O Estado de S. Paulo
A cada eleição, obras e serviços públicos são intensificados para cativar eleitores
“Pessoal, nós vamos desviar pela (rua) Bela Cintra, tá?”, avisa o cobrador do 175p10 Metrô Santana-Ana Rosa. Passageiros que acabaram de entrar no ônibus abarrotado reviram os olhos. “É por conta do asfalto do prefeito?”, questiona uma passageira, em tom irônico, segurando duas crianças pequenas pelas mãos. Os outros passageiros dão risada. Um outro aproveita e fala: “Quero ver se o asfalto vai ficar bom”. A gargalhada é geral.
Em junho de 2022, a Prefeitura de São Paulo
iniciou o Recape, o “maior programa de recapeamento da cidade”. São 20 milhões
de metros quadrados com custo de R$ 1 bilhão. O mapa disponível no site do
programa sugere que ele aconteceu em todas as regiões, das mais pobres às mais
ricas. O recapeamento está sendo mais sentido agora nas áreas do centro
expandido, mas vem acontecendo em grandes vias da zona leste e norte há meses.
O site também diz que o material utilizado é parcialmente reciclado e que o
projeto tem o objetivo de mapear a necessidade de material de cada via.
Recentemente, notei que a prefeitura também
trocou as plaquinhas que mostram o nome das ruas. Infelizmente, não presenciei
nenhuma piada pública a respeito disso. Então, recorri às redes sociais: “Agora
que não consigo enxergar as placas; estão fininhas e com letras minúsculas”.
A tática não é nova, e parece se repetir a
cada ciclo eleitoral: obras e serviços públicos são intensificados em um
esforço para renovar a simpatia e o voto dos eleitores. Muitas vezes, em vez de
priorizar a funcionalidade se opta por projetos visuais que possam ser
rapidamente notados, mas nem sempre aprovados.
Além disso, há um elemento de escolha
seletiva em que bairros e áreas recebem mais atenção. Enquanto as zonas
centrais e mais visíveis da cidade frequentemente recebem asfalto novo e placas
reluzentes, muitas comunidades periféricas continuam sem serviços básicos e
infraestrutura adequada. Fica a sensação de que as decisões são tomadas com um
olho no relógio eleitoral, e não com um compromisso genuíno com o bem-estar da
cidade como um todo.
Mais problemático, porém, é a ausência de um projeto de cidade. Estamos em um ano de eleição municipal: que São Paulo os candidatos pretendem construir? Aquela que recapeamos a cada alguns anos, mas que sofre crises humanitária, sanitária e de qualidade de vida, ou uma diferente? Como é a São Paulo que você, leitor, quer?
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