve que ser retirada.
Este é um meio que tende a se portar contra a
esquerda. Segundo pesquisa recente do Ipec encomendada pelo Instituto
de Tecnologia e Serviços (ITS) do Rio, há cerca de três vezes mais homens do
que mulheres que se declaram nesta atividade e, proporcionalmente, mais gente
da classe B se diz motorista de aplicativo do que da classe C ou D/E.
Renato Meirelles, do Instituto
Locomotiva, identifica nesse meio um trabalhador que preza o individualismo,
que tem uma preocupação especial com a segurança pública, que ingressou na
atividade majoritariamente na última década, tempo de encolhimento das
políticas públicas e que é muito mais sensível ao movimento da economia do que
a qualquer iniciativa governamental. “Quem se sente trabalhador por conta
própria tem perfil mais bolsonarista”, afirma.
É tudo muito novo e a polêmica existe no
mundo inteiro. O manual de representação sindical antigo não se aplica aqui. As
conversas não são em porta de fábrica ou em assembleias, se dão nos grupos de
WhatsApp. Quem se reúne para se manifestar está deixando de faturar. “Não
existe regulação pacífica em parte alguma e em muitos mercados se caminha para
a judicialização”, comenta Fabro Steibel, da ITS.
Lideranças sindicais em gestação procuram
convencer esta categoria que eles estão mais próximos da condição de um
assalariado, lidando com empresas com pendor monopolista, do que da situação de
um empreendedor. Mas muitas vezes não é assim que um jovem paulistano que
passa o dia em cima de uma moto com um celular preso a um suporte próximo do
capacete se sente.
“É uma galera desmobilizada, é muito
complicado. Um motoqueiro chega a tirar R$ 3 mil, R$ 4 mil por mês. Mas ele
esquece que gasta a metade disso ou mais com lanche na rua, celular,
combustível, manutenção e depreciação da moto, seguro, pneu, IPVA,
capacete, baú e por aí vai. Ele acha que ganha muito mais do que realmente
ganha”, disse Edgar “Gringo”, da Associação de Motofretistas de Aplicativos e
Autônomos do Brasil.
Motoristas de Uber estão contra o
projeto enviado fundamentalmente porque querem ser remunerados pelo quilômetro
rodado e não pela hora trabalhada. Os de entrega querem receber pela hora
logada. Em comum, desejam restringir a capacidade das plataformas de gerir a
oferta. Enxergam no empenho do governo na questão não apenas uma motivação
política, mas também econômica: a de ampliar a base de recolhimento do Regime
Geral de Previdência Social (RGPS). O que aliás faz sentido.
Haddad recomenda
Postagem não é um endosso aberto, mas é um
convite à discussão. De maneira dissimulada, pode ser uma forma de lançar uma
proposta sem assumi-la. Chama a atenção a postagem em redes sociais nessa
quinta-feira do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, feita logo cedo às
8h48: “Recomendo este artigo de Bráulio Borges, economista da FGV, sobre a
dinâmica das contas públicas...”. É uma publicação curiosa, porque desde
que se tornou ministro, em 1º de janeiro de 2023, essa é a primeira vez que
Haddad recomenda a leitura do texto de outra pessoa na rede social “X”.
O artigo, publicado no “Observatório de
Política Fiscal” da FGV no dia 19, chama-se “A mudança das metas e o desafio da
sustentabilidade fiscal brasileira”. Não se limita a descrever a dinâmica das
contas públicas. Avança em propostas para o reequilíbrio das contas, que
sofreu um golpe, a seu ver, com o fim da CPMF a partir de 2008.
Entre as medidas defendidas ganha destaque a
de uma nova reforma previdenciária “tanto pelo lado da despesa, como
também da receita”, segundo o texto. O autor esboça o que poderia ser feito.
“Um elemento crucial para conter sua expansão seria a desvinculação do piso
previdenciário (e mesmo de outros benefícios assistenciais, como o BPC) do
salário mínimo nacional”, afirma Borges, para quem “as aposentadorias de veriam
ser reajustadas apenas pela inflação”. O economista sugere ainda ser
“importante implementar, dentre outras coisas, valores de idade mínima de
aposentadoria e tempo mínimo de contribuição que não fossem fixos ao longo do
tempo”.
Borges ainda propõe reduzir a renúncia de
receita do Simples Nacional e do MEI, “bem como promover uma
desoneração horizontal da folha de pagamentos”. Ele cita um trabalho acadêmico
de 2022 que estima que, no Brasil, a tributação sobre a folha já ultrapassou o
ponto de máximo da curva de Laffer (teoria econômica pela qual a arrecadação
começa a cair caso o nível de tributação exceda um determinado ponto, em razão
do desestímulo à produção).
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